Mac tíre

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Medo: uma resposta de defesa do seu corpo. A ordem para recuar de algo que oferece perigo. Era isso que meu avô me dizia.

Eu não recordo de uma época de minha vida que não sentisse medo. Às vezes mais, por vezes menos, mas era algo tão constante que havia me acostumado ao sentimento. Medo do barulho dos tiros na floresta, da lâmina da faca tirando a pele da caça. Medo do rio atrás da cabana. Do fogo na lareira.

Eu podia sentir, por vezes, como uma dor fantasma que representava cada uma delas: eu sabia como era a dor de um tiro me atravessando, como era a sensação da faca no meu corpo e como era me afogar. Pior que tudo, eu sabia como era ser queimado vivo. Estava tudo lá, nos meus pesadelos.

Meu avô não achava que eu era louco, mas ele sabia que se continuasse daquela forma, eu não conseguiria nunca enfrentar o mundo lá fora novamente. Por isso ele me acordava de manhã e me jogava no rio. Ele me ensinou como atirar. Aos 11 anos eu sabia lutar com uma faca melhor que meu próprio pai. Ele me obrigara a montar a fogueira tantas vezes, mesmo quando eu chorava e gritava com ele. Mesmo quando eu me queimava no processo, ainda criança demais para fazer algo como aquilo.

Parecia cruel, e por vezes eu o odiava. Mesmo que toda noite ainda me encolhesse perto dele na poltrona, lambendo minhas feridas e ouvindo suas histórias.

Apenas quando percebi que o medo estava lá, mas não me paralisava mais, entendi o que ele tinha feito comigo. Como ele me ensinara a enfrentar meu pavor e meu trauma.

O meu maior medo, no entanto, nem meu avô conseguiu me ajudar a enfrentar: o medo de mim mesmo.

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CASTIEL ERA SÓ UM MENINO QUANDO CRUZOU O OCEANO PARA A INGLATERRA. Antes tudo o que conhecia eram as ruas geladas de Moscou e a disciplina ainda mais fria de seu pai. Até que um dia eles não voltaram para casa depois de uma viagem e Stephen veio o buscar. Até então um desconhecido a ele, que o tirou de tudo o que conhecia e o jogou em um mundo novo.

Não era como se ele não fosse grato a Stephen. O homem o tratava bem, não lhe faltava nada. Ainda assim havia algo nele que o fazia o temer, ser cauteloso ao seu redor. Talvez fosse a forma quase possessiva com que o tratava no decorrer do tempo. As únicas pessoas aos quais tinha acesso era Nina, a governanta, seu tutor John e o mordomo Hiro, quando ainda era vivo.

Ainda assim dificilmente Stephen não estava por perto. Logo quando chegara conhecera primos, parentes dele, mas hoje em dia sempre que havia alguma ocasião era trancado no quarto.

Castiel sentia-se em uma jaula de ouro. Não sabia o que havia acontecido a todos os seus bens, a fortuna da família. Ainda haveria dois anos até alcançar a idade em que poderia ter algum poder sobre eles, mas até lá, estava no escuro.

Não era um idiota. Havia ouvido sussurros, visto reuniões com pessoas estranhas o bastante para entender que Stephen havia perdido grande parte de sua fortuna, e eram os bens da sua família que estavam sendo usados. Havia muito que não sabia. E muito do que desconfiava. Observava. E se estivesse certo, se realmente estivesse certo em Stephen estar traindo a rainha...ele sabia bem quais eram as punições a isso.

Por isso se sentia ansioso quando foi chamado até o escritório de seu guardião naquela manhã. Fitara a grande porta de mogno como se fosse enfrentar um monstro do outro lado. Cada dia se sentia menos confortável perto de Stephen, e aprendera a acreditar em seus instintos. Eram os mesmos que o faziam não confiar totalmente em John, que o impediam de contar sobre tudo o que desconfiava que estivesse acontecendo dentro daquela casa. Sentia-se ligado a John de alguma forma — fora o primeiro rosto que conhecera quando Stephen o trouxera —, mas havia algo nele que o repelia também.

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