Gabhadh

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Eu o amava. Era difícil verbalizar isso, depois de tudo o que havia passado, mas eu o amava. O amava como se ama aquele amigo de infância que nunca se esquece, por mais que se passem décadas. Amava como se ama a volta para casa depois de uma longa viagem. Seu rosto sempre foi, afinal, uma de minhas lembranças mais antigas. Os olhos cinzentos me fitando através de um espelho, refletindo aquele eco da minha alma que eu mesmo não conseguia entender.

Tantos séculos, e era como saudar aquele velho amigo. Receber alguém que se foi, mas sempre esteve lá. Com toda a sua ira, sua confusão, seu rancor e modo torto como ele parecia ver o mundo, eu o amava, porque sua dor batia fundo em mim, antes mesmo de saber que era aquilo que eu sentia.

E eu imagino no decorrer dos séculos, ele tentando salvar os outros que vieram em vão. Eu podia sentir como cada um deles doeu tão profundamente ao ponto que no fim ele já havia se entregue a apatia para não sentir mais nada.

E ainda assim, ele entregou aquela parte que havia sobrado dele, do amor que fora tão quebrado nas mãos de uma mera criança que lembrava tudo aquilo que ele havia perdido.

E eu recordo de tudo, da poeira ao redor, do cheiro de algo antigo e tão precioso no ar, enquanto me apresentava com toda a formalidade de uma criança de dois anos a pessoa mais bonita que já havia visto na vida.

— Naru.

Os olhos cinzentos sorrindo depois de tantos séculos pareciam ver em mim algo que nunca consegui entender ao certo, mas talvez no fim eu tenha entendido.

— Sou Aeron.

Era esperança.

...................

QUANDO NARUTO ACORDOU, ARREPENDEU-SE IMEDIATAMENTE DE TER O FEITO. Seu corpo doía como nunca. Nem mesmo depois de ter passado por Obito pela primeira vez, se sentia tão destruído. Seus pulsos, seu braço esquerdo, suas costas e seu pescoço, nesses pontos sentia como se sua pele estivesse em carne viva.

Abriu a boca em um gemido piedoso, no mesmo instante sentiu uma mão tocando seus dedos levemente, outra em seu rosto. Seu coração que batia em ritmo acelerado pelo medo se acalmou ao sentir aquele cheiro conhecido. Abriu os olhos claros e encontrou os negros o fitando com preocupação e certo alívio.

—Sasu...ke... — sua voz estava rouca e baixa, a garganta dolorida e seca como papel.

—Shh, estou aqui. — Sentiu algo tomar seus lábios. — Aqui, beba, devagar.

Sorveu o líquido, se sentindo melhor com isso. Ficou alguns minutos parado, de olhos fechados sentindo o carinho em sua mão, tentando entender o ambiente. Mesmo com algo ali, sentia-se vulnerável. Não conseguia sentir Aeron. Havia barulho na porta, passos, como se muitas pessoas, estivessem passando por lá. Foi quando abriu os olhos novamente que viu que não estavam sozinhos. Duas figuras guardavam a porta, dois adultos que nunca tinha os vistos antes.

Kimimaro estava sentado em uma mesinha ao lado, olhando algo no computador com um prontuário na mão. Para qualquer um o jovem médico parecia relaxado, mas o conhecia o bastante para saber que não era verdade. Havia uma tensão em seus ombros. Voltou o olhar a Sasuke e notou a mesma coisa. Os olhos dele pareciam urgentes, como se tentasse lhe dizer algo sem palavras.

—Sasuke...

Ele balançou a cabeça, olhando levemente para a porta. No mesmo momento soube que não podiam falar nada em voz alta ali.

Respirou fundo, ignorando a dor, tentando alcançar a conexão dos dois, abrindo sua mente para que ele entrasse.

O que aconteceu?

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