Sobre nós dois

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[ Kassandra ]

   Eu estava nervosa. Não sabia como as garotas reagiriam a essa tentativa de aproximação. No entanto, eu precisava da aprovação delas. Apesar de ser estranho, eu talvez tivesse que "adota-las". Ninguém mandou eu me interessar por um "tio velho cheio de filhos". Exatamente o tipo que eu sempre quis manter distância. Mas, quem nunca "queimou a língua?" 
   Fui até o prédio de Viktor. Eu sabia que todos moravam ali. Procurei pelo cheiro do casal que tinha gêmeos. Eles pareciam os líderes do grupo.
   Parei diante da porta. Antes que eu tocasse a campainha a porta se abriu.
   _ Kassandra?
   _ Oi, Lívia. Estou atrapalhando?
   Ela olhou para as crianças.
   _ Não. Entre.
   As crianças vieram me abraçar. Dessa vez, tentei me acostumar com a ideia.
   _ Vovó veio. _ disse Cristina.
   _ As tias estão chegando. _ disse Tomás.
   Olhei para ela, meio sem graça.
   _ Está esperando visita?
   _ Os rapazes saíram. Então... Vamos fazer companhia umas para as outras.
   _ Ótimo. Eu preciso mesmo falar com todas.
   Ela me indicou o sofá. Eu sentei e olhei as crianças. Pensando em como eu iria começar.
   _ Pensei que você queria se manter distante de nós. Viktor me disse que te incomoda que meus filhos te chamem de avó. Já conversamos com eles sobre isso.
   Me senti constrangida. Eu sei que deveria ter falado diretamente com os pais das crianças.
    _ Não me leve à mal. Eu amo crianças. Eu só... Achava estranho. Mas, agora está tudo bem. Eu não me importo mais.
     _ O que quer dizer com isso?
     _ Que podem me chamar de vovó.
     Ela ficou me encarando.
     _ Está saindo com o Viktor?
    _ Não... Eu só...
    Fui interrompida pela campainha. Lívia foi abrir a porta para as garotas. Elas não pareceram surpresas ao me ver.
   _ Olá Kassandra.
   _ Oi meninas.
   Após todas se ajeitarem nos sofás, eu tomei a iniciativa.
   _ Eu vim porquê quero conhecer vocês melhor. Já que somos aliados e vamos colocar nossas vidas nas mãos uns dos outros. Resolvi começar por vocês e depois os rapazes. Tudo bem, ou não querem?
   _ Na verdade eu tenho muitas perguntas. Mas, primeiro. Vamos nos apresentar de novo. Eu sou a Sabrina.
   Após isso, logo eu já tinha gravado o nome delas e das crianças.
   _ Vocês tiveram filhos na mesma época. Foi combinado?
   Elas deram risada.
   _ Não. Na verdade eu nem pretendia me casar tão cedo. Sabe... Com a eternidade pela frente, eu podia esperar uns três séculos... _ Sabrina olhou para Lívia. _ A culpa é dela. Tudo começou com ela.
   _ Ei. Não fiz nada.
   _ Fez sim. Você decidiu obedecer o Viktor. O que teria acontecido se ao chegar na cidade, você concordasse com o Nicolae?
   Todas olharam para Lívia. Eu comecei a entender da onde vinha a liderança daquele casal.
   _ Como assim, obedecer Viktor e não concordar com Nicolae? Não eram unidos desde o início? Vocês são um casal tão amoroso. _ eu quis saber.
   Ela olhou para os filhos. Um instante de tristeza passou por seus olhos.
   _ Viktor queria que eu seguisse a natureza dos vampiros. Nicolae lutava contra ela, tentando manter um pouco de humanidade. Eu estava passando por um momento difícil na época. Não tinha nada a perder. Então, eu fiz o que Viktor pediu. Fui para a mansão. Eu não concordava com o que Nicolae fazia. A escolha foi fácil. Mas, entramos em conflito por isso.
   _ Conflito?
   _ Sim. Ele caçava animais. Eu abominava essa ideia. Me recusei. Fui atrás de sangue humano. Com meu dom eu pude me alimentar sem matar. Ele tentou me forçar a seguir o jeito dele...
   Enquanto Lívia me contava sobre sua relação complicada com Nicolae, eu ia entendendo da onde vinha a confiança de Viktor. Depois de tudo que passaram, eles ainda eram gratos.
   _ Não odiou Viktor? Se não tivesse te transformado, você não teria passado por tudo isso.
   Ela me olhou de sobrancelha franzida.
   _ Não tenho porquê odia-lo. Se não fosse por ele eu nunca teria conhecido Nicolae. E essas crianças lindas não existiriam. Toda a dor e sofrimento valeu à pena. Eu passaria por tudo outra vez. Para chegar até aqui.
    _ E depois de ver esse amor incondicional, acabamos buscando nosso próprio final feliz. Foi vendo esses dois que eu entendi, que a eternidade podia durar menos do que eu pensava. Ela quase perdeu Nicolae.  Isso me fez encarar meus próprios sentimentos e correr atrás da minha felicidade. _ disse Sabrina.
   _ Então, ao enfrentar a guerra e ver o casal quase se separando, tiveram medo de não ter tempo para esperar. No entanto, estão arriscando suas famílias pelo Viktor.
   _ Se ele não nos reunisse, não teríamos uma família para proteger. _ disse Lorie.
   Todas concordaram, olhando as crianças.
   _ Outros originais não tem essa gratidão de seus transformados. Por que, me desculpem. Mas, são vistos como inferiores. Viktor é o primeiro que vejo tratando bem os criados.
   Elas deram risada.
   _ Mas, ele também não nos coloca no mesmo patamar. Ele é um "pai" autoritário e exigente. Que pune quando passamos de seus limites. Ou o desobedescemos. Despreza humanos. À menos que sejam uma boa aquisição para o clã. Como nós fomos. Sua aura fria e sombria deixa claro que ele não é bonzinho. Ele é mau. Quase fui punida também. Mas, sabe... Eu amo esse vampiro como se fosse realmente meu pai. _ disse Luísa. _ Mesmo com todos os seus defeitos. Mesmo com essas trevas ao seu redor.
   Elas tinham noção de tudo e mesmo assim o defendiam, pelas coisas que conseguiram através dele. Gratidão! O sentimento mais forte, após o amor.
   _ Mas, nós queremos saber... Como vai sua relação com o Viktor?
   Sabrina parecia ter mil e um questionamentos.
   Elas se abriram comigo. Eu faria o mesmo.
   _ Não há uma relação. Eu já admiti que gosto dele. Porém, tenho meus motivos para ficar apreensiva. No entanto, nós firmamos uma aliança e a selamos compartilhando sangue.
   _ Vocês compartilharam?
   Elas perguntaram ao mesmo tempo. Me encarando curiosas. Até fiquei meio constrangida.
   _ Sim. Eu bebi o sangue dele.
   _ E como foi? Sentiu alguma coisa? Você disse que ele é atraente. _ Lorie me encarava de um jeito maldoso.
   _ Acho que sua mente está criando situações que não aconteceram. Foi só isso. Não houve nada.
   _ Você não viria até aqui se aproximar de nós, por nada. _ disse Julia.
   Eu tentei manter uma pose de indiferença. Viktor fazia isso muito melhor que eu.
   _ Foi só isso. Uma sensação gostosa, confesso. Mas, à única coisa que rolou entre nós foi um beijo.
   Eu estava me sentindo entre amigas adolescentes. Curiosas. Era tão natural que acabei deixando a pose de lado. Tudo bem sermos amigas. Era até melhor.
   _ Não fale nada para ele ou os rapazes. Mas, foi muito bom compartilhar sangue e beija-lo. Foi a primeira vez que eu senti coisas, ao beber o sangue de alguém.
   _ Eu também só senti ao beber o de Nicolae. _ Lívia ria.
   _ Como foi que esse beijo aconteceu? _ quis saber Amélia.
   Tudo bem contar a elas, não é? Eu olhei para cada uma.
   _ Isso é um assunto muito complexo. Fica só entre nós...
    Elas se encararam.
    _ Eu tenho um dom. Viktor me fez aceitar como um dom. O fato de que posso matar com o toque. Apesar de ainda não saber como funciona. Beija-lo foi um teste. Para ver se não ia morrer com um beijo.
    Elas ficaram sérias. Entendendo a gravidade da situação.
    _ Ele arriscou?_ disse Laura.
    _ Sim. Ele tinha certeza que era um dom. A outra opção era pior... Ele disse que há um demônio que invade o sono e rouba a energia vital. Fiquei com raiva dessa comparação e o beijei. Para provar que não era isso.
    Elas continuaram me encarando.
    _ Mas, você disse que mata com um toque. Eu imaginei a personagem "vampira" do gibi X-Men. O que eu já li em livros, sobre um demônio que mata entrando no sono e roubando energia vital, não é bem assim. São chamados de Sucubus e Incubus. Feminino e masculino. Roubam a energia vital com um beijo ou sexo. Você tira a energia vital sem precisar encostar na pessoa. Nós vimos isso. E você não mata quando encosta na pessoa. Eu fiquei confusa. _ disse Lívia.
   _ Você e os livros. _ disse Lorie.
   Aquelas duas tinham uma ligação diferente. Pareciam eu e minha mãe. Aquele grupo era muito complexo.
   _ Justamente para provar que não tinha nada a ver, que eu o beijei. E eu não mato com um toque das mãos. Na verdade, nem sei bem como acontece. Eles morrem sem eu fazer nada.
   _ Agora fui eu que não entendi. Por que Viktor te comparou a esse demônio?_ quis saber Julia.
   _ Verdade. Você só disse que mata com um toque. Isso é muito vago. _ disse Laura.
   _ À menos que o toque que você fala, seja do corpo inteiro. _ Sabrina foi ligando os pontos. _ Você realmente mata através do sexo, como esse demônio?
   Todas me encararam. Eu estava acompanhando seu raciocínio e ficando preocupada com onde ia chegar!
   _ Sim! Eles morrem depois de se deitar comigo. Mas, não tinha como Viktor saber. Eu não contei para ele.
   Então, todas disseram ao mesmo tempo, me fazendo arrepiar de medo...
   _ Ele sempre sabe!

*****

[ Viktor ]

   Decidi ir junto com meus filhos até a boate onde os mestiços frequentavam. Tive medo de deixá-los irem sozinhos.
   _ Acha que vai encontrar companhia  nesse lugar bizarro?_ Nicolae quis saber.
  A boate tinha decoração de cemitério. Várias caveiras pretas com pedras vermelhas nos olhos, decorando o lugar. Sofás em forma de caixão. O cardápio tinha a forma de uma lápide.
   _ Você arriscaria beber alguma coisa?_ Lucas olhava com nojo.
   _ Eu não bebo. Apesar uso para me aproximar das vítimas. Eu vou para o bar. Procurem informações. Não quero ficar aqui mais que o necessário. Dói os ouvidos, esse volume absurdo.
   Eles se espalharam. Eu fui até o bar.
   Percebi a aura diferente daquele lugar. Não havia só humanos ali. Os mestiços não eram os únicos sobrenaturais a frequentar.
   _ O que vai querer? De que tipo prefere?
   Só para confirmar eu disse...
   _ Humanos.
   Ele pegou uma garrafa e encheu o copo. Eu senti o cheiro antes de beber. Era mesmo sangue humano.
   Uma garota se aproximou. Com um sorriso de incentivo.
   _ Ora, o que temos aqui?
   _ Nada que seja da sua conta.
   Ela riu.
   _ Eu sempre consigo o que eu quero.
   Tarde de mais, eu percebi que era uma bruxa. Antes que eu pudesse reagir já tinha recebido um feitiço. Minha mente começou a nublar.
   _ Você vem comigo.
   Meu corpo reagiu contra a minha vontade. Indo atrás dela. Mesmo eu tentando me parar. Queria pedir ajuda aos meus filhos. Mas, a mente não correspondia.
   Subimos a escada para o segundo andar da boate. Vários quartos mal iluminados se estendiam naquele corredor.
   _ Agora vampirinho. Fará o que eu quero. Me dê a lista com os nomes de seus transformados.
   Uma armadilha! Quem diria que bruxas estavam envolvidas nessa sujeira toda. Não pensei que iriam cooperar com os originais.
   _ Vamos. Coopere. Logo ele vai chegar.
   Eu não ia perder para uma bruxa. Afinal, absorvi o poder daquelas que ousaram desafiar meus filhos. Usei um feitiço reverso em mim mesmo.
    _ Mas, o quê?
    Eu apertei o pescoço dela.
    _ Quem lhe ordenou listar os meus filhos?
    Ela lançou feitiço na minha direção. Eu vi em sua mente suas intenções. Refleti seu ataque.
   _ Não perdoo quem ousa fazer mal aos meus filhos.
   _ Você nunca vai ganhar. Ele é mais forte que você.
   _ De quem está falando?
   Ela deu uma risada debochada.
   Usei o feitiço de controle nela.
   _ Quem mandou você anotar?
   Ela tentou quebrar o feitiço. Eu ganhei o cabo de guerra.
    _ Que original deu a ordem?
    _ Não foi um original. Foi um mestiço... Andrey.
    _ Vá avisar ele, que eu não vou perdoar quem mexer com meus filhos.
    Quebrei o feitiço sobre ela e saí do quarto. O mais rápido possível. Não confiava nos meus filhos ali. Estavam em perigo.
    Cheguei no primeiro andar e quase fui atingido. Tarde de mais. Já estava armada a confusão.
    

  
  
  
  
   
    
   

     

    

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