Capítulo 29

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    Quando a gente chega em casa, peço pra mamãe me pôr logo na cama. Me recuso a almoçar. Tento dormir, mas as perguntas do campeonato e outras perguntas que começam com “por que” não saem da minha cabeça.

    Por que eles não me ligaram?
   
    Por que eles não me contaram que iam tomar café da manhã juntos?

    Por que eu não posso ser igual a todo mundo?

    Finalmente, consigo pôr a cabeça no travesseiro e chorar. A Toffee fica me cutucando com o nariz, mas eu ignoro.

    Eles me deixaram pra trás de propósito! Como puderam fazer isso? Eles me deixaram pra trás de propósito!

    Tenho vontade de pisotear alguma coisa. Pisotear, pisotear, pisotear! E fico mais possessa ainda porque nem isso eu posso fazer! Não posso nem ficar louca da vida como qualquer criança normal!

    A Penny põe a cara na minha porta. Quando vê que tô acordada, sobe na minha cama e se enrola pertinho de mim. Tá cheirando a espuma de banho com aroma de melancia. Ela tenta contar meus dedos, depois tenta contar os dedos dela, mas só sabe dizer um, dois, três, cinco e fica repetindo isso sem parar. Depois ela tentar ensinar o Peludo a contar.

    — Dois, Uu-do, dois.

    Relaxo um pouquinho.

    — Ah! Então você tá aqui, né Penny? — diz o papai, encostado na porta. — Você tá deixando a Dii-Dii feliz?

    — Dii-Dii boa menina — diz ela.

    — É, ela é mesmo. A melhor — concorda o papai. — Você tá bem, Melody? — pergunta ele, chegando mais perto pra me fazer um cafuné.

    Eu balanço a cabeça. Aponto para o pulso esquerdo dele, que tá enrolado numa faixa elástica.

     — É, tá doendo. Fiz uma coisa bem idiota, mas acho que fiquei me sentindo melhor depois.

    Balanço a cabeça de novo.

    Ele tira a Penny da minha cama com o braço direito.

    — Pronta pra fazer um lanchinho, senhorita Penny? — pergunta o papai.

    — Cachorro-quente! — exige ela.

    — Quer que eu faça alguma coisa pra você comer, Melody?

    Tô sem fome. Eu sacudo a cabeça, depois aponto para o relógio.

    — Talvez mais tarde?

    Eu dou um sorriso, e ele sai devagarinho do meu quarto levando a minha irmã.

    Toca o telefone.

    Ouço a mamãe dizer.

    — Ah! Olá, sr. Dimming.

    Ela vem correndo para o meu quarto, com o telefone sem fio no ouvido. Tá apertando tanto aquele negócio que as veias na mão dela ficaram saltadas.

    — Não, eu não entendo — diz ela, curta e grossa. — Por que ninguém nos ligou? — ela ouve por um minuto e aí explode de raiva. — Teria sido muito fácil chegar uma hora antes no aeroporto. A gente chegaria de madrugada se fosse preciso! — ela tá quase gritando. — O senhor faz ideia do quanto a minha filha ficou arrasada?

    Uma pausa.

    — Sim, eu sei que ela provavelmente é a pessoa mais inteligente da equipe. Era. O verbo certo é ERA. Não existe mais É — a mamãe para de falar para ouvi-lo de novo. — O senhor vai dar um jeito de compensar o que fez? O senhor só pode estar de brincadeira!

    A mamãe bate o telefone na cara do professor e atira o aparelho num canto. Ela enxuga as lágrimas, puxa um lencinho de papel da caixa que fica na minha mesa e se joga na cadeira ao lado da minha cama. Ouço ela assinar o nariz, aí me viro.

    — Ah, Melody, se pelo menos eu pudesse tirar essa dor de você — diz ela, com a voz cheia de tristeza.

    Eu pisco os olhos, que estão cheios de lágrimas.

    A mamãe me puxa pro colo dela. Não é mais tão confortável como era antes, quando eu cabia nele, mas ainda é gostoso. Ela me balança, murmurando uma música baixinho. E enfim consigo pegar no sono, ouvindo o ritmo das batidas do coração dela.

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