Capítulo 18

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    Aquele dia depois da aula, fiquei mal humorada e má. A sra. V. tinha preparado uma nova pilha de fichas de palavras. A Penny usava um dos turbantes da nossa vizinha e tava ridícula. E, ainda por cima, ficava cantando bem alto aquela música idiota de bebê. Joguei a pilha inteira de fichas no chão.

    — Por acaso alguém pôs sal no seu suco, madame? — perguntou a sra. V., sem pegar as fichas do chão.

    Minha irmã parou de cantar e ficou lá parada, piscando pra mim.

    Eu desliguei o Medi-Talker e virei a cara.

    — Tudo bem. Pode ficar emburrada. Mas vai juntar essas fichas todinhas.

    Eu fiz um beiço bem grande e fiquei olhando pra parede.

    A Penny chegou mais perto e sacudiu meu braço. Eu dei um puxão e me soltei. Ela não deu bola e começou a cantar de novo.

    — Feliz, feliz, feliz, bate o pé.
    Feliz piri piri assoalho o nariz.
    Bidi-bodi-dau-di, pula, pula, pula.

    Ela pulava. Batia o pé. E aí cantava tudo de novo. Várias vezes.

    Minha irmã tava me irritando muito. Queria que ela simplesmente calasse a boca! Falando o tempo todo. Andando o tempo todo. Pulando e sacudindo e cantando. Para! Só por um minuto. Por favor, PARA!

    Mas ela não parou.

    — Oi, Dii-Dii — disse. E colocou o Peludo na minha bandeja.

    Eu derrubei o boneco no chão.

    — Uu-do, Dii-Dii — ela pegou aquele negócio idiota e esfarrapado e colocou de novo na minha bandeja.

    Eu derrubei de novo. Me deixa em paz! Eu queria gritar.

    A Penny tava acostumada a ver as coisas caírem da minha bandeja, então não tinha como saber que eu tava fazendo aquilo por pura maldade. A terceira vez que ela colocou o Peludo na minha bandeja, eu o derrubei com tanta força que bati com o braço na cabeça da minha irmã. Ela se desiquilibrou e caiu no chão.

    Aí olhou pra mim, com cara de surpresa, agarrou o Peludo e correu pra sra. V., chorando.

    — O que você tem, Melody? — perguntou a sra. V., embalando a Penny.

    Como é que eu podia explicar?

    Eu não queria chorar, mas chorei. Virei minha cadeira pra parede, e o telefone tocou. A sra. V. se virou pro telefone, deu um suspiro e levantou pra atender.

     —Ah! Oi Catherine.

    Catherine? Virei minha cadeira um pouquinho pra ouvir melhor.

    — Não tá no seu normal? Bom, ela tá meio jururu. Não, retiro o que eu disse. Ela tá um monstro.

    O olhar da sra. V. se cruzou com o meu, e ela me fez uma careta.

    Eu só fiquei encarando.

    — Pra mim não é nenhuma surpresa ela ter acertado tudo. Essa criança é brilhante!

    Muito me adianta.

    O professor disse o que?

    Que maravilha. Agora todo mundo ia ficar sabendo. Só de pensar nisso já fiquei me sentindo um lixo de novo.

    — Na frente dos colegas? Que tipo de professor é esse? — a sra. V. parecia furiosa.

    — E como ela reagiu? Nem me fala, já sei. Tá sentada aqui parecendo um daqueles baiacus que a gente viu no aquário. Toda inchada e cheia de espinhos.

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