Prólogo

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Em seus vinte e sete anos, Sara cometeu muitos erros, a maioria por amor. Rastejou e escavou tão fundo por amor que se tornou impossível enxergar uma saída, uma forma de reverter os atos impulsivos e perversos que cometeu. Arrependia-se? Normalmente a resposta seria um alegre e confiante "Não", mas naquele dia o "Sim" dilacerava seu coração, da mesma forma que Rodrigo Montenegro, seu amado e idolatrado marido, acabara de fazer.

Apertando sua bolsa preta junto ao corpo magro coberto por um vestido vermelho, saiu do elevador a passos largos, o salto fino ecoando pelo estacionamento da empresa do marido. Próxima ao seu Corvette Vermelho, estacionado em uma vaga privilegiada perto dos elevadores, apertou o botão para destravar o veículo e desarmar o alarme. Eram uma das poucas vantagens obtidas após casar com o insensível Montenegro, algo que trocaria sem pensar duas vezes por uma vaga no coração dele.

Entrou no carro, batendo a porta com força excessiva, e, após lançar sua bolsa no banco ao seu lado, colocou o cinto de segurança e jogou o corpo contra o assento. Inspirou fundo e esfregou os dedos nos olhos, tentando tranquilizar-se e secar as lágrimas que não paravam de brotar. Foi em vão, o único resultado obtido foi transformar a maquiagem, sempre perfeita, em borrões manchando seu rosto e mãos.

Não aguentava mais sua vida vazia, seu casamento frígido, amar sem ser amada. Não queria mais viver assim.

Desistindo de controlar as lágrimas e precisando fugir do que lhe causava sofrimento – o homem amado -, deu partida no carro. Saiu furiosamente para as ruas molhadas pela chuva que caia desde manhã. Com a vista prejudicada pelo choro, enxergava a pista borrada, as luzes e carros embaçados.

— Cretino... Como pode...? — balbuciou batendo a mão direita furiosamente no volante, sentindo a garganta dolorida e o coração em frangalhos.

Sentia-se perdida e com as emoções fora de controle. Acima de tudo, sentia-se traída e abandonada.

De dentro da bolsa, seu celular tocou. Sabia quem era e não atenderia de jeito nenhum.

— Safado... Quem ele pensa que é...?

Não merecia tamanho desrespeito, não vindo da pessoa que a fez desistir de seus sonhos, para quem dedicou cada segundo de sua vida desde que o conheceu. Rodrigo, o amor de sua vida, tomara posse de seu coração, o manipulara e agora - quando tudo que ela tinha no mundo era ele - o tirou do peito dela e pisoteou sem dó.

O toque do celular persistia, enfurecendo-a. O desgraçado sabia ser insistente quando queria.

Nervosa, segurou o volante com a mão esquerda e com a direita abriu a bolsa, vasculhando seu interior em busca do aparelho. Agarrou o objeto retangular e olhou para a tela, em busca do nome confirmando a pessoa que ligava. As lágrimas impediam que enxergasse com clareza, restando somente à opção de atender. Ao fazê-lo reconheceu de imediato à voz grave.

— Sara, o porteiro avisou que você saiu em alta velocidade. O que pretende? Se matar?

— Ah, vocês adorariam isso... Assim estariam livres de mim... — zombou furiosa, a voz dolorida e a alma em pedaços.

Com a vista encoberta pelas lágrimas e os sentidos descontrolados, pisou fundo no acelerador. Doía tanto ama-lo, escrever em sua mente uma vida inteira de felicidade ao lado dele e perceber que nunca se realizaria. Ele jamais a amaria e desejaria como amava e desejava a outra.

— Não diga tolices e nem seja inconsequente. Volte para conversarmos.

Sempre repetiam o mesmo roteiro. Ele a magoava com seu desamor e depois dizia que ela era irracional. Dessa vez não o obedeceria, não engoliria seu orgulho e seu amor próprio para satisfazê-lo. Nunca mais se ajoelharia pedindo perdão e uma chance de mostrar que podia ser suficiente.

— Inconsequente... Tolice...? — Riu com amargura, os dedos fechando-se com força no volante, o pé afundando ainda mais no acelerador. — Fiz de tudo para te agradar... Abandonei meus sonhos por amor a você... E veja como me agradeceu... E eu que sou a inconsequente...? — gritava com toda força que ainda lhe restava para que sua voz saísse em meio ao choro. — Você não presta... Te amar é o maior erro da minha vida...

— Gritar não resolverá nossos problemas, só me irrita, Sara.

Gargalhou histérica, tirando a outra mão do volante para esfregar os olhos e secar o mar prejudicando sua visão.

— Tudo te irrita — retrucou farta de ser apontada como o problema do relacionamento deles, de lutar por aquele casamento. — Nada te deixa contente... Cansei de tentar... Queria nunca ter me apaixonado por egocêntrico sem sentimentos... — Sentindo o carro mover-se para o lado e ouvir a buzina alta do veículo atrás do seu, voltou à mão livre a direção, ainda sem conseguir enxergar nada a sua frente. Tinha dado tudo de si para Rodrigo e, em retorno, não recebeu nada. — Se eu pudesse, passaria uma borracha nos últimos anos e te apagaria para sempre do meu coração...

Nem terminara de descarregar toda sua raiva e frustração quando, ao passar sobre uma poça d'agua, o carro derrapou. Largando o celular, Sara agarrou o volante com força e pisou fundo no freio, o que se mostrou um erro. O carro empinou para frente, capotou várias vezes e, em alta velocidade, chocou-se com força contra um murro, o estrondo assustador erguendo-se acima do barulho da chuva e dos outros carros freando para não se chocarem contra o veículo desgovernado.

Com o impacto desmaiou instantaneamente, a cabeça caída para frente, o sangue escorrendo sobre sua face, o corpo preso nas ferragens. Não viu os carros freando e parando ao redor do acidente, não escutou os gritos das pessoas tentando acordá-la e nem as sirenes. Também não ouviu a voz sempre fria e controlada, do outro lado do aparelho telefônico, lançado para fora do veículo durante o impacto, aumentar o tom e demonstrar, pela primeira vez em dez anos, preocupação por ela.

— Sara que barulho foi esse? O que aconteceu? Sara, me responda, por favor!

~*~

Repostagem com correções feitas por mim. Por favor, me avisem se encontrarem erros. Aceito críticas numa boa.

Comentem, votem, reclamem, toda forma de expressão será aceita com tranquilidade.

Big beijos,

Luciy


Páginas em Branco ~ DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora