4. Barulhos estranhos

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DE MADRUGADA.

Eu não acordei assim que houve a primeira pancada entre a bagunça das minhas coisas, caso contrário, eu teria sido testemunha de algo no mínimo espantoso ali no quarto e, mais tarde, o que eu veria não me seria surpresa nenhuma – ou pelo menos eu estaria preparada.

Mas.

Acredito que a pancada que me fez acordar foi a mais alta de todas – claro que as anteriores a ela também foram responsáveis por meu sono pesado ficar cada vez mais leve e sensível. Eram duas da madrugada, mais ou menos, quando aconteceu.

Um barulho de vidro sendo quebrado me despertou de repente e fiquei atordoada porque o quarto estava escuro e a única luz era a do luar, que entrava fraca pela janela recém quebrada. Foi uma pancada alta e os estilhaços pareciam ter caído por todo lado. Não me levantei assim que percebi aquilo, e ainda bem que minha reação não foi impulsiva, mas meu coração ficou acelerado e meus olhos em alerta.

Depois de pensar com lentidão por conta do pós-sono – o que deixa qualquer um fraco –, achei melhor esperar alguma movimentação dentro do quarto para poder gritar, correr ou fazer alguma coisa, afinal, quem quer que fosse, poderia ter saído ao invés de entrado – embora pensar assim fosse um risco. Meu coração batia tão forte que me fazia tremer e pensei que qualquer um, a menos de um metro de mim, poderia ouvi-lo. Lembrei de Greg mais cedo, lançando pedrinhas para chamar minha atenção, mas eu sabia que Greg não lançaria nada que pudesse quebrar a janela.

Continuei quieta.

Dois minutos se passaram e o silêncio reinou. Devagar e hesitante, respirando compassadamente, levantei a cabeça para olhar por sobre o ombro, pois eu estava dormindo de bruços, e pude sentir que minhas pernas estavam dormentes. Vi que as cortinas tinham sido abertas e que balançavam à brisa da noite, levemente assustadoras. A janela estava com quase todo o vidro estilhaçado e apenas a luz da lua incidia fraca e monótona para dentro.

Mas então me assustei de novo e só não gritei porque isso pareceu entalar na minha garganta: um livro caiu e ouvi passos na madeira do chão. Foram passos apressados e assustadores. Prendi a respiração e nem ao menos tive ação de baixar a cabeça: fiquei estática e fechei os olhos com muita força. Para mim, quem quer que fosse, me atacaria naquele instante. Mas tudo se aquietou de novo, tão rápido quanto tinha soado, e o silêncio reinou novamente.

Nesse momento, percebi que minhas mãos estavam agarradas aos lençóis da cama como por desespero. Eu queria gritar enquanto podia, mas o medo havia me paralisado tanto que o berro continuava entalado na garganta. Lentamente abri os olhos, com medo do que eu veria – primeiro um e depois o outro –, e meu olhar recaiu sobre a palidez fantasmagórica do luar e sobre mais uma coisa que me fez desejar não ter olhado: um pouco ao lado da janela, onde havia uma mesa cheia de livros, vi uma movimentação quase imperceptível. Meus olhos tremeram, queriam recuar, mas viram uma silhueta pequena que se mexia puxando algo. Foi muito rápido, mas o suficiente para eu ver exatamente o seu formato: pernas, braços e uma cabeça COM CHIFRES!

Senti meu corpo todo tremer, mas na mesma hora outros livros caíram no chão com um baque súbito porque, seja lá o que era aquilo, parecia ter puxado algo de cima da mesa. Vi, então, a silhueta se deslocar como um vulto, rapidamente sumindo na escuridão – seus passos foram abafados pelo barulho dos livros.

A partir daí, não me contive mais e gritei:

AAAAAA! – Óbvio que eu não consegui soltá-lo muito alto, mas quando finalmente vi que minha voz ainda saia, perguntei logo atrás: – Quem está aí? Aí meu Deus! Quem é?

E seja lá o que fosse, não deu a mínima para mim, o que me deixou mais aflita, pois eu já não sentia minhas pernas caso precisasse correr.

Ao invés disso, o que me veio como resposta me deixou ainda mais apavorada: os passos dele continuaram na madeira, apressados, andando no quarto escuro e, por mais incrível que pudesse parecer, pude jurar ouvir barulhos de sinos enquanto ele o fazia, sinos chacoalhando singelamente e, juntos a isso, resmungos baixos como se conversasse e praguejasse consigo mesmo.

Crônicas de Penina - Livro 1 - Os desenhos de Cornélio (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora