A Caminho do Covil

373 43 175
                                    

Na van, enquanto meu pessoal se organiza pro evento de campanha, fico no último banco do fundo, olhando minhas mensagens e pensando no que eu posso mandar pro Haddad. Assim como me sinto com a maioria dos políticos desse 'naipe', nunca sei bem como conversar com ele.

No meio de dezenas de mensagens, dou uma risadinha ao ver que Ciro mandou algumas fotos fazendo campanha. Ele tem essa mania de posar para fotos fazendo hangloose e eu adoro isso.

Acaba que chegamos até nosso destino e eu ainda não sei o que mandar pro Haddad, então na pressa mando apenas "oi". Patético? Com certeza, mas é o jeito. Se ele quer falar comigo então vai falar.

Deixo o celular pra vibrar em caso de resposta e sigo com o pessoal para o mini comício.

-//-

Já passa das 16h quando ele responde minha mensagem. O sol está rachando e nesse corre-corre tive que voltar pro hotel e tomar mais um banho. Enquanto isso, Juliano e Batoré, meu segurança, conversam sentados no chão do quarto.
No comício, tudo correu bem mas acabei me empolgando demais e agora minha garganta dói um pouco, além de eu me sentir mais cansado do que esperava. Felizmente, os organizadores do segundo comício adiaram para o dia 4 por falhas de agenda, e me vejo livre de outros compromissos de campanha.

Na tela brilhante do celular, que agride um pouco minha fraca dor de cabeça causada pelo calor e pelo cansaço, a conversa de Haddad se destaca porque eu fixei acima de todas junto com a de Ciro.

"Oi! Passei o dia em campanha, perdão por não responder antes"

Sorrio. Não havia necessidade de se justificar, já que eu entendo melhor que qualquer um essa correria, mas mesmo assim ele o faz.

"Sem problema. Encontrei com a Marina hoje mais cedo, ela me disse que você queria falar comigo"

"Sim. Queria te fazer um convite."

Minha expressão de confusão é tão evidente que Juliano me olha com uma expressão curiosa. Ignoro-o por ora.

"Convite pra quê?"

"Pra tomar um vinho e bater um papo aqui no hotel hoje à noite. Nada demais"

- Quê? - Não consigo evitar de verbalizar minha surpresa.

- O que houve? - Os dois homens próximos a mim indagam, curiosos.

- O Haddad está me chamando pra dar uma voltinha no hotel com ele.

- Quê? - Eles têm a mesma reação que eu.

- Pois é, também não entendi.

- Nossa, mas nem um jantar antes? - Juliano comenta, em tom de riso. Dou risada dele.

- Deixa de ser palhaço, Juliano. Deve ser política.

Já que visualizo e não respondo as mensagens logo de cara, Haddad continua falando:

"Não se preocupe, não vou te atacar nem nada do tipo. Marquei há dias de passar algumas horinhas jogando conversa fora com a Manuela e o Lindbergh hoje. Como eles souberam que você estava na cidade, pediram pra te chamar também. Pode trazer alguém se quiser"

- A Manuela e o Lindbergh também estarão lá. - Atualizo os dois.

- Uma reunião de vermelhos! O Bolsonaro ficaria morrendo de raiva.

- Como se ele também não se reunisse com alguma cúpula fascista, né?

Eles concordam. Penso por um momento.

- Acho que estão me sondando pro segundo turno. E aí, Juliano?

- Eu acho que é bem provável. No mínimo, querem ganhar sua amizade. Você é próximo deles três?

- É, mais ou menos. Tenho uma relação amigável com eles.

- Então pode ser isso. Fica a seu critério ir ou não. Sua vida é sua vida. Como liderança de partido, não vejo problema.

Reflito sobre isso. Não tenho muita certeza sobre ficar em um quarto de hotel com três políticos quando estou tentando me afastar desse círculo.

- Juliano, o Haddad disse que eu posso levar alguém. Vem comigo.

- Quê?! Claro que não!

- Por que não, cara?

- Por que eu iria?

- Se você estiver lá, ninguém vai tentar me dobrar ou coisa parecida.

- Tô fora. Eu nem conheço eles direito!

- Simples: Conhece agora.

- Sem chance. Vou iniciar meu diálogo com a esquerda em outra oportunidade.

- É nesse momento que a gente vê quem são os amigos.

- Chantageador!

- Você não vem mesmo?

- Seria ótimo poder te trazer de volta no horário certo, mas não.

Rio de nervoso. Parece que vou ter que seguir essa corrente sozinho por hoje. Resolvo finalmente responder a mensagem de Haddad:

"Tudo bem, eu posso ir. Que horas?"

"Por volta de 20h. Estaremos esperando"

Me resta escolher uma camisa boa e esperar a hora de pedir um Uber.

Garoto Promissor (Ciro x Boulos)Onde histórias criam vida. Descubra agora