Chego no aeroporto dois minutos atrasado e a pequena parcela de minha equipe de campanha que me acompanhará até Minas já está me esperando.
Com pressa, fazemos logo o check-in. A moça que nos atende aparentemente é uma futura eleitora de nossa chapa e puxa papo conosco, o que levanta um pouco minha moral.
Me pego pensando se isso já aconteceu alguma vez com Ciro e chego à conclusão de que com certeza sim.
Lembro que ele me contou que uma vez, quando era deputado federal do Ceará, uma eleitora furou o bloqueio dos seguranças em um aeroporto só para dizer que o amava. Pelo menos não sou o único atraído pelo magnetismo dele.Minha mochila é verificada três vezes na esteira, mas espero pacientemente enquanto os funcionários do aeroporto verificam cada centímetro de nossa bagagem procurando algo incriminador. Imagina o escândalo de encontrar um presidenciável querendo embarcar em um avião com drogas ou algo do tipo?
Obviamente, é constatado que não há drogas ou armas em nossas bolsas e então somos liberados para o vôo.
Alguns seguranças do aeroporto tentam me convencer a embarcar primeiro no avião pra garantir que ninguém tente me agredir, mas eu acho que isso seria uma tremenda falta de respeito; então, eu e minha equipe ficamos na fila junto com as outras pessoas. Algumas me reconhecem e acenam para mim, algumas nem ligam pra minha presença, mas ninguém tenta me ofender, o que já é ótimo.
Penso em como é quando Ciro aparece em um aeroporto, sendo aproximadamente cem vezes mais conhecido que eu. Com certeza não ser xingado e nem recebido aos gritos de fãs deve ser uma ocasião bem rara.
Políticos, não é mesmo?
O vôo felizmente é tranquilo, mas nunca gostei muito de andar de avião. É um dos lugares em que me sinto estranhamente deslocado; o cansaço mental que sinto também não faz maravilhas para mim.
Ciro uma vez me disse que no final de toda campanha, a mente só quer um descanso e por isso é a hora de redobrar o cuidado com o que fala e com o que faz.Dou uma risadinha quando me pego pensando nele pela milésima vez hoje e provavelmente milionésima vez nessa semana.
Ainda no avião, nos avisam que teremos que esperar um tempo extra por que está havendo uma espécie de operação no ponto de desembarque e nos retirar poderia causar uma confusão. Entretanto, uma comissária pergunta a mim se estou atrasado para o evento de campanha; respondo que não, mas estou em cima da hora.
É o suficiente para permitirem que eu e minha equipe possamos desembarcar do avião primeiro, sendo acompanhados por alguns seguranças do aeroporto.
Percebo que há uma massa de pessoas concentrada em um ponto do salão de desembarque, e uma conversa rápida com um dos seguranças que nos escolta me fornece o nome do motivo daquilo: Fernando Haddad, que desembarcou há alguns minutos no mesmo aeroporto e foi imediatamente rodeado por apoiadores e haters.
Esse é um dos momentos em que fico feliz por não ser um político tão expressivo; não sou do tipo que gostaria de lidar com isso.
Temos que esperar um pouco até que uma parte da multidão se disperse, mas dentro de alguns minutos podemos pegar um caminho escondido por uma saída de incêndio. A equipe do aeroporto já está de mãos cheias tendo que lidar com essa situação e eu só sobrecarregaria ainda mais os seguranças passando pelo lobby principal.
No carro que o PSOL nos forneceu para andar por Belo Horizonte, checo minhas mensagens procurando algo importante e além de mensagens comuns, uma me chama a atenção:
"Você também está em Minas? Queria falar contigo ainda hoje"
De Fernando Haddad.
- O Haddad vai fazer campanha em Minas hoje? - pergunto ao funcionário do PSOL que dirige o carro para nos levar até o hotel.
- Acho que sim. Sei que ele esteve no Rio Grande do Sul pela manhã mas agora deve participar de um comício por aqui.
- Ah, ok.
Já que nós dois moramos em São Paulo e teríamos que nos ver em alguns dias para o penúltimo debate, seria muito mais fácil tratarmos do que quer que isso seja quando não estivéssemos cumprindo a agenda de campanha.
Eu e Haddad nunca fomos tão próximos assim, mas eu costumava tratar com ele sobre algumas as ocupações do MTST quando ele era prefeito de São Paulo. Mesmo estando restringido pelo governo do estado (Alckmin, aquele picolé de chuchu corrupto, como Ciro sempre o chama) e tendo reagido muito mal ao nosso movimento no início da gestão, depois de muito diálogo ele procurou nos auxiliar e na gestão dele conseguimos expandir o movimento por uma moradia digna.
Ainda que fizesse parte do alto escalão da política paulista na época, passou a não nos tratar mal como literalmente todos os outros chefes de governo e por isso eu e ele tínhamos uma relação até amigável. Nos afastamos depois do impeachment por motivos políticos, já que ele até hoje insiste em se associar com golpistas e então meio que o coloquei no mesmo balaio que os outros políticos da elite. Depois daquela pequena conversa que tivemos no SBT, entretanto, me peguei pensando um pouco mais nele.
E então, resolvo que talvez deva dar uma chance ao que ele quer me dizer. Pego meu celular e digito uma mensagem de volta para ele:
"Acho que vou passar a noite em BH, então podemos conversar melhor mais tarde. Sobre o que quer falar?"
"Prefiro tratar disso pessoalmente, pode ser?"
"Claro."
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Garoto Promissor (Ciro x Boulos)
Fanfiction*Repostando aqui porque o site ao lado me expulsou* Guilherme Boulos e Ciro Gomes são candidatos à presidência do Brasil. Seria um escândalo e tanto se eles tivessem um relacionamento, não é? TW: Abuso psicológico, tabagismo