LX -O General e os Elfos

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Gary DiPata jamais esperaria tamanha habilidade da parte do povo mais pacífico em toda Érestha. Nicolle de Vie concordava. Os dois tinham bastante conhecimento sobre o povo; Gary por ter vivido na província daterra por toda sua vida e Nicolle por ter trabalhado com eles nos últimos dois anos. Nenhum dos dois apostaria uma moeda neles como soldados, mas aprenderam que arrependeriam-se quando o exército de Tabata chegou à cidade da rainha.

Não, eles não eram espertos nas artes de luta como os soldados da guarda pessoal de Thaila. Não, nenhum deles carregava uma arma maior do que uma adaga. Mas eles tinham truques. Muitos truques que assustavam até mesmo os de Gary.

-Assim será vencida esta guerra, meu filho: com truques –Gary disse para Gustavo, apertando o ombro do menino impaciente. –É a única maneira de vencer a morte.

Nicolle cavalgava ao lado deles, ouvindo e observando os elfos correndo pelas ruas da cidade. Reycaryn estava com eles também. Gary DiPrata comandava os soldados com armas, o elfo comandava aquels com pós e magia. Nicolle controlava o elfo.

Reycaryn era um dos únicos de seu povo pacífico que interessava-se por técnicas e luta e auto-defesa, e portanto, o único qualificado o bastante para comandar os voluntários. Uma pena ele ser tão difícil de lidar e detestar tanto a família real após a morte de seu líder Átila. Ao menos ele e Nicolle tinham algo em comum: ambos odiavam Tabata. A menina estava sinceramente esperando que ele se voltasse contra os homens de Gary caso tivesse sucesso contra os da morte. E o maior problema é que parecia que ela era a única que via as coisas dessa maneira.

A atitude do filho do general também não era muito profissinal. Ele ficava resmungando, olhando em volta, procurando pela sua irmã. Seu objetivo não era acabar a guerra, mas vingar-se. Tudo isso preocupava a menina dos cachos cor de caramelo. A guerra podia até ser vencida com truques, mas jamais acabraia se todos continuassem com o espírito da vingança. Gary DiPrata não via nada disso. Ele só queria ver sua filha, e nem prestava muita aenção em Nicolle. A menina cavalgava no meio dos dois DiPrata e Reycaryn vinha logo atrás. Ela mal carregava uma arma com ela, apenas confiava nos outros.

Gary não havia pensado muito nela durante todo o tempo em que percorria as ruas liderando seus homens. A menina era quieta. E não era muito importante de uma maneira ou de outra. A princesa Argia arranjaria outras amigas. Ele tinha muita fé em Dave Fellows e no plano de Dafne. Confiava nas leituras de Riley e nas decisões do resto da família real. Até mesmo confiava em Alícia como guerreira, protetora e general de sua princesa. Tudo isso porquê sabia que sua Isabelle aprovava tudo. O homem estava imerso em uma competição pessoal contra seu próprio filho para ver quem a encontrava primeiro. Pedro estava atrás de Argia e Tabata dentro Castelo. Pelo raciocínio deles, era óbvio que seria ela a responsável pela cidade da rainha. A cada segundo que ele passava gritando ordens para seus homens ele pensava em acelerar a corrida do cavalo como se pudesse acelerar o tempo.

O sol já estava em seus primeiros momentos quando todo o caos virou uma confusão completa. Já era complicado liderar seus homens no meio de fumaça, pós e poções élficas que Gary não conhecia, mas quando os soldados de Tabata pararam de lutar para se entreolhar, confusos, foi ainda pior. Alguns se rendiam, jogando-se de joelhos no chão e levantando as mãos para os céus. Outros gritavam palavras de vingança entre si. Alguns até mesmo voltaram-se contra si mesmos, e os soldados da rainha caíram em confusão. Em um primeiro momento, Gary e Reycaryn também pararam para entreolhar-se. Mas logo em seguida um pensamento atingiu o general.

-Vitória –ele falou baixo, um sorriso surgindo no canto de seus lábios.

Nicolle não estava prestando muita atenção na batalha em si. Na verdade, ela só estava ali esperando que o general precisasse dela para trazer algum de seus soldados de volta à vida. Até agora ele não tinha pedido nada, mesmo tendo sofrido muitas perdas. Suspeitava que estava ali por Gustavo DiPrata, não pelos outros. Além disso, tentava ao máximo concentrar-se em Argia e no legado da Vida. Qualquer pequena alteração e ela correria de volta para a província de Cristal, mesmo que tivesse que achar seu caminho sozinha. Mas aquele sussurro do diretor chamou a atenção da menina. Ela também sentiu.

-Nós, conseguimos? -ela perguntou, baixinho, olhando para as próprias mãos.

-Tabata Jane Bermonth está morta! -Comemorou o General.

Em um instante, os soldados negros mais fiéis voltaram a batalhar, urrando palavras de vingança. Gary, distraído e imerso na ilusão de vitória automática, era um alvo muito fácil. Seu pescoço desprotegido foi atingido por um facão já sujo de sangue e lama seca, e o homem tombou para trás ainda com o sorriso estampado no rosto.

Nicolle, horrorizada, demorou demais para pensar em afasta-lo da confusão e tentar ir atrás dele no limbo. Os homens de Tabata celebraram aquela morte e roubaram o corpo para eles. Reycaryn e Gustavo, irados, foram atrás dos homens matando qualquer coisa que se mechesse em seu caminho. E a menina dos cachos cor de caramelo permaneceu nas costas de seu cavalo, boquiaberta e com légrimas escorrendo por suas bochechas. Ela queria correr, bater na porta de alguma casa e esconder-se ali até que tudo se ajeitasse. Esporou o cavalo, mas não foi muito longe. O bater de asas de um dragão enorme fez o animal assustar-se, empinar e derrubar Nicolle de Vie. Ela caiu sentada, e permaneceu ali a observar o pouso majestojo de um réptil gigante com escamas preto-arroxeadas que cuspia fogo para o céu. O bixo carregava uma Isabelle DiPrata que se contorcia no braços de um menino e a princesa da terra, rindo como louca com metade do corpo queimado e sangue escorrendo de sua boca. Um outro dragão vinha logo atrás, com os gêmeos Weis pilotando.

Nicolle, embora espantada com o animal, não mexeu um músculo quando ele pousou bem ao seu lado. No momento em que Isabelle pulou das costas de Frentus e caiu em seus joelhos, mordendo os próprios lábios para suportar alguma dor, um silêncio invadiu as ruas da cidade. Nenhum pássaro cantou o nascer do sol, nenhum soldado matou por vingança e nenhum elfo usou truques contra seus inimigos. Todos ficaram quietos, instantaneamente.

-Todos os que um dia morreram, podem morrer de novo -falou a menina com o vestido preto e verde e a coroa de ágata preta e branca. Mais da metade dos homens vestido de negro caíram ao chão de pedra, côndefas de Tabata mortas mais uma vez. A princesa da terra, ainda sentada nas costas do animal, tinha agora lágrimas em seus olhos, e Nicolle tinha certeza de que eram de alívio. -Os outros, voltem para casa. Acabou. Não há mais luta. Sou a princesa da nova era, e declaro paz entra as províncias de Érestha.

Por mais alguns segundos, ninguém ousou dizer nada, ou fazer nada ou ao menos respirar. As instruções dadas à Nicolle já tinham todas sido cumpridas, e ela sentia-se apenas fazendo tempo extra naquele campo de batalha. Não tinha Dave e Alícia e Riley e Rick e Missie com reuniões e pedidos para ela. Talvez fosse hora de voltar para Argia e arrumar a bagunça do reino de cristal. A menina pôs-se de pé, descobrindo um tornozelo torcido, e curvou-se para Isabelle. Ela só queria ir para Rick e sua princesa, ver se estavam bem e talvez descansar um pouco. Todos imitaram a menina, e curvaram-se também para a nova princesa da morte. Tâmara desceu do dragão com a melhor postura que poderia manter em suas condições.

-Não temos tempo a perder, vamos arrumar essa bagunça e cuidar de quem precisa. Onde está o meu general? -ela perguntou para a menina.

-Meu pai está morto -respondeu Gustavo, aproximando-se em seu cavalo.

Se Nicolle não tivesse dado um passo para o lado ela teria sido decaptada. O menino carregava sua espada apontada para frente, com os olhos fitando Isabelle, e não importava-se em acertar Nicolle ou Tâmara junto. Ele saltou do animal quando aproximou-se o bastante, mas Isabelle já estava pronta para o confronto, e puxou sua espada albina para desarma-lo. A menina conseguiu empurrar a arma da mão dele em poucos segundos, e atirou a sua no chão também. Insatisfeito, Gustavo avançou contra ela e segurou seu pescoço com as duas mãos. Isabelle não tentou defender-se e deixou que seu rosto pálido ficasse vermelho, depois roxo pela falta de ar. Tinham até lágrimas nos seus olhos. Ela conseguiu muito facilmente usar seu legado contra o irmão. Como princesa, ela conseguia regular sua habilidade de morte, e Nicolle literalmente via a vida esvaindo do corpo de Gustavo. Ele perdeu suas forças e desmaiou. Isabelle olhou para Nicolle, e ela assentiu, entendendo seu pedido.

-Quero conversar com meu irmão quando tudo se acalmar -falou a nova princesa.

-Não se preocupe, ele vai ficar bem -Nicolle sorriu.

-Vamos fazer o que Tâmara mandou -Isabelle continuou. -Mandem pessoas avisar os outros príncipes sobre Tabata e convoquem uma reunião no Castelo de Vidro. Sei que Thaila logo voltará. Ela deve ter sentido a morte de sua irmã.

-Sim senhora. Obrigada, senhora.

Isabelle sorriu para os cachos cor de caramelo.

Érestha -Castelo de Ilusões [LIVRO 5]Onde histórias criam vida. Descubra agora