Demônio particular

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Há vinte anos

O seu corpo tremia diante do destino incerto que lhe esperava, não sabendo para onde ia, tendo noção que poderia acabar em uma situação pior daquela que estava vivendo há seis meses, quando em um momento de desespero fugiu de casa. Afinal, sentia um pânico toda vez que via um homem alto, de cabelos castanhos claros e olhos azuis. Era o perfil do seu pior pesadelo, tinha certeza que nada poderia ser pior que Louis.

Desejando ficar longe das ruas e longe daquele animal que provavelmente estava lhe procurando, decidiu subir naquela van e torcendo para não acabar com sua vida por ter tomado aquela escolha, esperava que o medo que sentia em suas entranhas não lhe levasse para uma situação pior. Seus orbes esverdeados ficavam vidrados nas ruas que passava, observando as pessoas, os comércios e as crianças.

Pensava em sua mãe e imaginava se ela ainda estivesse viva teria uma vida diferente, iria para a escola, teria amigas e amigos, dormiria sem medo à noite e se aconchegaria nos braços dela quando se sentisse assustada com algo. Talvez, não teria um pai, porém, saberia que seria feliz ao lado da pessoa que mais lhe amou enquanto estava viva. Tinha memórias vivas de sua mãe e quando fechava os olhos conseguia sentir o amor que transbordava dela.

Respirou fundo, espantando as lembranças ou então começaria a chorar, Lydia havia cansado de chorar, por isso, desviou o olhar para longe da janela e encarou alguns outros jovens que iam consigo para um lugar incerto. Então, seus orbes focaram em uma garota do outro lado da van, sentada no banco com as mãos entrelaçadas enquanto que seus olhos estavam vidrados na paisagem que conseguia ver através da janela.

Lydia achou que ela deveria ter a sua idade, estava suja, com roupas rasgadas, tinha os cabelos negros bagunçados e seu lábio inferior estava machucado, assim, como percebeu que o seu corpo também deveria ter alguns hematomas. Ela parecia uma moradora de  rua como qualquer uma naquele lugar, porém, ela tinha uma aura sombria que apenas afirmava que ela era perigosa. Ou talvez, fosse sua imaginação que não lhe fazia confiar em ninguém.

Desviou sua atenção quando a van estacionou, Lydia respirou fundo, tentando fazer suas mãos pararem de tremer, visto que, a porta foi aberta e Lydia foi arrastada até sair da van e visualizar a fachada no orfanato da cidade. Desejou que pudesse encontrar uma família e ser feliz.

Atualmente

Ofegou ao sentir a água gelada contra si, realmente doía, parecia inúmeras facas cortando sua pele e lhe rasgando sem piedade. Porém, mesmo assim nada saía de sua boca, não iria falar nada não até vê-la, mesmo sabendo que Scott não deixaria que sua protegida passasse por aquelas portas. Não poderia ver sua amiga; ou melhor sua antiga amiga, nua sentada em uma cadeira no meio de um lugar escuro e vazio, amarrada e sentindo uma dor descomunal enquanto era ferida por aqueles que um dia lhe prometeram que sempre estaria segura, até traí-los.

Não necessariamente, acreditava.

Fechou os olhos abaixando sua cabeça, ofegante, tentando acumular forças para continuar viva, visto que, a organização Kanima não tinha piedade, nem consigo, havia sentido cada gesto doloroso contra si que estava pensando se realmente deveria manter-se de boca fechada. Malia nunca pensou que teria que passar por um processo como aquele novamente, havia esquecido de como era ficar presa enquanto lhe torturavam. Estava tão frio que sentia seu corpo dormente diante do espaço vazio onde estava trancafiada e a temperatura baixando a cada hora.

— Melhor dizer algo Malia ou vai acabar morrendo.

Foi a voz de Isaac que quebrou o silêncio novamente, queria rir, era engraçado a forma que via Isaac, lembrava-se que quando cruzaram o mundo para irem se afiliar a uma organização de assassinos pensou que nunca iria ver aquele lado deles, como era ingênua, havia realmente interpretado e fundido com o seu papel que tinha esquecido de como era matar, de como era ser um soldado sem piedade, agora ali encarando Isaac sentado em uma cadeira à sua frente vestindo apenas preto, recordou-se do tempo que estava do outro lado.

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