3

402 54 2
                                    

Delegado Moisés

- Aparentemente ela possui uma vida perfeita, é a pessoa perfeita, amiga e namorada perfeita, o tipo de garota que todos querem, mas que poucos podem ter - Olho novamente para os depoimentos colhidos de colegas e professores da faculdade - Mas, quando você entra a fundo na vida dela, pegando pertences e redes sociais você descobre coisas bem escondidas da vida das pessoas, olha.

Mostro todos os documentos e fotos para meu parceiro James, dando-lhe tempo de ver o que quero dizer. Já estávamos cuidando do caso a quatro dias, totalizando uma semana que a garota estava sumida e seu celular, que fora deixado para trás, estava servindo como a principal fonte de informação para nós no momento.

- Muita gente entrou em contato com a mídia também, depois que espalhamos fotos dela por aí.

- Sim, eu vi. Ao que tudo indica a vida perfeita da senhorita Anna, não era tão perfeita assim. Ela escolheu uma faculdade longe para ficar longe da família, teve sérios problemas com o padrasto e o filho dele, o pai a abandonou quando ela tinha dez anos e a mãe seguiu em frente com uma nova família, sendo muito ausente na vida da filha.

- As fotos dela são muito superficiais, como se ela montasse todas as cenas perfeitas para demonstrar nas redes uma vida falsa, alegre e muito longe do que a vida dela realmente era.

Uma coisa era certa, tínhamos muitos suspeitos com motivos para fazer mal a garota, mas nenhuma prova concreta de qual deles teria finalmente agido contra ela - Vamos passar os nomes de suspeitos um por um e ver o grau de importância que daremos a cada um, depois começaremos a chamá-los para depor novamente.

- Acho que podemos começar pela melhor amiga, Sabrina. Uma menina aparentemente doce e dedicada a tudo que faz e que amava a vitima como se fosse sua irmã, mas, que apesar disso parece remoer um belo ciúmes do namoro da vitima com o senhor Cory, que pelo que sabemos era amigo primeiro dela e só depois conheceu a Anna.

- Sim! Ela se mostrou bem vaga quanto ao senhor Cory quando veio depor, mas seguindo o relato de colegas e professores, os dois mais pareciam um casal quando estavam juntos e quando Anna se unia a eles, todos achavam que eles formavam um belo triângulo amoroso, mas a questão é, quanto disso do que era visto e falado era de conhecimento da vitima?

- Acho que aqui temos uma suposição do que aconteceu naquela noite para Anna sair daquele jeito da casa sem levar nada. Ela entra no quarto, vê o namorado junto da melhor amiga e sai desesperada. Os dois vão atrás dela e temos a questão: eles realmente não a encontraram, ou a teriam encontrado, as coisas saíram dos eixos e Anna acabou morta por um deles, ou pelos dois?

- Os dois certamente continuam na lista de suspeitos, mas não podemos considerar que a vitima esteja morta, sabe o que dizem, sem corpo, sem provas. - Colo a foto dos dois no quadro daquele caso e parto para o próximo nome na lista - Jony?

- Não o vejo mais como um suspeito - Olho surpreso para ele - No começo, para mim era óbvio que ele poderia muito bem ter ficado por ali e pegado ela, mas se ele tinha esse objetivo, porque levar Anna até em casa e só depois resolver fazer algo? Ele já a tinha bêbada no carro antes de tudo isso e não fez nada... E outra, o cara parece ser o único que ainda se importa com o paradeiro da menina de verdade, da para ver que ele realmente era amigo dela e quer encontrá-la.

- A Sabrina também esta tão preocupada quanto ele ao meu ver.

- Mas ela tem o rabo preso, a preocupação dela é se ela será acusada ou não, ela continua no quadro, agora o senhor Jonathas sai. - Concordo com James e arquivo a foto de Jony, o tirando da lista de suspeitos.

- Da família dela, o que você acha? Para mim cada um deles poderia entrar nessa lista de suspeitos sem pensar duas vezes.

- Também penso assim, a mãe Carla, não parou um minuto de repetir desde que chegou aqui, de que mesmo na morte a filha só sabe lhe dar trabalho, nunca vi uma pessoa afirmar tão fácil que um filho esta morto como ela fez. O padrasto parece que acusou ela de roubo pouco antes dela ir embora e nos anos que moraram juntos os vizinhos disseram que os dois só sabiam brigar e que inclusive ele já teria agredido ela duas vezes e ficado por isso mesmo. E por fim temos o filho do padrasto, que teria sido acusado pela Anna ao diretor do colégio em que estudavam de tê-la agredido sexualmente, algo que também ficou por isso mesmo já que o menino era um aluno exemplo e a família dela tinha dinheiro para abafar os rumores juntos da escola. Em qualquer um dos três eu conseguiria ver um caso de vingança ou crime de ódio.

- Mas porque só agora, sendo que desde que começou a estudar Anna nunca mais entrou em contato com qualquer um deles, não existem conversas, transações, nada que ligue ela a família nos últimos anos, a não ser com o pai, que teria entrado em contato com ela meses atrás, segundo a Sabrina afirmou e Cory confirmou. O cara estava atrás de dinheiro e até onde sabemos ela não deu nada a ele, sem contar que a mãe declarou que o pai da vitima era um homem desiquilibrado e viciado, para ele ter feito algo por raiva...

- Então colocamos ele como suspeito e tiramos os outros três, chefe?

- Não... Colocamos ele como um dos principais junto com Sabrina e Cory e os outros três colocamos na segunda coluna, eles continuam como suspeitos, mas como secundários.

- Então acho que fechamos a lista de suspeitos, ela não tinha mais nenhuma inimizade, brigas, não sofria nenhuma ameaça, não tinha nenhum admirador atrás dela que saibamos, era amada na faculdade e admirada por professores e funcionários, é isso que temos... Os principais e únicos suspeitos são as pessoas mais próximas dela, tirando apenas o amigo Jony.

- Sim, é isso que temos... - Paro pensativo e olho para James, que parece obter a mesma expressão em seu rosto - Não consigo tirar da cabeça que tem mais coisa nessa história que nós simplesmente não estamos vendo...

- Eu também chefe, os suspeitos parecem ser tão óbvios, tenho medo de ser alguém sem ligação alguma com a vitima e acabarmos com um caso sem solução... Ou pior, de que o suspeito seja alguém ligado a ela, mas que nós simplesmente não conseguimos descobrir. Vemos todos os dias casos que terminam sem uma solução e são arquivados por falta de provas, ou que são solucionados anos depois quando a vitima aparece e descobrimos que ela sempre esteve bem embaixo do nariz da policia... Não sei se eu conseguiria me perdoar se falhasse neste caso por ter deixado algo bobo passar.

- Nem eu, mas infelizmente temos que trabalhar com o que temos, continuar pedindo que a população coopere com qualquer informação que tiverem e colhendo depoimentos dos suspeitos. Eu queria poder entrar em cada lugar dessa cidade atrás dela, mas como não podemos, temos que continuar tentando resolver com o que a lei nos permite e buscarmos fazer por ela o que a família não esta, tentarmos não desistir do caso apenas porque convém e seria mais fácil voltarmos para nossas vidas normalmente.

- Eu estou com você chefe, enquanto puder ajudar no caso, estarei aqui!

Nosso foco se voltou única e exclusivamente para este caso, qualquer nova ocorrência era passada para os outros policiais em trabalho, somos uma cidade pequena, com um pequeno distrito policial e um reduzido número de policiais, mas conseguimos levar assim por um grande tempo, porém após dez meses de busca, a corregedoria nos obrigou a arquivar o caso e só abri-lo em caso de uma nova pista aparecer, o que até hoje, um ano após o ocorrido, nunca mais aconteceu. Na delegacia continuamos resolvendo nossos pequenos casos de furtos, brigas e ameaças, com um caso arquivado que parece pesar sobre nossas costas por não o termos resolvido. Os envolvidos voltaram a suas vidas, os que estudavam retornaram aos seus cursos, os que trabalhavam, aos seus devidos trabalhos e a família que já não ligava para a filha distante, a sepultou e enterrou, mesmo sem um corpo que comprovasse isso. Hoje, Anna possuía uma lápide, que para eles significava o fim daquele caso e para mim um lembrete, de que uma jovem ainda estava por ai, assim como muitas outras, desamparada e sem que eu pudesse fazer nada a respeito, eu falhara com ela, assim como a justiça já falhara inúmeras outras vezes em casos parecidos...

AnnaOnde histórias criam vida. Descubra agora