[15] Bud

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Eu pensava que depois de tudo que já passara em minha lua de mel, jamais voltaria a me sentir tão sem jeito de novo, mas eu já devia estar acostumado ao meu constante engano — assim como àquela frase: "não há nada ruim demais que não possa ser piorado".

O olhar de minha avó pesava sobre mim como a gravidade em ponto morto, me esmagando sem a mínima piedade, mas eu via que ela também estava nervosa. Eu sentia que a conversa que estávamos prestes a ter, apesar de ter sido adiada por tempo demais, tinha sido abordada no momento certo. Eu também me sentia mais tranquilo por meu avô e Jungkook não estarem conosco na sala.

Éramos apenas Kim Jihyun e eu.

— Acredito que você tenha entendido minha reação por você ter voltado para casa apenas ao amanhecer depois de ter passado toda a madrugada fora. — minha avó começou, incerta se aquela era o melhor caminho, mas firme como uma rocha. — Eu espero, verdadeiramente, que isto não se repita.

— E eu espero que vá direto ao ponto, vovó. — tentei soar o mais suave possível, mas engoli em seco quando sua sobrancelha esquerda se ergueu para mim. — Eu esperei explicações por muito tempo, mas agora que está tudo diferente, eu quero saber de tudo. Sobre meus pais, o sumiço deles, eu não aguento a dúvida me matando, vovó, não mais. Então mesmo que doa... Por favor, diga de uma vez.

Ela respirou fundo. Uma, duas vezes, o olhar perdido no chão como quem está afundado numa nostalgia pungente, agoniante, igual a uma areia movediça lhe puxando aos poucos. Eu compreendi e respeitei sua dor por dezenove anos de vida sem nunca reclamar da minha, mas aquela era a hora.

Eu finalmente conheceria minhas origens, e a cada segundo que se passava meu coração batia ainda mais ensandecido em meus ouvidos, nervoso, ansioso, agitado pela questão: "eu quero mesmo saber?".

Sim.

Kim Seokjin vai ser forte.

Porém, percebi que não seria nada fácil ser forte quando senti um arrepio subir minha coluna apenas por sua menção de falar.

Ainda bem que não fiz promessa alguma, foi apenas uma afirmação, ou seja, mutável.

— Seu avô e eu nos conhecemos há mais de quatro décadas. Ele costuma utilizar a crença akai ito para descrever nosso encontro. Sabe como aquele lobo é, totalmente piegas.

Eu ri de seu comentário em agradecimento, pois entendi que ela estava tentando iniciar aquela história da forma mais cautelosa e branda possível. Não demorou muito e ela retornou com sua narratória:

— Nossas famílias não se conheciam, mas estávamos conectados e sentíamo-nos de alguma forma, foi assim que chegamos um ao outro e descobrimos nosso laço de almas gêmeas, mas não vou detalhar nossa história romântica patética para você. — apoiou as costas no encosto da poltrona e daí soube que a história realmente iria começar. — Seu avô passou arrastados anos lutando na Guerra Afiada até que conseguisse uma patente de prestígio e pudesse ter o direito de voltar para casa concebido. Quando o conquistou e retornou, iniciamos um plano de recomeço, nós sabíamos que precisávamos de algo para nos mantermos e nos dar reconhecimento e respeito mutuamente, foi assim que, depois de anos de planejamento, decidimos fundar a empresa. Mas planejamento nenhum nos prepararia para o que estava prestes a acontecer.

Me inclinei um pouco para ouvi-la melhor, querendo saber a história de meus avós e me esquecendo do porquê de termos começado aquele assunto, da vontade de conhecer minhas origens por pura curiosidade, mas por pouco tempo.

— Muitas pessoas morreram na guerra, Seokjin. Milhares. Alfas que traziam sustento para seus ômegas e filhotes nascidos durante a guerra haviam partido. Os ômegas foram em busca de remuneração para que pudessem pelo menos alimentar suas crias. Ainda me lembro de ômegas adoecidos por terem perdido suas almas gêmeas... — ela apertou uma pálpebra contra a outra, se afundando em nostalgia, mas dando continuidade à história sem parar: — Foi lastimável. E nesse meio tempo de ômegas buscarem emprego para não serem consumidos pela fome, nossa fábrica recebeu centenas de pessoas em muito pouco tempo, mas o que nós poderíamos fazer? Éramos uma empresa pequena. Não podíamos acolher tanta gente se nem tínhamos uma primeira colheita para arranjar o salário de nossos funcionários. Apesar dessas adversidades, seu avô e eu não queríamos deixar tantas vidas na penúria, portanto refizemos nosso planejamento e estabelecemos um acordo com todos que queriam ser contratados. Forneceríamos um espaço da fábrica para que pudessem se aquecer, dormir e comida, já que na época empresas parceiras nos doaram muitas cestas como incentivo, em troca de seus serviços. Todos concordaram, e mesmo que fosse assustador algo planejado tão em cima da hora, seu avô e eu apostamos que aquilo daria certo, e nos surpreendemos.

Epiphany [KTH • KSJ]Onde histórias criam vida. Descubra agora