Foi numa quinta-feira que meu destino parecia traçado, desde quando me levantei preguiçosamente e avistei a roda de minha mala espreitando-me debaixo da cama — como se dissesse: "devemos ir embora logo" — até o momento em que vi Taehyung pela primeira vez naquela manhã.
Uma manhã terrível. O céu estava mergulhado num cinza pálido lastimável, as nuvens tinham suas extremidades destacadas por um preto quase imperceptível, a neblina cercava as copas das árvores da floresta do lado de fora da casa e um vento gelado bagunçava os lençóis ainda amarrados nas barras de ferro daquilo que costumava ser uma janela.
Pitoresco. Mas eu definitivamente odiava quintas-feiras.
Meu estômago estava embrulhado — o que me levou a não comer nada —, meus olhos anelados de preto por ter passado a madrugada chorando. Eu sequer sabia se tinha dormido, o torpor agoniante insistia em me manter num estado profundo de pranto e angústia. Quando me dei conta já era manhã, hora de partir.
Eu já me encontrava pronto, passava minha mão vagarosamente pelas pétalas da tulipa cor-de-pele do jardim de inverno qual cuidei ternamente enquanto ali residi, sentindo as gotas que denunciavam o orvalho e também minhas lágrimas que transbordavam de minhas pálpebras tão facilmente, igual meu casamento tinha acabado.
Eu pensava em quantos dias felizes tinha tido naquela casa. Enquanto fechava o zíper de minha mala, me lembrei de que não precisei arrumá-la, pois no segundo dia minhas roupas já estavam em seus devidos lugares tamanho o zelo que Taehyung teve em me acolher.
Enquanto passava da sala de jantar e cozinha até o jardim de inverno, lembrei de quando estava tentando comer pelo menos uma barrinha de cereais em minha semana de cio e Taehyung me arrastou para o quarto novamente, pois sabia que em meu estado seria incapaz de resistir.
Pensei também na primeira impressão que tive da casa, do quanto ela era surreal à primeira vista e do quanto me neguei a habituar-me a ela por saber que logo iria embora se Taehyung tivesse palavra. Me arrepiei pelo sopro gélido que me atingiu ao constatar que, sim, Taehyung tinha palavra.
Taehyung...
O dia podia estar frio, mas não tanto como Taehyung.
O ser humano tem o péssimo hábito de acostumar-se a coisas maravilhosas, apesar de banais — no meu caso o sorriso matinal juntamente com seus olhos inchados de sono, suas provocações incessantes e seu cuidado extremo —, sem dar a elas a devida atenção que merecem.
Apenas quando as perdem.
Eu perdi tudo o que demorei tanto para me considerar digno de ter num piscar de olhos, e em outro piscar chorei mais um pouco, obrigando minhas pernas a se estabilizarem e virarem meu corpo para trás, onde Taehyung estava me observando, impassível. Sequer seu cheiro era o mesmo.
Mas Taehyung não gostava de me ver chorando, deduzi que por isso ele tenha proferido a seguinte frase:
— Você pode levá-las, se quiser. — sua voz estava coberta de rouquidão e eu sabia que não era pelo horário que tínhamos levantado.
Pude ouvir muito bem seus soluços contidos durante a madrugada.
— Não. — sorri fraco, passando a manga de meu casaco sobre o nariz enquanto fechava a porta corrediça do jardim e observava as lindas flores uma última vez. — Eu acho que seu Appa ômega irá querê-las de volta.
Eu estava pronto para voltar de onde nunca deveria ter saído e deveria estar feliz, mas meu coração estava dilacerado.
Fiz um trato com Taehyung, se me apaixonasse por ele ficaria consigo. Era fato. Ao invés de entregar meu coração a ele, o tirei duramente de suas mãos que tanto o amaciaram, o lapidaram como a mais preciosa joia para que fosse cuidado para todo o sempre.
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Epiphany [KTH • KSJ]
Fanfic"Ele chegou por acaso, como uma serendipidade. E me ganhou em toda sua singularidade." - Kim Seokjin [...] Algo que Kim Seokjin, mesmo em sua condição como ômega, não esperava e desejava era se casar com alguém que sequer tivesse alguma noção sobre...