Capítulo XXIII

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Capítulo XXIII

Ela parecia distante e muito pensativa, Jéssica ainda estava confusa com a atitude de Azazyel. Ele ficou irritado depois de ter sido expulso por ela, e ela notou isso. Era inteligente e fazia na maioria das vezes investigação em qualquer um, inclusive faria para descobrir o motivo de ele ter agido daquela maneira com ela. Passou a manhã inteira tentando entrar em contato com Cristian, mas ele não atendia as suas ligações. Por medo, talvez.

─ Merda! – resmungou alto, sem querer.

As meninas olharam para ela e tiveram receio de perguntar-lhe o que estava a acontecer. Naqueles dias, ela andava misteriosa e extremamente estressada. Jéssica sabia a gravidade do problema em que estava metida, Azazyel era um demônio, e isso significava entregar sua alma a ele em troca do favor que fez a ela.

─ Meninas! Preciso resolver algo importante. Poderiam me cobrir por pelo menos duas ou três horas? – falou tirando o jaleco. – Obrigada! – Lola e Valentina olharam para ela sorrindo. Era normal ela agir assim, e sempre trocavam esses favores, por isso elas aceitaram.

─ Antes de ir, o Samuel pediu para fazermos um jantar na sua casa nesse final de semana. – Jéssica a encarou surpresa. – É estranho isso, eu sei. Mas ele disse que quer resolver as diferenças entre vocês. Por favor, amiga eu já aceitei.

─ Devia ter falado comigo antes de aceitar não acha? Afinal será na minha casa. – disse alterada. Nada mudaria as diferenças entre eles, ela sabia disso. Por isso desconfiou, mas se assim seria ela acabou dando a chance. – Só aceito por você Valentina. Diga que será ele a comprar a comida, já que ele tem muito dinheiro. Agora eu preciso ir.

Ela se retirou e as deixou pensando no que ela havia se metido. Estava óbvio para Valentina e Lola, que Jéssica precisava de ajuda, algo que ela dificilmente admitia.

Levou meia hora para chegar à biblioteca, Cristian a viu entrar e tentou fugir dela. Ela foi atrás e o pegou antes que escapasse. Estavam no corredor dos livros antigos, e históricos. Jéssica o beijou a força, Cristian como sempre se rendeu e correspondeu. Azazyel estava lá e viu tudo, aquilo o deixou irritado e pensou em fazer algo, mas antes se lembrou de que aquela era só a mulher que daria vida a quem realmente ama. Não tinha motivos para ficar com ciúmes.

Eles se separaram e Jéssica o encarou, estava assustada e precisava conversar com alguém que sabia dos problemas que tinha. Cristian a levou para uma mesa distante, onde podiam conversar sem que ninguém escutasse. Os dois se sentaram e Cristian teve medo de perguntar, pois temia que se tratasse do acordo com o caído.

─ Eu preciso de ajuda! – sussurrou. – Não faço ideia do que o Azazyel quer comigo.

─ Não pensei que estivesse viva.

─ Felizmente ainda estou, mas não sei por quanto tempo. – baixou o rosto e seus olhos se encheram de lágrimas. Estava assustada com tudo aquilo, mas não arrependida. Ver Lucas perto lhe trazia satisfação, era tudo que importava no momento. – Tive alguns problemas, e Azazyel teve que me proteger de um ser maligno que quer me matar.

─ Como assim? O demônio que provavelmente quer sua alma está a protegê-la?

─ Sim! Mas isso não importa agora. O problema é que ele me beijou numa noite achando que eu estava a dormir, e ontem ele entrou no banheiro e tentou tocar no meu corpo. Eu o senti e perguntei se foi ele, no começo ele recusou, mas depois disse algo que o entregou. – ela falou sussurrando para que ninguém escutasse – Eu não sei o que ele quer comigo e isso me assusta.

Cristian ficou impressionado com cada palavra que saia da boca de Jéssica. Ele tinha mais experiências em relação a esses assuntos e se levantou. Foi até o quarto que levaram o grimório de capa vermelha e depois voltou, com dois livros em suas mãos. Ele os colocou sobre a mesa e abriu o primeiro, era grande e a capa estava estragada. Não dava para ver o nome do autor, nem mesmo do título. Ele abriu o livro numa página e mostrou a Jéssica o que estava escrito lá. Ela se assustou e ficou arrepiada com aquilo. Só de se imaginar naquela situação, ela levantou da cadeira assustada.

─ Eu não posso fazer isso, prefiro morrer. – falou alterada e os outros olharam para ela.

Azazyel leu e riu-se nada daquilo era verdade, eram conclusões feitas por Cristian que pensava saber muito sobre o mundo oculto. Estava escrito na página, que alguns demônios não exigem a alma em troca. Segundo o livro, alguns se satisfazem usando mulheres e homens a atingirem seus desejos carnais. No caso, Cristian concluiu que se o Azazyel ainda mantinha Jéssica viva e protegida, queria usá-la daquela forma visto que ele tentou mais de uma vez ter contato intimo com ela.

─ Isso é besteira. – disse Azazyel. – Não sou como a Kesabel. Essa gente nunca entende que eu sou um guerreiro, nada disso me interessa. Talvez um pouco, mas não desse jeito.

Ninguém o escutou, Cristian recomendou a Jéssica que se sentasse e tentou acalmá-la.

─ Talvez eu esteja errado, mas se ele continuar com isso melhor você pensar melhor antes de recusar fazer o que ele quer. – falou e Azazyel teve a vontade de ficar visível e dizer que ele estava sim errado. – A espécie deles não tem escrúpulos, por isso talvez ele queira usar você como fantoche. Uns acreditam que antigamente, anjos caídos se apaixonavam por humanas, mas esse tipo de relação nunca acabava bem. As mulheres eram queimadas vivas como as bruxas, ou cortadas o pescoço pelo povo.

─ Eu só quero me livrar desse Azazyel. – falou.

─ Meu conselho é esse! Se ele voltar a tentar ter esse tipo de contato com você, deixe rolar, sei que pode ser difícil. Mas se quer acabar com isso melhor cumprir com acordo.

─ Não posso dormir com um demônio. – disse alterada.

─ Só estou tentando ajudar, a decisão final é sua.

Uma hora se passou e Jéssica voltou para casa, não tinha mais ânimo para trabalhar. Ligou para Valentina e disse que não voltaria à farmácia. Jogou o celular na mesa e se deitou no sofá, cansada e angustiada. Era demais tudo aquilo.

Seu coração estava partido, não imaginava chegar a isso. As lágrimas que tentou segurar não resistiram e caíram de seus olhos. Eram amargas. Seu peito apertava de tanta dor e angústia. Ela chorou, por ter permitido tudo aquilo acontecer. Tentou fazer algo bom para salvar a amiga de Kesabel e Samuel, mas no final acabou colocando sua própria vida em perigo.

Tirou a blusa que usava e jogou em qualquer canto da sala. Ela não parava de chorar e de se lamentar. Tirou o sutiã e jogou no sofá, se levantou e caminhou devagar até o banheiro. No corredor, ela tirou a calça e a deixou lá. Chorava enquanto tirava cada peça de seu corpo, jogava em qualquer lugar e quando finalmente chegou ao seu destino, ligou o chuveiro e ficou debaixo da água fria. Era assim que ela chorava. No banheiro, debaixo do chuveiro.

A água continuou caindo sobre seu corpo, e ela não parou de chorar. Molhou seu cabelo, não se importou em gritar de dor. Bateu repetidas vezes a parede com os punhos, mas nada podia ser feito para reverter à situação.

Azazyel adorava ver sua dor, mesmo sabendo que o trato não seria esse que Cristian a fez acreditar, ele não quis alertá-la. Vê-la sofrer o satisfazia melhor do que qualquer coisa. Ele entrou no banheiro e viu Jéssica fragilizada. Fazia mais de meia hora que ela estava debaixo da água fria, chorando desesperada. Ele continuou assistindo-a satisfeito com a dor que ela sentia, mas aos poucos Jéssica perdia as forças e acabou desmaiando no banheiro.

Embora gostasse de vê-la sofrer, Azazyel não queria que ela morresse. Aproximou-se dela e a tirou debaixo do chuveiro, verificou se estava viva e suspirou aliviado ao notar que ainda tinha batimentos cardíacos. Ele a carregou em seus braços e enrolou seu corpo descoberto e gelado numa toalha. Secou os seus cabelos e a colocou na cama, ainda inconsciente.

─ Não se atreva a morrer Jéssica, você é a única chance que tenho em mil anos, e não estou disposto a esperar mais mil para achar outra igual à Isadora.

Sentou-se na cama ao seu lado e tocou o seu corpo, ela estava gelada e podia ficar doente. Ele se deitou ao seu lado, e usando os seus poderes, manteve Jéssica quente e enrolada em seus braços. Ficou ao seu lado esperando ela reagir ao seu calor. Naquele instante, ele fez um papel de guardião, pois mesmo sendo um caído, garantiu que ela sobrevivesse. Tinha seus propósitos, mas aquele ato fez diferença para ele. Pela primeira vez em tantos séculos, Azazyel sentiu algo bom, diferente do que estava acostumado. Sorriu observando-a desmaiada, ela estava tranquila e serena.

─ Você fica melhor inconsciente. – sussurrou no ouvido dela, e cuidou que nada de mal lhe acontecesse. 

Guardiões - O Anjo De Valentina [Livro I ].  Onde histórias criam vida. Descubra agora