21: A saída

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Durante a semana, Abner foi cedo para o trabalho, sem encontrar o urso negro por lá. Teve certeza de que o que disse fora errado. Não deveria ter dito aquilo. Fora idiota. Magoou os sentimentos de alguém que gostava dele, que amava ele, que queria ele. Havia dito as palavras erradas em um momento errado.

Seu coração sentia falta do urso negro agora, bem mais do que sentia do urso pardo que havia deixado para trás há cinco anos e meio. Sua vontade de pedir desculpas era grande, mas sentiu que já havia pedido desculpas demais na casa dele. Mas e se não fossem suficientes?

Seu pai não questionou porque havia voltado mais cedo, apenas o julgou com o olhar como sempre faz. E vez ou outra, discutia com Abner sobre ele ter a obrigação de ficar ali com a família.

Abner apenas ignorou as palavras do pai e continuou seguindo a vida com o coração partido por ter falado as coisas erradas para quem estava amando ele. A culpa pesava em seus ombros e pesava cada vez mais com o passar dos dias.

Sempre havia um médico que visitava a casa uma vez por mês para ver a condição dos doentes do lar. Os avós ainda precisavam de tratamento, já os tios, por outro lado, precisavam de mais quinze dias e já estariam livres do tratamento, ou seja: curados; mas que seria necessário um processo de exercícios para recuperarem alguns reflexos e a força corporal.

Os dias passaram, as semanas passaram... Seu coração sentiu-se pesado e respirar era difícil. Até que, enquanto estava trabalhando, uma mão acariciou suas costas da mesma forma que o urso negro fazia. Virou-se para trás e seu coração se acelerou de felicidade ao vê-lo e mais ainda quando o urso negro fez um movimento rápido, encontrando a boca dele na sua, roubando-lhe um beijo à frente de todos.

Foi rápido e levou alguns poucos segundos. O suficiente para as pessoas ali perto notarem. O urso negro se afastou e foi embora caminhando de costas até a saída, olhando fixamente para o lobo-guará com um sorriso no rosto, indicando que o esperava após o trabalho.

Não demorou muito para ser chamado pelo chefe, questionado sobre o que acabara de acontecer. Ele se recusou a explicar, apenas deixou que o chefe derramasse o erro que havia cometido na frente dos clientes e acabou recebendo alguns papéis para assinar: sua demissão.

Sentiu-se mal por isso, contudo, pela atitude do urso negro, soube que a relação deles não estava cortada. Assim que saiu do mercado, encontrou o urso negro sentado em frente ao seu carrinho de salgados e café.

Abner se aproximou e Régis levantou-se do banco em que estava sentado, indo de encontro ao lobo-guará, puxando-o para um beijo apaixonado. O lobo-guará o correspondeu, mas interrompeu o beijo, pois havia um pequeno público ali olhando para eles. O urso negro o segurou com força contra ele e, pela primeira vez ao tentar separar-se dele, percebeu a força que aqueles braços tinham. Não conseguiu nem mesmo mover os braços dele. Nesse momento percebeu o quanto Régis o queria.

― As pessoas estão olhando ― lembrou-o.

― Eu sei ― falou o urso negro. ― Deixe-me perguntar: seus tios já estão curados?

― Sim! ― respondeu.

― Perfeito ― um sorriso se alargou na boca do urso negro que se conteve em beija-lo novamente. ― Eu vou com você para Campo Grande! Vou levar você, então arrume suas malas.

Os olhos do lobo-guará brilharam ao ouvir aquilo e ele pediu para que o urso negro o soltasse para que fosse buscar suas coisas em casa. O urso negro apenas recolheria seu carrinho ― e seu (possível) lobo-guará ― e então poderiam partir. Como era um serviço rápido, eles mesmos o fizeram. Primeiro, Régis foi buscar a caminhonete, que tinha a traseira lotada de coisas, depois, desmontaram o carrinho e o colocaram por cima das coisas que haviam ali. O urso negro passou a corda ao redor de tudo aquilo para não cair nada durante a viagem.

Bernardo e AbnerOnde histórias criam vida. Descubra agora