Eram poucas caixas e leves, por isso, fáceis de carregar e Mike prontificou-se para ajudar Chester na mudança. Aliás, aquilo nem configurava uma mudança, era mais uma alteração de lugar de meia dúzia de coisas. Roupa e calçado, na sua maioria, alguns discos, revistas, bonecos, caixas de jogos. Colocou as caixas no porta bagagens do carro do seu pai e foi ele a conduzir até à nova casa do amigo.
Deixaram a música que tocava no autorrádio colocar-se entre eles, criando um muro que os separava em dois países diferentes para evitar grandes conversas. Mike apertava com força o volante e olhava para a estrada e para o trânsito. Chester debruçava-se sobre a janela totalmente aberta, o queixo assente nos braços, a olhar para o movimento nos passeios.
Na noite anterior tinha acontecido o seu primeiro encontro sexual e havia aquela típica tensão entre amigos que se conheciam há demasiado tempo e que nunca tinham considerado estabelecer esse tipo de intimidade, mas acontecera e não havia palavra ou gesto que pudesse desmanchar o ocorrido. Era como o azedume do arrependimento e o amargor da instalação da dúvida.
Mike, da parte que lhe tocava, não estava arrependido, mas não se sentia totalmente à vontade com a lembrança do que ele e Chester tinham feito. Fora demasiado estranho – para dizer o mínimo. Tudo nascera de impulso. Ele fizera o convite mudo e Chester, simplesmente, aceitara-o. Ninguém forçara nada ao outro e no fim admitiram que estava tudo bem.
O certo era que não estava e a prova era aquela manhã.
À luz do dia, com o sol forte de um típico dia de primavera na Califórnia, não se conseguiam encarar. Chester desviava-se dele, cabisbaixo, respondia-lhe com monossílabos e ele também não sabia como contornar aquela situação. As suas perguntas eram curtas, rodeava Chester para evitar qualquer contacto fortuito, a ansiedade dominava a sua atitude. Falava num tom um pouco acima do normal, impunha-se, movia-se depressa e em bicos dos pés.
Talvez a mudança do amigo para a nova morada tivesse vindo em boa altura, deu por si a pensar. Assim, não veria o Chester com tanta frequência, já que ele iria desocupar a cave de sua casa e as tentações terminariam, incluindo a pressão de existir uma qualquer continuação do que quer que tivesse acontecido.
Merda! Eles tinham a banda musical juntos! Estavam a fazer um sucesso dos diabos e seriam ainda mais famosos. Tocavam em pequenos palcos pela América como grupo de apoio, em breve seriam as estrelas de cartaz. Começavam a dar entrevistas e eles eram quem os jornalistas e os fãs queriam ouvir, os dois vocalistas, os dois compositores e letristas. Forçosamente teriam de saber gerir aquilo!
Raciocinando friamente, o que eles fizeram na cama foi um encontro de uma noite. Ele tinha curiosidade, sentia uma atração muito forte pelo Chester e acontecera que ele correspondeu – só porque estava bêbado e, muito provavelmente, também pedrado. Fim da história. Não havia mais nada a acrescentar. Contudo, aquilo tinha de ficar esclarecido. Precisavam de falar, uma conversa natural.
Chegaram ao bairro onde o Chester iria morar. As casas eram modestas, de dois pisos. Entre os lotes havia muitas árvores. Ele apontou qual era a casa certa e Mike estacionou junto ao passeio. Enquanto se aproximava do alpendre, Chester retirava as chaves do bolso do casaco. Estava um calor muito grande, mas ele vestira o casaco por cima da blusa interior de alças. O odor adocicado do seu suor deixou um rasto no interior do carro. Mike respirou fundo, deixando que entrasse nas suas narinas, relembrando quando Chester se viera depois... depois de... de ter estado dentro dele.
Remexeu-se no assento do carro, ofegando com o desejo de voltar a sentir aquilo. Será que ele era homossexual e só agora o estava a descobrir? Não, não era possível. Ele não gostava de homens, gostava de mulheres. Ele não voltava a cabeça quando passava um tipo que seria atraente, nem sabia definir esse conceito, de um homem bonito. Ele gostava de mulheres e conseguia distinguir as feias das lindas, sem qualquer hesitação. As boazudas, os aviões, as girafas, as que lhe davam tusa. Aquela mania ou tendência ou fixação ou o que seria era só com o Chester, mesmo.
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O Lado Oculto da Lua
Fiksi PenggemarMike e Chester têm uma relação conturbada desde que se conheceram. Guardam segredos e compartilham sentimentos, mostram ao mundo a sua união e desunem-se em privado sem conseguirem viver um sem o outro. Entre encontros e desencontros, altos e baix...