Crise

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POV ARTHUR - 2018

Já fazia algumas horas que eu havia chegado em casa e não consigo tirar o sorriso do rosto, sabe quando suas bochechas doem de tanto sorrir? É tão bom, né? O jantar com a Sanches foi melhor do que eu imaginava, nosso papo fluiu bem, eu sentia falta de sentir essa tensão, esse nervoso quando saímos de casa pra encontrar alguém, o frio na barriga, as mãos suando, aquela pergunta "será que estou bonito o suficiente pra ela?", o medo de falar algo idiota demais, mas ela pareceu não se importa com essas coisas bobas, Sanches foi espontânea, sincera, falou sobre ela o jantar inteiro, foi bom saber que ela gosta de falar.

Ágata vai além de um rostinho bonito no Instagram, vai além daquela arrogância toda. O que será que estava rolando entre a gente? Não estou ficando louco, nossa troca de olhares no restaurante foi intensa, aqueles olhos negros não desgrudavam dos meus, e quando o olhar dela se perdia do meu, voltavam mais intensos ainda. Ágata Sanches, você precisa sair da minha cabeça.

- 2,5mil? - Amanda falou espantada com os olhos arregalados. - Gente, quem compra um vinho desse valor?
- A Sanches. - Falei rindo.
- Sobre o que mais vocês conversaram? - Amanda estava cada vez mais curiosa em relação a Ágata, eu estava a exatamente 3 horas na casa dela falando da Sanches e mostrando mil fotos.

- Sobre a família dela, parece que as coisas não são nada boas em casa... - Falei meio triste, imagina sentir-se mau dentro da sua própria casa todos os dias? Isso é só mais uma prova de que laços sanguíneo não define nada, filhos e pais estão cada vez mais distantes, vivemos no mundo que na maioria das vezes o seu lar, não é a sua casa, as vezes, seu lar é no abraço de alguém, ou naquele lugar que você curte tanto, sabe? Sua família é aquela pessoa que não te deixa na mão por nada nesse mundo e que está sempre ali, por você e pra você. Por isso nós não devemos aceitar nada com a desculpa de "mas ele é o seu pai" ou "mas ela é a sua mãe", certas palavras tem um dano tão irreversível na gente que é um pecado não dar um basta nisso, tem comentários que machucam, acaba com a nossa saúde mental (se é que ainda temos), então por favor, não se calem, não abaixem a cabeça pra absolutamente ninguém, se priorize, família nem sempre é aquela que está dentro de casa com a gente.

- Isso é uma droga, eu sou tão grata por ter uma família que faz jus ao significado da palavra família. - Amanda falava pensativa, parecia estar se pondo no lugar da Ágata.
- Eu também, apesar de que faz apenas alguns anos que as coisas melhoraram lá em casa, você sabe... Meu pai nunca me aceitou desse jeito. - Falei lembrando das inúmeras vezes que o papai corrigia os meus pronomes, algumas vezes ele fazia isso na frente das pessoas, era horrível.
- Seu pai tinha muito que aprender, não o culpe.
- Não culpo, só lamento por ele não poder ver o homem que me tornei, sempre ouvi-lo dizer que sonhava em ter um menino, é uma pena nunca tenha percebido que o sonho dele já havia se realizado, e que estava no quarto chorando e gritando mentalmente que o seu menino estava ali. - Senti uma lágrima quente descendo pelo meu rosto, limpei-a imediatamente recebendo um abraço apertado da Amanda.
- Eu lamento muito, Thur... Acho que no fundo ele sempre soube, só era difícil de lidar.
- É... - Falei sem ânimo algum sentindo minha cabeça pesar com tantos pensamentos. - Vou ao banheiro, tá? - Falei e a mesma assentiu.

Entrei no banheiro sentindo o meu corpo inteiro tremer, as minhas mãos estavam geladas, meu coração acelerado, respiração descompensada, corpo paralisado e na mente eu só conseguia pensar em uma coisa: o meu pai. E se ele aquele acidente não tivesse acontecido, como ele estaria agora com a minha transição? Será que ele me apoiaria ou simplesmente ia fingir que não somos mais da mesma família? O que estava acontecendo comigo? Precisava parar de pensar nisso, mas eu não conseguia, não dava pra parar, minha mente não parava nem um segundo, me olhei no espelho e vi gotas de suor por todo o meu rosto, um choro desesperado saiu e eu cair, o impacto com o chão gelado do banheiro me fez gemer alto em dor, me encolhi no chão, abraçando os meus joelhos tremendo de frio, um frio inexplicável, o dia estava ensolarado, não entendia o que estava acontecendo. Amanda batia na porta desesperada me chamando, mas eu não conseguia responder, ouvi os passos dela se distanciarem e segundos depois voltarem com pressa, o barulho de chave surgiu na fechadura abrindo a porta com pressa.

- Meu Deus, Arthur! - Amanda gritou aproximando-se do meu corpo no chão. - Você consegue me ouvir? - Ela estava desesperada. Eu chorava como uma criança, era difícil me concentrar na Amanda, os pensamentos com o meu pai não íam embora.
- Arthur, eu preciso que você se acalme e respire fundo, ok? Eu não posso me desesperar, preciso te ajudar, então por favor, tenta se concentrar em mim. - Amanda falava levantando o meu rosto, levando a minha atenção pra ela, eu a olhava mas não conseguia reagir.
- Você pode estar tendo uma crise de ansiedade, eu sei o quanto está sendo difícil pra você, mas olha pra mim. Você não está sozinho, tenta ser mais forte que isso, tenta, por favor!

POV AMANDA - 2018

Nunca havia presenciado uma crise de ansiedade, era mais sério do que eu pensava, Arthur estava imóvel sobe o chão do banheiro trêmulo, suado, repetindo palavras sem sentido. Ele chorava muito, não sabia como agir diante disso, manter o controle pela pessoa em crise é essencial, a última coisa que ela precisa é de alguém desesperado.

- Lembra de quando nós fomos ao parque aquático? - Comecei no intuito de distraí-lo. - Você havia dito que morria de medo de descer naquele tobogã de novo, pois da outra vez tinha se afogado. - Ele me olhava com os olhinhos vermelhos e marejados. - Eu disse que dessa vez você não ia se afogar, porque eu estaria lá contigo, lembra do que eu fiz? - Perguntei e ele assentiu. - Segurei sua mão e falei que enquanto você estivesse comigo, eu não deixaria você se afogar. - Peguei a mão direta do Arthur e entrelacei na minha com firmeza. - Eu estou aqui, estou segurando a sua mão, e adivinha? Não vou deixar você afundar, Arthur. Você não vai afundar comigo aqui, não vou permitir, está me ouvindo?
- Me abraça. - A voz do Arthur estava fraca, quase um sussurro.

Não pensei duas vezes antes de deitar no chão ao lado dele e pôr a sua cabeça no meu colo fazendo um carinho suave no seu cabelo, Arthur estava com soluço pós choro, era de cortar o coração ver ele daquela maneira, a ansiedade é uma merda, não desejo isso pra ninguém.

Notas finais: oi, gente... talvez eu tenha saído um pouco do foco da fic, queria falar mais sobre o "lance" do Arthur e da Ágata, mas recentemente eu tive a minha primeira crise de ansiedade (nem sabia que tinha), e foi tão assustador que resolvi trazer isso aqui pra vocês, e pedir por favor, pra vocês sempre buscarem por ajuda, não é incômodo algum ajudar alguém que esteja precisando, liga pra aquele amigo que sabe te acalmar, que te entende, que as vezes passa pelo mesmo problema que você, só não fica sozinhx nessas horas achando que vai incomodar, é perigoso demais, ansiedade não é brincadeira. se cuidem.

Tonight, we are youngOnde histórias criam vida. Descubra agora