Mais um dia...

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Uma luz do sol me despertou. Os pássaros já cantavam e a luz matinal invadia o meu quarto. Me sentei na cama, o cheiro maravilhoso do café da manhã se espalhava pela casa. Me espregucei e segui para o meu banheiro. Os meus cabelos eram um emaranhado de roxo, magenta e laranja atrás de minha cabeça. Lavei meu rosto, na esperança de acordar um pouco mais, e lavantei meu rosto, me olhando no espelho. Aquele olho verde esmeralda e aquele outro azul turquesa. O que eu tinha era raro, mas não ajudava muito quanto às pessoas gostarem de mim. Decidi por fim tomar um banho, longo e demorado. Minha rotina de sempre começou... Pentei o cabelo, coloquei o uniforme da escola, fiz dois coques e deci para a cozinha. Como sempre, minha mãe já tinha ido para o trabalho e só deixou o meu café da manhã e um bilhete: "Coma rápido, pois Emily vai chegar em breve. Com amor, mamãe". Emily, minha melhor amiga desde os 3 anos de idade, a única que sempre me apoiou contra os valentões. Um sorriso se abriu ao me lembrar de nossas memórias e me sentei para comer. Era básico, mas o suficiente; um copo de suco e uma torrada com ovos. Comi rápido e peguei minha mochila, pronta para ir para o inferno que eu chamava de escola. Sai e tranquei a porta, apenas para encontrar Emily prestes a bater na mesma.

- Bom dia!- disse Mily me dando um sorriso

- Bom dia- eu disse guardando a chave de casa

Como sempre, fomos andando para a escola enquanto conversávamos sobre diferentes assuntos. Pessoas davam 'bom dia' caloroso e amigável para Emily, enquanto apenas me encaravam com desprezo. Eu já estava acostumada, não sei por que ainda doia. Emily me deu um tapinha no ombro ao ver a tristeza cobrir meu olhar. O ato me fez sorrir, não um sorriso alegre e animado, mas um sorriso triste enquanto Mily continuava a falar sobre garotos. Minha melhor amiga teve que me avisar quando chegamos na escola.

- Eu esqueci de te falar! Feliz aniversário!- eu olha para ela com duvida quando ela joga os cabelos cor de mel sobre os ombros- Hoje faz 14 anos que somos amigas! E por isso eu vou dar uma festa.

- Uma festa?!- eu pergunto, já que minha amiga sabia muito bem que eu não gostava de festas... ou pessoas

- Sim! Pra nós, pela nossa amizade! Vai ser hoje as dez horas, e você tem vestir algo de gala, chique!- eu ri por impulso ao me imaginar em um vestido de gala, mas assim mesmo concordo.

Os corredores estavam relativamente vazios quando nós entramos. Eu ainda não tinha percebido que faltavam apenas cinco minutos para nossa aula começar. Mas também não tive muito tempo para pensar quando vi as minhas três carcereiras embaixo do relógio. Clare, a cabeça do trio; Rachel, seu braço direito; Marie, a fofoqueira. Eu mantive minha cabeça baixa, rezando para que hoje, só hoje, elas me deixassem passar. Emily não havia notado a presença do trio, mesmo quando elas se aproximaram e me impediram de passar.

- Olha só meninas, a diversão do nosso dia chegou!- disse Clare enquanto as outras duas seguravam os meus braços- E aí Morceguinho? O que você vai faer hoje? Chorar?- as duas segurando o meu braço riram

- Me deixa ir, por favor! A aula já vai começar e eu não quero chegar atrasada- eu implorei

- Mas qual é a graça de te deixar ir?- as duas do meu lado apertaram meu braço, enfiando a unha na minha carne. Um som abafado de dor saiu dos meus lábios, minha visão estava começando a embaçar com lágrimas, mas eu as engoli.

- Vamos lá, Morceguinho!- disse Rachel enfincando mais ainda as unhas na minha carne, até que um liquido carmim, quente saiu do meu braço- Cade o senso de humor?

Antes que eu pudesse pedir denovo, Marie me deu um soco nas costelas, me fazendo gemer de dor e cair no chão, sem ar.

- Ela te fez uma pergunta, Morceguinho- Marie disse ao chutar a minha perna.

- Vai pro inferno!- eu disse entre os dentes, apenas para que Clare desse um tapa na minha cara, o som capaz de quebrar meus dentes

- Quem te deu essa educação? Seu pai?- disse Clare rindo- Ah é! Você não tem pai, por que nem mesmo ele aguentou ter uma criança que nem você- as tres riram enquanto suas lágrimas desbotaram de seus olhos.

- Até mais, Morceguinho!- disseram as tres enquanto caminhavam para longe de mim. 

Eu lutei quando as lágrimas alcançaram as minhas bochechas, mas elas continuaram caindo. Eu levantei, com meu braço ainda sangrando e a perna com certeza roxa. O sinal para a aula já tinha tocado, mas mesmo assim fui pro banheiro. Limpei a pquena ferida assim como minhas lágrimas. Você não pode se dar o luxo de apenas chorar! respirei me encarando no espelho, ofegante. Corrigi a minha postura e me dirigi para a classe. O professor não tinha começado a aula ainda, então fui até o meu lugar, do lado de Emily, e me sentei.

- Por que você ta atrasada?- ela perguntou pegando o pequeno caderno de anotações.

- O trio me parou- eu digo com a voz falhando

- Você ta bem?- perguntou Emily procurando por machucados, enquanto eu escondi o braço machucado

- Sim!- eu disse quase rápido demais- Foi o de sempre...

A cara de minha melhor amiga se fechou antes de prestar atenção na aula. Eu nunca fui uma pessoa que nem ela, de prestar atenção na aula e fazer perguntas e tirar notas dez. Ao invés disso, eu sou a garota que olha pro outro lado da janela, onde o outono tomava conta da paisagem. A floresta perto da escola se tingia em tons de laranja, vermelho e marrom enquanto esquilos e pássaros se moviam entre o vento. Aquela floresta era de fato especial, sombria, onde a maioria de minhas horas eram passadas. Floresta Negra, era como chamavam. Lugar onde várias bruxas realizavam seus ritos e onde várias criaturas se alimentavam. Era belissíma a luz do dia, mas nínguem era corajoso suficiente para se adentrar nela durante a noite. Mesmo de dia nínguem era tolo o suficiente para ir tão adentro da floresta. Ninguem além de mim. A floresta parecia me chamar quando a tarde caia, mas nunca fui para dentro de noite. Mas agora, olhando pela janela durante aquela aula, a floresta cantava meu nome com toda sua força e magia. Ela me pedia para ir lá. Ela me chamava. O canto era tão doce que fui tirada dele apenas por um cutucão de Mily:

- A aula acabou!- ela disse apontando para o relógio. Hora do almoço pensei.

- Quer almoçar junto?- eu perguntei para minha amiga

- Ah! Bom... eu tenho algumas coisas para fazer então não vai dar!- ela disse estranha antes de sair correndo da sala. Okay... eu pensei pegando o meu almoço e saindo da sala.

Andando pelos corredores eu percebi que estava encurralada. Normalmente eu almoçava na cafeteria com Emily, mas almoçar sozinha não seria uma boa opção. Todos me encaram não importa aonde vou. Não estava com vontade de lutar contra isso. Então o jardim estava fora de cogitação também. Sobraram a biblioteca e o banheiro. Os dois são lugares bons e ruins. A biblioteca tem paz, mas pessoas e no banheiro tem paz, mas sujeira. Parece que só me resta um lugar eu pensei me dirigindo a canção, ainda constante, da floresta. As folhas secas estalavam sob os meus pés enquanto caminhava tranquilamente para um galho grande e forte de uma árvore baixa. O cheiro do outono me acariciava com o vento quando escalei a pequena árvore de casca marrom clara. Paz eu suspirei abrindo o meu pequeno pacote de lanche. A brisa era tão suave, nem fria nem quente, batendo contra as folhas ao seu redor. Pequenos animais corriam e rastejavam pelas folhas atraiam a atenção de meus ouvidos de um pequeno riacho por perto. Aquilo era calma, paz. Era magia, não cruel ou brutal, mas calma que irradiava da árvore de outono. Os pequenos animais também a sentiam, por isso ficavam por lá, pela paz. O tempo passou, meu lanche acabou e o sol  do meio dia agora estava mais suave. Desci daquele grande tronco e me dirigi para o barulho de alunos conversando, a floresta ainda me cantando a canção para ficar. A paz, na floresta com sua magia e cantiga, e o caos, na escola com seus alunos barulhentos e mal educados. Mas ainda assim eu andei em frente, em direção ao caos. Me dirigi para a classe, passando pelos corredore o mais rápido possível. Me sentei na minha carteira e coloquei meus fones. Continuei olhando para a floresta, escutando sua cantiga mesmo sob a música que eu coloquei. Não percebi que tinha dormido até Emily me acordar para a aula, que foi exatamete igual as outras. 

Finalmente as aulas tinham acabado e fui para casa. Minha mãe ainda não tinha chegado e eu tinha muito tempo até a festa. Troquei de um uniforme para um moletom e shorts e fui para a varanda, suspirando.

- Mais quatro horas- reclamei baixinho- Quatro horas e vou ter que ir a festa. Droga Mily!


Um amigo lá de baixo...Onde histórias criam vida. Descubra agora