Um pouco de história

1.5K 191 48
                                    

- Eu... Eu devo me curvar ou... - eu perguntei, genuinamente preocupada.

As sombras riram de mim de uma forma debochada, mas carinhosa. Na minha frente, em uma parede de mais de dois metros de altura, seis mulheres foram esculpidas.

A mais alta dela, magra e com cabelos longos, me olhava com seriedade; do seu lado direito uma outra mulher alta, mas cheia de curvas e olhos sedutores, me olhava com ternura; à esquerda da primeira mulher, havia uma de altura média e cabelos curtos, um pouco gordinha e rindo do meu comentário.

Mas foram as três menores que me chamaram a atenção. Três crianças completamente idênticas, sem nenhuma expressão no rosto. Elas apenas me encaravam, com uma certa curiosidade até.

Ignorando completamente a minha pergunta, provavelmente ridícula, Tenebris se aproximou de mim. Todos os pelos do meu corpo de arrepiaram, mas eu consegui me segurar para não tremer. Não de medo, mas de pura magia que as sombras derramavam como se fosse naniquim.

- As minhas criadoras, assim como eu, tiveram muito trabalho para chegar até aqui... - ele disse - Não temos o luxo de esperar até que você voltasse para o Inferno. Elas precisam falar com você... Karma.

Meu nome saiu da boca de Tenebris de uma forma estranha. Não era como se fosse veneno, como muitas vezes eu já havia escutado, mas sim como se fosse incorreto. Como se ele não devesse me chamar pelo meu nome...

- Criança, nós não temos muito tempo! - disse a irmã mais alta, da qual acreditei ser a mais velha.

Sua voz derramava poder e idade, como se ela fosse a soberana daquela floresta. Mas pensando bem... a realidade não devoa estar muito longe disso.

- Antes de mais nada, nós te devemos uma explicação... - disse a mais bela, sua voz parecia veludo - Nós somos Titânides, irmãs de sangue e donas da Verdade e Justiça.

- Nós somos tão antigas quanto o submundo! - disse a baixinha.

- E mais poderosas que Lúcifer - completou a mais velha - Nós somos filhas de Cronos, abençoadas com beleza e graça...

- Mas amaldiçoadas com frieza e inteligência - as trigêmeas, que até agora se mantinham caladas começaram a falar, em um uníssono perturbador. Eu desejei que elas não tivessem falado.

- Nós somos responsáveis por responder as perguntas daqueles que são dignos, desde a Idade de Ouro! - disse a baixinha.

Idade de Ouro... eu lembro que Salem me ensinou isso em algum momento. As três Idades do Inferno: a Idade de Ouro, quando o Inferno foi feito; a Idade de Prata, durante a guerra entre o céu e o Inferno; e a Idade de Bronze, quando bruxas eram comuns na Terra.

- Mas, se vocês são tão poderosas... por que vocês criaram Tenebris? - era uma dúvida genuína minha.

Mas parece que eu as irritei de alguma forma. As trigêmeas, pela primeira vez, demonstraram um pouco de tristeza. A baixinha e a sedutora pareciam desconfortáveis, mas a mais velha continuou impassível.

- A muito tempo atrás, nosso pai nos castigou... - a mais velha revelou - Nós o irritamos quando rejeitávamos qualquer criatura que nos pedia respostas. Como castigo, nosso pai nos prendeu a essa parede e declarou que, apenas quando uma criatura digna se apresentasse para nós, nunca iriamos nos mecher novamente.

- Ainda eramos muito jovens e rebeldes nessa época - continuou a mais bela - Nós não aceitamos o castigo e tentamos de tudo para quebrar essa maldição.

- Durante os nossos primeiros anos adormecidas, nós criamos Tenebris - a baixinha disse - Ele foi feito de sombras e mentiras, com a magia que acumulamos enquanto estavamos a dormir. Ele é o monstro esculpido a partir de nossas amarguras...

- Eu controlo as Mentiras e Curiosidades - Tenebris adicionou - Uma pequena porção do poder de minhas criadoras!

Ele parecia muito orgulhoso de si mesmo. Algumas das Titânides, a baixinha e a bela, pareciam orgulhosas também! Mas a mais velha parecia... desapontada.

- Mas ele falhou conosco! - disse a mais velha, com um tom estóico - Demos a ele muitas responsábilidades, sendo que ele mal havia sido criado. Assim sendo, ele respondia todas as perguntas por nós, ao invés de achar pessoas dignas de nossas verdades.

Alguma coisa na energia de Tenebris pareceu triste e envergonhada. Sim, ele não parece a pessoa mais controlada quando encontra algo que gosta, mas ele era basiamente uma criança quando elas o criaram.

- Mas então... por que você estava no Jardim? - eu perguntei, curiosa.

- Como suas criadoras, era nossa responsabilidade lidar com ele - a mais velha disse - Ele causava grande caos no submundo nessa época, e nós tinhamos que dete-lo. Portanto, assim como nosso pai nos prendeu à Parede das Verdades, nós o prendemos ao Jardim dos Sussurros. Assim, ele viveria para sempre com a campania de sombras e plantas, aprendendo a se controlar!

Não pude deixar de sentir pena por Tenebris. Ele era apenas uma criança, curiosa e animada para fazer os pais orgulhosos. Sei bem como é isso...

Mas parece que a história delas não acabava aí. A mais bela se mecheu na parede, desconfortável com o ambiente, antes de pigarrear pedindo por uma chance de falar.

- Alguns anos mais tarde, nós encontramos quatro pessoas dignas de nossas respostas - ela disse - Quatro Rainhas do submundo que, após sua mortes, foram transformadas em estátuas por nós. Elas são conhecida como as Rainhas das Perguntas, e reinam as Dúvidas e Charadas. Assim como Tenebris, Victória e Elizabeth são rainhas negras que preferem as charadas. Mas Mary e Catarina, as rainhas brancas, preferem as pergunats.

Milhões de perguntas corriam pela minha cabeça. Em menos de dez minutos, eu havia aprendido uma história bem interessante sobre o submundo.

Mas nada disso havia sido mencionado por Salem. Será que ele não sabia? Ou será que ele sabia que uma hora ou outra eu iria aprender?

Mais importante, por que criaturas tão antigas e poderosas estavam nessa parte esquecida da Floresta? O que elas queriam comigo?

- Mas onde estão os nossos modos? - disse a baixinha - Nós nem nos apresentamos!

Os sol já estava se pondo e as árvores daquela parte da floresta eram densas. Mas mesmo assim, um brilho dourado iluminava a Parede de Verdades.

Me virei para Tenebris, mas a escuridão já havia desaparecido entre as plantas do jardim. Agora era oficialmente só eu e as Titânides...

- Meu nome é Reia e eu sou a mais velha! - disse a do meio.

- Eu sou Mnemosine, a segunda da linhagem - disse a mais bela.

- Me chamo Febe e sou a terceira da linhagem - disse a baixinha.

- Nós somos as trigêmeas e as quartas da linhagem - disseram as menores juntas.

- Tétis - disse a da direita.

- Témis - a do meio.

- Téia - a da esquerda terminou.

Um calafrio correu pela minha espinha. Só naquele momento que fui capaz de perceber onde eu estava e diante de quem eu estava.

- E-Eu sou Kar- eu fui cortada por Mnemosine.

- Karma Elliot-Harper, a Amina Una! - ela disse com alegria.

- Amina... oque!? - eu perguntei, sem saber do que ela estava falando.

- É por isso que te chamamos até aqui hoje, criança - disse Reia - Você é digna de nos fazer uma pergunta!

Fiquei em silêncio, absorvendo palavra por palavra das Titânides. Não ousei respirar um pouco mais forte antes de tentar entender o que estava acontecendo.

Perguntas e palavras e acontecimentos faziam uma tempestade na minha cabeça.

Mas tudo foi calado quando a pergunta principal, a que mais me sufocava, iluminou-se na minha mente.

- Quem sou eu? - eu murmurei, tão perdida quanto a neve que começava a cair suavemente.

Reia abriu um sorriso, contente com a minha pergunta.

Quem... O que sou eu?

Um amigo lá de baixo...Onde histórias criam vida. Descubra agora