Resolução

t r i n t a e o i t o

malvie

É extremamente dolorido enterrar um ente querido, e é inexplicável o vazio que você sente após todos no cemitério se dispersarem, e você ter que voltar pra casa, sabendo que aquela pessoa já não vai estar mais lá.

Mas pelo menos eu pude chegar a tempo, pousamos em North Harrow pela madrugada, quando enfim cheguei na capela do cemitério onde papai era velado, faltavam poucas horas para o enterro.

Então, eu abracei minha mãe por incontáveis minutos, e eu deixei que ela chorasse, por mais ferida que eu estivesse, eu precisava ser forte por ela. Eu conhecia dona Stephenie, sabia o quão sensível mamãe era, e que perder meu pai, o sargento das forças armadas americanas que deixou tudo por ela, seu grande amor seria um baque terrível, mais ainda sim eles tiveram uma linda história juntos.

Quando tudo acabou, quando a gaveta do jazigo se fechou, nos restou apenas deixar que o papai descansasse, era isso que disseram para nós como alento... No momento que Caius estacionou o carro na frente de casa, nós ficamos ali por bons minutos, ninguém fez menção sequer de sair de onde estávamos, Peter por mais pequeno que fosse parecia ter absorvido tudo e estava muito quietinho, amuado, remexendo a perninha boa ansiosamente, e meus olhos ficaram por minutos preso naquele vai e vem... Apática demais para sequer conseguir pensar.

Fomos um a um para dentro, mas sinceramente, essa já não parecia mais a mesma casa, e quando entramos nós quatro em um silêncio cortante, vimos com pesar que tudo continuava no mesmo lugar, mas havia um buraco enorme dentro de nós.

Os outros chegaram bem atrás de nós, aparentemente nos dando um espaço... Ao invés de ficar ali para recebe-los, eu apenas subi para meu antigo quarto, para tomar um banho, e nesse momento, só meu, me dei o direito de chorar novamente e descarregar o que estava preso.

Quando sai, apenas vesti uma roupa qualquer pensando em descer e ficar com os outros, sabendo que só estariam ali, minha família e os amigos mais próximos.

Kyle e Jay se despediram no cemitério e foram para casa dos pais do Kyle que também vivem aqui em Harrow, mas viriam aqui mais tarde. Tia Veronica e Josh, meu primo, moravam em Wembley disseram que voltariam pra casa pela tarde. Até onde sei, Jimmy e Summer ficariam aqui em casa.

Quando saí do meu quarto, passei então pelo "quarto de hospedes" que tinha a porta entreaberta, na verdade ele havia se tornado o quarto onde meu pai colocou todas as suas coisas, inclusive sua coleção de rifles e moedas, games, mesa de bilhar e uma enorme TV para ele assistir os jogos de baseball.

Era o cantinho dele.

Abri uma fresta da porta, e vi minha mãe com Peter em seu colo, sentada na poltrona de couro do papai. Ela tinha um álbum de fotografias antigo, e mostrava a ele algumas fotos. Sua voz estava embargada, ela parava por vezes pra limpar as lágrimas ao falar de como o papai parecia uma criança, enquanto contava pra Peter como foi nossa viagem pra EuroDisney na França, ele estava cheio de perguntas.... Eu era muito pequena nessa época, mal me lembro dessa viagem.

— Atrapalho? — Perguntei passando pela porta.

— Claro que não. — Respondeu, em uma fungada.

Adentrei, indo até eles.

— Eu amo essa foto... — Comentei, quando ela virou a foto no álbum. Ela sorriu triste.

Estavamos fantasiados pro Halloween, eu deveria ter meus seis anos de idade, papai era Sherlock obviamente, ele era um grande fã de Sir Arthur Conan Doyle. Caius era Mycroft, eu Enola Holmes e a mamãe o Watson.

— Tia Malvie, você e o papai pequenininhos. — Peter apontou com seu dedinho.

— Sim, eu tinha quase a sua idade. — Falei. — Eu amo essas fotos, são lindas.