CAP 06 - O bolo de aniversário da Bela Adormecida, mas com pernas

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Eu nunca me interessei muito por história, prefiro matemática porque parece algum tipo de mágica, então passei boa parte da aula fazendo desenhos aleatórios no caderno. Eu saí pulando de sala em sala feito um grilo confuso, bêbado e hiperativo ao fim de todas as aulas e, munida do conselho de Raven, disse que não queria me apresentar nas matérias. Eu não iria passar por aquilo de novo, sabe? Tem certas coisas que não valem a pena e é melhor deixar pra lá. Essa era uma dessas coisas. Eu conheceria quem importasse ao longo do ano ou não conheceria ninguém e estava bem com qualquer possibilidade.

As aulas seguintes passaram mais devagar do que a viagem pra cá. O tempo nessa cidade parecia quase andar pra trás, eu até sentia que estava perdendo as habilidades de fala e de movimento e me tornando um bebê. Só podia ser isso, eu era nova demais pra ter um derrame causado por tédio.

Depois da aula de história, tive minha primeira aula de Astronomia. A professora já estava na sala, sentada no tampo da mesa de madeira nos esperando. Era uma mulher negra com cabelos pretos crespos bem volumosos e óculos sem aro, não sabia dizer se eram pra perto ou pra longe. Ela usava um batom vermelho escuro e tinha um corpo parecido com o da minha mãe. O nome dela era Josephine E. ("E" de que?) Brown e eu gostei dela de cara, mesmo sem saber o significado do "E" no nome dela.

Sra. Brown perguntou como haviam sido nossos verões, fez uma retomada de alguns conteúdos importantes de Física e Matemática pra introduzir à Astronomia e depois passou uma atividade em dupla que eu me esqueci de perguntar se poderia ser individual.

Depois da primeira aula de astronomia (porque ela havia sido dividida em uma aula pela manhã e uma à tarde, um roteiro que eu entendi aproximadamente -15%, sim, no negativo), fui ao vestiário colocar meu uniforme esportivo. Acontece que todo mundo foi fazer a mesma coisa. E o resultado foi um vestiário feminino lotado com cerca de 15 meninas.

Eu resolvi ficar sentada nos banquinhos marrons de madeira que havia na frente do pequeno bloco dos vestiários até que tivesse menos gente. Passou a tal da Eileen, que era gorda e muito branca com um cabelo castanho ondulado de um tom muito bonito preso em um rabo de cavalo bem alto, junto de um grupo de cerca de 3 meninas.

Pelo visto, ela havia se enturmado bem rápido, como imagino que, agora, Jess esteja se enturmando. Um pouco atrás, veio um grupo relativamente grande, com umas 6 meninas. No meio delas, vi Jamie andando altiva, olhando pros lados de forma meio distraída e sem participar das conversas que rolavam no grupo, sem chamar muito a atenção de ninguém que não fosse a minha.

Elas estavam descendo a pequena colina gramada que suportava todo o complexo de educação física. As incontáveis tranças de Jamie balançavam de um lado para o outro, se batiam e caíam em seu peito enquanto ela tentava descer sem pisar errado e sair bolando na grama, o que era difícil de se fazer quando o sol estava forte e ela precisava praticamente fechar os olhos pra enxergar direito.

Eu mesma deveria estar com uma cara estúpida por causa dos olhos espremidos, sentada com a coluna curvada e um cotovelo apoiado sobre um joelho erguido, o pé sobre o banco que eu tenho certeza que não deveria ser permitido.

Assim que ela passou pela área de sombra, seus olhos delgados se abriram um pouco e eu pude enxergar novamente o sabor de mel neles quando ela deu um sorriso tímido no conceito "e aí, novata" e entrou no vestiário.

Ou eu sou estúpida por ter achado que o sorriso era pra mim? É claro que não era pra mim, ninguém sorriria pra mim assim, de graça, principalmente uma garota que nem Jamie.

Logo atrás de Jamie, Raven chegou andando, quase correndo, e reclamando sobre alguma coisa enquanto puxava a mão de uma garota de olhos puxados, que parecia de ascendência do leste asiático, talvez tenha sido a que jogou o papelzinho pra ela mais cedo. Ela tinha cabelos compridos lisos e pretos, nariz bem gordinho e redondo, era magra e olhava pra cima de um jeito impaciente enquanto tentava se soltar dos puxões de Raven, respondendo às suas reclamações. Só quando elas chegaram mais perto foi que eu pude escutar sobre o que elas tanto reclamavam.

A Vida Absolutamente Ordinária de Amanda Pritchett ⚢Onde histórias criam vida. Descubra agora