Capítulo 18

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                           Diogo e Júlia

A sensação de Júlia ao ver Diogo na sua frente, fê-la sentir uma raiva tão intensa que ela queria estrangulá-lo ali mesmo, na frente de todos, sem se importar que fosse vista. Todos os limites haviam sido passados desde que se encontraram pela primeira vez, acontecendo uma sucessão de catástrofes que não paravam. Era a gota d'água para uma moça que estava imersa numa avalanche de sofrimento e confusão.
         
Diogo estava surpreso ao encontrá-la ali no saguão do prédio da Editora Cores, nunca imaginara que voltaria a rever a garota que fora a mais difícil de conquistar do que qualquer coisa. Era um amor para conquistar, um trabalho árduo e duro, pois não entendia que uma mulher ia além do sexo. Se ele deixasse seus sentimentos mais idiotas de lado, conseguiria enxergar uma moça magnífica. Ele aproximou-se lentamente, a muleta não ajudava muito a caminhar, por isso, tinha que ir aos poucos.
         
Eles ficaram frente a frente, Júlia com uma raiva que fervia dentro de si enquanto Diogo tentava entender a manobra do destino de estarem juntos. Sem explicar, o coração dele começou a palpitar profusamente, achando estranho, de novo, uma alegria e uma felicidade por ter a oportunidade de olhá-la, nem que fosse por um instante.
         
- O que está fazendo aqui? – Júlia perguntou ríspida.
         
- Calma, moça – Diogo respondeu com um sorrisinho. – Eu que deveria perguntar.
         
- Aposto que sabe da palhaçada conosco.
         
- Sei, sim. Por isso, estou aqui para falar com o editor-chefe.
         
- Eu também tive a mesma ideia. Mas vai perder o seu tempo, a recepcionista não me deixou subir. Falou que eu precisava ter hora marcada.
         
- É porque ela não conhece o Diogo Guimarães – disse sorrindo de modo matreiro.
         
- O que você pretende aprontar? – ela perguntou entendendo que havia algum plano à vista.
         
- Olhe e aproveite.
         
Diogo começou a desabotoar o terceiro botão da camisa, porque os outros dois de cima já estavam desabotoados, deixando um pouco à mostra o peito bem definido, levantou as duas golas pra cima, dando um ar de garanhão e cafajeste. Júlia não acreditou no que ele acabara de fazer, literalmente, iria seduzir a moça.
         
A mulher da recepção teve a sua atenção atraída para o belo homem que estava à sua frente, com um sorriso descontraído e carismático nos lábios, além da leve a mostra do peito dele que fisgou a atenção dela, fazendo-a colocar uma mecha de cabelo para trás da orelha que estava na testa, por ver tanta beleza num cara só.
         
- Em que posso ajudá-lo? – a recepcionista perguntou queimando por dentro.
         
- Eu gostaria de falar com o editor-chefe da revista “Conte Mais" – Diogo disse numa voz macia e sedutora.
         
Por mais que Júlia estivesse chocada ao ver aquela grotesca cena entre os dois e irritada, uma risada escapou de seus lábios, era engraçado ver a reação da mulher que quase estava subindo em cima do balcão para agarrá-lo e inebriada pelo charme dele, achando-se culpada, logo em seguida, em concordar com isso.
         
- Você tem hora marcada? – a recepcionista falava quase perdendo o ar.
         
- Não, não tenho. Mas, você deve saber quem eu sou, sabe? – ele perguntou mais não a deixou responder. – Diogo Guimarães, o cara que saiu na capa da revista por traição. Um homem rico, famoso e cheio da grana. Quero dar uma entrevista exclusiva.
         
Diogo se aproximou mais perto ainda da mulher, fazendo a moça conseguir dar uma olha no tórax e, para destruir de uma vez, ele sussurrou no ouvido dela de modo sensual:
         
- Por favor, ligar para o responsável da revista.
         
- Claro! – falou que nem uma gazela assanhada.
         
Rapidamente pegou o telefone e fez uma ligação.
         
- Ele disse que vocês podem subir, fica no vigésimo primeiro andar – ela disse um pouco mais assanhada nos gestos.
         
- Obrigado. – O sorriso do modelo ficou mais sedutor ainda.
         
Diogo voltou-se para a Júlia, abotoando a camisa e ajeitando a gola.
         
- Vamos? – perguntou a ela.
         
- Sinceramente, estou abismada com o que você fez. Isso ofende todas as mulheres.
         
- Deveria agradecer ao invés de reclamar. Se não fosse por mim, a senhorita não subiria nem o primeiro andar.
         
- Vamos então – Júlia concordou irritada.
         
Eles pegaram o elevador subindo ao andar respectivo.
         
Diogo e Júlia foram engolidos pelo barulho agitado da redação, de pessoas passando de lá para cá, conversando entre si e o som dos teclados dos computadores que criava uma sinfonia de cliques.
         
Uma jornalista apareceu na frente deles.
         
- Olá, boa tarde. Sou Cassandra Mendes. Você veio dar uma entrevista em relação a foto de traição na capa de revista? E a garota também te acompanha?
         
- Sim – Diogo falou. – Gostaríamos de falar com o editor-chefe.
         
- Não se preocupe com isso. Farei a entrevista.
         
- Nós, primeiro, desejamos falar com ele. Pois estamos um pouco inseguros.
         
- Mas isso não terá...
         
- Por favor, Cassandra – Júlia interveio -, já está sendo difícil vimos aqui tomar esta atitude.
         
Ela suspirou.
         
- Tudo bem. Venham comigo.
         
A jornalista levou os dois para onde eles queriam ir. Ela bateu na porta, ouvindo um “entre”, fazendo um gesto com as mãos para que o casal entrasse junto.
         
Emanuel estava atolado de papéis sobre a mesa, olhando para o modelo e a moça que apareceram de repente em seu escritório.
         
- Cassandra, eu não disse para entrevistá-los? – perguntou irritado.
         
- Sim. Mas os dois se sentiram desconfortáveis, e desejam fazer isso na sua presença.
         
- Ah, é? – Ele ficou surpreso.
         
- Sim.
         
- Diogo Guimarães, o modelo mais famoso e caro do mundo na minha presença, acompanhada de uma desconhecida que ganhou os holofotes graças a um beijo. Interessante.
         
- Podemos começar a entrevista? – Cassandra perguntou a todos.
         
- Espere um momento – Diogo respondeu.
         
A jornalista suspirou de raiva mediante a tanta demora.
         
- Olha, Diogo. Meu tempo é curto. Ainda tenho outras matérias para fazer.
         
- Não vai demorar nem vinte minutos. Porque eu e a moça aqui queremos saber de uma coisa do editor-chefe.
         
- Uma coisa minha? – Emanuel perguntou com um pouco de sarcasmo.
         
- Sim. Vai ser muito simples. Quem tirou a foto para pôr na revista?
         
O editor-chefe riu.
         
- Vocês dois estão de brincadeira comigo, né?
         
- Infelizmente, não.
         
- Para a sua informação, eu não posso dizer quem foi, pois é sigiloso, a pessoa tem direito. E outra coisa, não tivessem se beijado que isso não teria acontecido.
         
- Mesmo que o cara que me beijou não pediu permissão? – Júlia perguntou com frieza.
         
- Não me diga que foi contra a sua vontade? – perguntou interessado.
         
- Júlia. Cale a boca. Eles são jornalistas – Diogo a repreendeu.
         
- Gostaria de falar sobre isso? – Cassandra perguntou com olhar afiado de expectativa.
         
- Não – ela disse.
         
- Que pena – Emanuel falou suspirando. – Eu não posso fazer nada, mesmo sendo um beijo mútuo ou não.
         
- Você é um jornalista, pode consertar o erro!  - A paciência dela estava começando a se esgotar.
         
- Sinto muito. O importante é a notícia. E essa que você acabou de dar, vai estar arquivada com muito carinho.
         
- Filho...
         
- Vamos Júlia – Diogo a cortou antes que ela soltasse um palavrão -, não temos mais nada o que fazer aqui.
         
- Você tem razão. Mas preciso fazer uma coisa.
         
Havia um copo descartável de café da Starbucks sobre a mesa, com a tampa aberta e mostrando o recipiente preenchido do líquido até a metade que aguçou o interesse dela. Júlia, rapidamente, pegou o copo e jogou todo o líquido no editor-chefe.
         
- Sua desgraçada! – ele berrou de fúria e levantando-se. – Eu vou te espancar garota!
         
Aquela frase paralisou-a de imediato, lembrando-se do pai que sempre dizia a mãe dela que iria agredi-la. Diogo percebeu a reação de Júlia, ficando espantado.
         
- Ninguém vai agredir ninguém! – ele disse numa fúria avassaladora, usando a ponta da muleta e pondo no peito do cara. – Se encostar um dedo em Júlia, eu te envio para inferno, direto no colo do diabo!
         
Júlia ficou admirada ao ouvir as palavras proferidas pelo Diogo. Nunca imaginou que ele pudesse ter uma reação dessas, fazendo-a se recompor. Sinceramente, estava impressionada com a valentia dele em protegê-la, sendo algo nobre. Mas, ao mesmo tempo, tinha a impressão que era uma miragem, pegadinha, sonho ou algo do tipo. De alguma forma, isso aqueceu o coração dela, sem perceber, de imediato.
         
Emanuel ficou receoso e cheio de medo diante da atitude do modelo. O tom de ameaça na voz fizera todos os pelos do corpo se arrepiarem de uma vez só. Ainda mais, a ponta da muleta que estava ameaçadoramente contra o seu peito.
         
Cassandra olhava toda a situação, sentindo calor de ver a fúria de um homem tão gostoso na sua frente, defendendo uma mulher. Achara uma atitude muito legal, de macho de verdade, de alguém que se importava com o sexo feminino.
         
Diogo, gentilmente, pegou no braço de Júlia, saindo do escritório.
         
Quando retornaram para o ruído agitado da redação, dirigiram-se rapidamente para o elevador ignorando o ambiente.
         
Ao chegarem, no térreo, deixaram o prédio da Editora Cores.
         
Na rua, as buzinas, o sonido dos veículos e passos na rua, fizeram os dois ficarem mais calmos e tranquilos. Eles se olharam por alguns instantes, sem saber o que fazer.
         
- Gostaria de passear comigo? – Diogo perguntou.
         
Ela pensou por alguns instantes.
         
- Gostaria.
         
Ele foi até o carro de Castro dizendo que poderia ir para casa, pois ia de Uber. O ator ao ver Júlia ao lado dele, espantou-se, não respondendo nada, deixando os dois.
         
Enquanto caminhavam pela calçada da Avenida Faria Lima, Júlia começou a chorar convulsamente. As tensões dos últimos dias havia se acumulado de uma maneira ferrenha. Um instinto protetor tomou conta de Diogo, preocupado com ela.
         
- O que foi, Júlia? Por que está chorando? – Sua voz era gentil.
         
Ela demorou alguns segundos para dizer, mas falou, mesmo assim, chorando.
         
- Estou sofrendo tanto, Diogo. Se não fosse aquela maldita foto eu não teria perdido o meu estágio.
         
- Sério? – ele perguntou chocado.
         
- Sim. Por incrível que pareça, eu estagiava na TecnoFuture, a empresa do seu pai. Eu nem sabia que você era o herdeiro daquilo tudo. Então meu chefe me mandou embora, achando que eu era uma vagabunda qualquer, de olho na sua fortuna.
         
- Não acredito! – ele exclamou.
         
Diogo estava sem palavras. Nunca poderia imaginar que a garota que estava ao seu lado, poderia estar próxima assim, mesmo estando longe. O pior que ele sentia-se culpado por ela perder o estágio.
         
- Verdade! – ela continuou. – Mas tem mais.
         
- Mais? – ficando perplexo.
         
Júlia balançou a cabeça positivamente.
         
- Quando voltei de Paranapiacaba, descobri que minha mãe foi parar no hospital. Ela está em coma.
         
- Sinto muito.
         
- Eu não deveria ter ido. Não com o meu pai à espreita. Ele a agrediu.
         
Ela contou tudo para Diogo. Desde que era uma menina, presenciando as atrocidades de um homem violento que batia na esposa sem dó, relatando, também, seus medos e suas incertezas, pois não queria perder a mãe.
         
Aquela história tocou no âmago dele, abrindo o casulo mais uma vez, saindo o mesmo garoto que tinha oito anos de idade e com medo da própria mãe. Uma empatia tomava conta, compreendendo que Júlia e ele, não eram tão diferentes assim. Ambos armazenavam traumas e feridas do passado. De um lado, uma mãe psicótica, perfeccionista e fria, casada com um pai que não se importava muito com a família, do outro, um homem que batia na própria mulher, machucando o coração da filha.
         
Diogo começou a chorar, as lágrimas jorravam em abundância sobre as suas bochechas. Júlia ficou sem reação ao vê-lo daquela maneira.
         
- Eu te entendo, Júlia. Sei quando alguém, principalmente a família machuca a gente de todas as formas possíveis. Uma dor aguda, pulsante e perfurante, deixando nossos corações em cacos.
         
Logo que ele terminou de falar, ele a abraçou. Júlia ficou perplexa, pois descobrira uma outra face que Diogo tinha. Particularmente, ela gostava mais desse, sem aquela arrogância e soberba, aceitando o abraço.
         
Eles ficaram assim, cerca de dez minutos, no meio da calçada, consolando-se um ao outro. As lágrimas continuavam numa cascata sem fim, retirando um pouco da dor que ficou presa neles durante anos.
          
Júlia começava a sentir algo que nunca passara pela sua alma, um sentimento desconhecido e novo, algo que não sabia compreender, porque era recente, mas pegava fogo como num incêndio de uma floresta.
         
Os dois se desabraçaram, encarando um ao outro por um instante. O amor despertava semelhante a uma explosão, aquecendo-os. Não havia mais nada pairando envolta deles, nem as preocupações. Apenas ele e ela que se olhavam de uma maneira tão apaixonada.
         
Diogo e Júlia beijaram-se. Os lábios encostaram um no outro, ansiosos para obter contato. Um beijo puro, sincero e sem amarras. Naquele momento, não existia mais o modelo famoso no Brasil e nos Estados Unidos, nem uma estagiária despedida, mas um casal.
         
Quando terminaram, ficaram olhando um para o outro, outra vez, processando o que havia acontecido. Várias sensações e sentimentos invadiam como um exército furioso para atacar, dominando cada parte dos seus corpos sem misericórdia.
         
Diogo sorriu e Júlia também.
         
- Eu te amo! – ele declarou.
         
- Eu, também, te amo!
         
Mais outro beijo ardente de arrancar o fôlego fora dado.
         
- Eu estou louca. Não é possível! – ela disse. – Estou beijando Diogo Guimarães.
         
- Não é só você.
         
- Isso não pode estar certo. Foi um momento de fragilidade.
         
- Não foi. Nós dois queríamos.
         
- Eu tanto lutei que estou em seus braços.
         
Nem Diogo acreditava que pudesse estar apaixonado por ela, entretanto, seus sentimentos não negavam. Amava essa moça com todas as suas forças.
         
- Sei que isso é tudo novo, Júlia, até para mim. Mas, meus sentimentos são sinceros – ele disse segurando gentilmente o rosto dela com as duas mãos.
         
- O meu também, Diogo.
         
- Quer namorar comigo?
         
- Sim.
         
Diogo deu um sorriso tão inocente que irradiava calor como o sol, fazendo Júlia rir também que brilhava como a luz da lua.
         
Os dois deram as mãos e voltaram a andar através da calçada da avenida.
         
A primeira coisa que fizeram como recém-namorados fora ir ao shopping, indo na praça da alimentação comer um lanche no Mcdonald’s, sugestão da Júlia, pois ela estava louca para apresentar o seu gosto preferido, a Coca-Cola. Diogo também adorava a bebida, fazendo-a ficar mais apaixonada ainda. Enquanto se alimentavam, conversavam um com outro, falando sobre si, do que curtiam ou não, somado a vários beijos que davam initerruptamente.
         
Depois, eles foram ao fliperama brincar um pouco, jogando e recebendo bilhetes para trocarem por prêmios. Diogo deu a ela um ursinho de pelúcia segurando um coração.
         
Para terminar aquele momento maravilhoso, assistiram um filme, romântico, lógico; um agarradinho no outro enquanto passava cada cena e o saco de pipoca entre eles, acompanhados de mais Coca-Cola.
         
Logo após, todas a essas atividades, Diogo resolveu levá-la para casa, deixando-a no portão e lascando o último beijo.
         
Júlia olhava da entrada da casa, seu amado que afastava-se para longe, dentro de uma Uber.
         
Quando aquele dia terminou, ambos deitaram em suas respectivas camas, ardendo de amor.

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