Capítulo 3: Metrô

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💔 Aviso: Este capítulo contém cenas de abuso sexual, se você não se sente confortável em ler sobre, peço que o pule ou leia com alguém de confiança.

Se você está passando ou conhece alguém que passa por isso disque 180 (Central de Atendimento à Mulher).

Você não está sozinha! ✊✊🏻✊🏼✊🏽✊🏾✊🏿

Say the Devil I said hey when you back from where you're from.
(Diga para o Diabo que eu mandei oi quando você voltar de onde veio)

Coloquei a mão na maçaneta e tirei. Eu não precisava fazer aquilo. Eu não seria punida. Eu estava no controle da minha vida. Não era obrigada a nada...

Mas eu queria! Queria muito!

Minha vida inteira sempre soube que tinha algo de diferente em mim. Onde todos viam apenas um pôr do sol, eu via milhares de histórias de amor acontecendo bem ali, debaixo daquele mesmo pôr do sol.

Todos sempre me falaram que eu era muito romântica e que ia acabar quebrando a cara por conta disso. Mas eu sempre enxerguei isso como uma qualidade. Um dom. Um poder!

E agora sei o porquê...

Esse era meu dom! Eu era uma cupido! Eu queria isso! Queria ser a responsável por semear amor dentro até dos corações mais sombrios. Queria ajudar as pessoas a serem melhores, todos são melhores versões de si mesmo quando estão apaixonados. Queria unir pessoas que estão destinadas a serem felizes juntas. Eu queria isso!

Suspirei. Peguei novamente a maçaneta e a girei, entrando dentro do lugar que por 16 anos foi minha casa e que a partir daquele dia, não passaria de uma memória distante.

Meus pais estavam cozinhando e assim que me viram abriram um sorriso espontâneo que partiu meu coração. Eu sentiria muita falta daqueles sorrisos!

- Mãe, pai, eu... Eu preciso contar uma coisa... - disse sentando em uma das cadeiras ao redor da mesa mordendo os lábios e apertando nervosamente as mãos.

Eles se sentaram também com a expressão preocupada.

- Eu fui aceita em uma faculdade. Vou ser professora! - disse olhando para o chão, eles me conheciam muito bem, veriam nos meus olhos que eu estava mentindo.

Eles ficaram um tempo absorvendo a informação até que minha mãe disse com um tom autoritário:
- Não, você não vai! Você vai terminar a escola e vai ser doutora!

- Eu não quero isso!

- Você não tem que querer nada, Ágata! Você tem 16 anos! Nós somos seus responsáveis! Quando você estiver com 18 anos, você decide sua vida, até lá, nós decidimos por você! Você não tem maturidade para decidir essas coisas! - disse meu pai em um tom de voz alto que eu nunca vira ele usar antes.

Levantei furiosa e subi para o meu quarto batendo a porta atrás de mim. Lágrimas de ódio e frustração tomando conta de meus olhos.

Quem eles pensam que são? Decidindo minha vida por mim? Serem meus pais não dá para eles o direito de serem meus donos!

Abri minha mochila e a esvaziei jogando todo o meu material escolar em cima da cama.

O que se coloca em uma mochila quando está se fugindo de casa?

Calcinhas, sutiãs, absorventes, desodorante, alguns livros, algumas maquiagens, camisetas, shorts, calças, vestidos, blusas, um pijama, tudo enfiado às pressas na mala.

Vai ter que ser suficiente.

Olhei para o violão, aquele que meu pai me dera, aquele que eu deveria passar para o meu filho. Suspirei e saí do quarto.

Desci as escadas com determinação. Meus pais estavam entre eu e a porta e assim que minha mãe me viu disse com a voz irada:
- Onde você pensa que vai, Ágata?

- Embora! - gritei empurrando eles para abrir espaço até a porta. Meu pai agarrou meu braço com força dizendo:

- Você não vai a lugar nenhum!

Apertando com cada vez mais força.

- Me larga!

Podia enxergar a fúria em seu olhar.

- Para! Você está me machucando!

De repente seu olhar se transformou, adquirindo uma feição arrependida, soltou meu braço e passou a mão no rosto com os olhos marejados. Minha mãe tentando conter as lágrimas disse:
- O que estamos fazendo?

Meus olhos se umedeceram e eu abri a porta, saindo de casa, eles não tentaram mais me impedir.

Sempre tive vergonha de chorar em público, não porque eu achava que aquilo demonstrava fraqueza, pelo contrário, eu achava até um ato de coragem não ter medo de expor seus sentimentos para os outros, mas porque os outros consideravam fraqueza, e u...

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Sempre tive vergonha de chorar em público, não porque eu achava que aquilo demonstrava fraqueza, pelo contrário, eu achava até um ato de coragem não ter medo de expor seus sentimentos para os outros, mas porque os outros consideravam fraqueza, e uma das coisas que eu mais odeio é que as pessoas me vejam como alguém fraco!

Mas era a primeira vez que eu brigava com meus pais, a gente já tinha se desentendido algumas vezes, mas nunca fora tão grave. Eu estava fugindo de casa! Tudo bem abrir uma exceção para minha regra dessa vez...

Assim, estava eu, desabando em lágrimas no metrô. Já era umas nove horas da noite então o metrô estava relativamente vazio, mesmo assim, eu estava de pé, muito inquieta para me sentar, mas estranhei quando um homem bem mais velho do que eu, de rosto arredondado e olhos esbugalhados se aproximou de mim.

Ele estava atrás de mim, mas pude ver pelo reflexo da janela do metrô que ele usava roupa social e seus olhos estavam direcionados para baixo, em direção a minha bunda!

Limpei minhas lágrimas e me afastei, mas ele veio atrás, colando em mim. Senti seu pau duro encostar em mim e paralisei.

Infelizmente, coisas como aquilo estavam se tornando cada vez mais comuns, já era parte da minha rotina escutar algum homem assoviar, ou buzinar de dentro do carro perguntando se eu queria carona para a casa dele, ou me chamar de "gostosa", "delícia" e mais um monte desses "elogios" que nós mulheres simplesmente repudiamos.

Mas mesmo cada vez mais frequente, eu nunca estava preparada, nunca conseguia reagir, sempre ficava assim, paralisada.

Senti ele esfregar o pau dele em mim e apertar minha bunda. Me senti enjoada e mesmo tremendo de medo com o coração aos pulos, me virei.

- Tem como você parar? - falei irritada tentando controlar minha ânsia.

Ele abriu um sorriso malicioso e nojento e falou com prepotência:
- Eu sei que você está gostando, princesa!

E bateu na minha bunda mordendo a língua. Olhei ao redor. Todos estavam olhando mas ninguém fez nada!

O trem chegara na estação 72 St, esperei um pouco até as portas quase se fecharem e aproveitei para meter um soco na cara do sujeito com toda a força que pude reunir e saí correndo para fora do trem, ouvindo apenas a sua voz gritando:
- Sua preta vagabunda! Puta de merda!

Uma flecha no coraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora