As cinco estavam sentadas, em uma parte do parque que havia dois bancos, um de frente para o outro, em uma distância curta. Elas estavam sentadas sobre eles, ainda com as mãos dadas, não sabiam por quanto tempo.
- O que te faz desencadear esses seus ataques de ansiedade? - Resolveu perguntar Victória.
- Pode ser qualquer coisa, desde algo bem insignificante, como uma mensagem, até algo mais importante, como uma apresentação em público. E com você?
- O mesmo. - Respondeu a ruiva.
- E você, Ma? Por que odeia seu corpo? - Perguntou Ana em voz baixa e devagar. Maria hesitou um pouco em responder, dando um suspiro profundo e pesado.
- Porque... eu... tenho todas essas banhas, essas dobrinhas... Eu... só queria um corpo perfeito...
- Mas não existe um corpo perfeito. - Declarou Raquel. - Não existe. Existem uma diversidade de corpos, assim como de pessoas. Você é linda do jeito que é. E seu corpo também.
- Exatamente, Ma. Teu corpo é lindo, e você é linda. Mas se você não se sente assim, também não vai mudar assim de repente só porque a gente tá falando isso. Mas a gente tá aqui. Do seu lado. - Natália afirmou e todas balançaram as mãos que estavam entrelaçadas, mostrando que elas estavam realmente ali. Para se ajudarem.
- Obrigada meninas, eu nunca conheci pessoas assim como vocês! - Ela sorriu. - E Raquel... sua relação com seus pais é realmente do jeito que você falou? - Raquel olhou para baixo no mesmo instante, evitando ter que encarar o rosto delas e ver uma expressão de pena. Como ela odiava a maldita expressão de pena!
- É... - A menina hesitou um pouco antes de continuar. - Eu digo pra mim mesma que não me importo, não me importo se eles são assim, não me importo com as panelas quebradas, não me importo. Mas eu acho que me importo. Talvez, eu quisesse ter pais que me ensinassem a andar de bicicleta, e não que eu aprendesse sozinha. Talvez eu quisesse pais que importassem se eu tirasse más notas, talvez eu quisesse ter pais de verdade e não pessoas responsáveis para ir na escola caso algo desse errado uma vez por ano.
- Eu sinto muito. - Disse Natália, sincera. - Mas eu estou feliz. - Raquel virou sua atenção para a loira franzindo o cenho. - Porque pude estar aqui e presenciar a primeira vez que Raquel desabafou! - As garotas riram, incluindo Raquel. - Mas não fique assim, está bem? As coisas vão melhorar.
- E você, Ana? Tinha quantos anos quando seus pais se separaram?
- Eu tinha quatorze. Minha mãe já trabalhava aqui em Beija-Flor, e como a minha guarda ficou com ela acabamos nos mudando para mais perto do trabalho dela. Eu sinto falta da minha antiga casa, dos meus antigos amigos, da minha família, do meu pai. Mesmo que eu ame morar em Beija-Flor, tem essa parte de mim que, se eu pudesse, voltaria sem pensar duas vezes.
- Eu já me mudei uma vez, fiquei um ano em uma cidade aqui perto, e me sentia assim como você. Quando nós tivemos a oportunidade de voltar pra cá, não pensamos duas vezes. - Disse Maria.
- É verdade, essa menina me abandonou! - Victória disse dramática, e Ana riu.
- É... Eu acho que todas nós temos nossos pesos. - Afirmou Ana, o que fez com que todas concordassem com um olhar meio perdido. Todas ali, tinham seus medos, suas apreensões, seus defeitos, seus problemas e todas ali tinham umas às outras.
***
Depois de tudo, as garotas estavam muito mais próximas, conversavam muito mais, passavam o recreio juntas e gastavam horas de seus dias conversando por mensagem umas com as outras.Natália ainda se sentia um pouco envergonhada. Além dos pais e da irmã mais velha, Bia, ninguém tinha a visto em uma de suas crises. Era um pouco embaraçoso, porém ficava mais confortável ao lado das meninas. Elas a respeitavam e não a julgavam.
Ainda não tinha conversado com Amanda o que iria naquele dia, nem saberia quando faria. A verdade é que as duas amigas estavam tendo conversas cada vez mais curtas ultimamente. Amanda era uma ótima pessoa, e a culpa daquele afastamento não era dela unicamente. As duas estavam se afastando, o que era até normal devido a toda aquela situação.
Ainda assim Nat sentia falta de toda a presença que a garota de olhos verdes claros tinha em sua vida. Ela a entendia mais que ninguém, porém agora duvidava um pouco disso.
- Olá! - Saudou Beatriz, ou melhor Bia, assim que entrou no quarto rosa da irmã. A garota, bem parecida com Natália, tinha cabelos loiros lisos que desciam até o ombro. Olhos azuis como a irmã e lábios carnudos que sempre formavam um sorriso. Ela era apenas dois anos mais velha, tendo seus dezoito anos.
- Ei. - Respondeu a garota que ainda estava sentada sobre sua cama enquanto pintava suas unhas.
- Também estou precisando pintar as minhas.
- Quer que eu as pinte pra você? - Perguntou a loira já finalizando sua unha.
- Claro! Eu gosto dessa cor. - Declarou Bia pegando um esmalte de cor azul-bebê. Natália concordou já pegando na mão da irmã e começando seu processo. - Sabe, você é boa nisso. - Afirmou.
- Eu sei. - Nat disse e sua irmã revirou os olhos.
- Você é uma convencida.
- Só estou dizendo a verdade. - Bia riu.
Do outro lado da cidade, Ana Nicole estava sentada no sofá assistindo um seriado, esperando que a mãe chegasse logo em casa. Ela estava em alguma reunião com as pessoas da escola, e havia dito que hoje tinha algo a contar para a filha. Qual era o problema de Sandra? Ela não sabia que a filha era uma curiosa nata? Ana Nicole sentia uma leve ansiedade percorrer seu corpo. O que de tão importante a mãe teria para dizer que não podia já ter dito antes?
Ana Nicole não entendia, mas mesmo assim esperava a mãe, enquanto, enrolada no cobertor, assistia algo para se distrair.
Ouviu o barulho de chaves destrancando a porta e suspirou.
- Até que enfim! - Disse Ana assim que a mãe abriu a porta da casa entrando e colocando a bolsa em cima do balcão.
- Veste outra roupa. Nós vamos jantar fora hoje.
- Isso tudo é pra dizer alguma coisa? - Menosprezou Ana subindo as escadas para seu quarto. A mãe não respondeu a pergunta.
Ana vestiu um vestido vermelho que tinha e mal usava, ele era bem colado ao corpo na parte de cima e sua saia era rodada. Na ponta da saia havia uma renda bem singela branca que dava um toque final à roupa. Não achava que aquilo seria algo importante, então não se deu ao trabalho de passar uma maquiagem. Apenas um batom da mesma cor do vestido. Nos pés, calçou um salto alto preto simples. O que só a deixava mais alta do que já era.
Dentro do carro, Sandra não falou uma palavra sequer. A mulher parecia um pouco nervosa, mas ao mesmo tempo feliz, o que deixou Ana ainda mais confusa.
O carro foi estacionado ao lado do restaurante. Ana, ainda dentro do carro percebeu que o lugar não estava tão movimentado para uma sexta-feira. Na porta do local tinha uma mulher de cabelos ruivos e pele clara e um pouco mais distante um homem de cabelos pretos escuros e uma barba feita.
As duas saíram do carro e caminharam silenciosamente para a porta de entrada, aonde, surpreendentemente, sua mãe cumprimentou o cara de cabelos pretos.
- Vocês se conhecem? - Perguntou Ana meio surpresa.
- Sim, filha. - A mãe concordou. - Essa é Ana Nicole. - Disse Sandra para o homem. - Ana, esse é o Pablo. Nós estamos namorando.
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Garotas Também Jogam Bola ✔
Roman pour Adolescents"Em uma cidade com nome de pássaro existia cinco garotas, cinco nomes, cinco vidas não tão fáceis quanto gostariam, cinco histórias paralelas que se cruzaram de uma forma inusitada e futebolística demais. Cada uma tinha seu motivo para estar no time...