Confiar nos nossos sentimentos, observar as coisas em nossa volta com mais atenção, certas vezes, isso poderia nos livrar de muitas dores de cabeça, de muitas atitudes mal pensadas e de muitas furadas.
Confiar no seu mal pressentimento e prestar mais atenção nas atitudes da garota Olívia, livraria Victória de muitas coisas.
Tomou posse da bola e correu para frente, os cabelos vermelhos já desbotados balançavam enquanto se movia com velocidade. Na primeira oportunidade passou a bola para Ana. Enquanto a alta tomava a posse e driblava algumas garotas, Victória continuava correndo.
Duas jogadores se aproximaram de Nicole e a cercaram. Sem ter o que fazer, e não conseguindo ir para a frente, foi obrigada a passar a bola. Victória a recebeu de jeito e se preparou para dar um grande chute e fazer um gol. Mas não teve chances. Sentiu-se puxada para trás e de repente, a bola já não estava nos comandos de seus pés, e ela estava atirada no chão.
O puxão pela camisa vermelha foi forte e rápido o suficiente para deixar Victória caída. Deitada de barriga para cima, a garota formava no rosto uma expressão carregada de dor. Todas as dores de cansaço se misturaram as dores da queda, que se focavam mais nos quadris e nas costas. O barulho forte do apito do árbitro indicou a falta e Victória se forçou a abrir os olhos para ver para quem aquele apito era direcionado.
Abriu os olhos a tempo de ver o homem levantar o cartão amarelo para Olívia, não conseguiu raciocinar direito, pois logo foi atolada de perguntas das meninas que encaravam a ruiva com preocupação.
Usou a força que ainda tinha para se levantar. Por mais que ainda sentisse dores e incômodos fortes, fez questão de estar de pé para cobrar a falta.
As jogadoras de Constelação já se preparavam, criando uma barreira, enquanto a bola era posicionada aonde a infração foi cometida. O olhar de Olívia cravava como brasas ardentes em Victória, mas os lábios grossos faziam um sorriso torto, cheio de desprezo e maldade.
Os trejeitos da garota, o modo como ela andava e inclinava o queixo para cima, o empinar de nariz, o ar de superioridade e as expressões, sendo em sua maioria desprezo, causava em Victória certo desconforto. Foram mais de uma vez que ela enxergou aquele tipo de olhar para cima dela, mas nunca sabia ao certo seu significado, só sabia que não era boa coisa.
Pegou a bola com as mãos e levou-a até a altura do rosto, depositando nela um beijo. Aquilo já havia se tornado uma tradição para Victória naquele ponto, como se para lhe trazer alguma sorte. Voltou com a bola ao chão e deu alguns passos para trás. Assim que fez isso, Olívia se aproximou de Victória, chegando perto do ouvido da ruiva.
- Você nunca vai ganhar do nosso time, preta imunda.
O sussurrar da garota foi suficiente para o mundo de Victória ficar em câmera lenta, mesmo que para os outros, tudo acontecesse muito rápido. Sua mente começou a dar voltas e voltas pensativas, e seu coração parecia estar se quebrando em mil pedacinhos, como um vidro que caí ao chão e se despedaça em mil cacos.
A ruiva sabia que a vida era um jogo. E como na vida, no jogo também existiriam grandes escolhas a serem tomadas. Escolhas que poderiam fazer o rumo se transformar totalmente. Escolhas que te faziam perder, ou te faziam ganhar.
Mas e se você não chutar a bola?
Você perde ou você ganha?
Talvez nenhum. Talvez os dois.
Porque não importaria o resultado de seu chute. Se acertasse as redes ou as traves. Estaria perdendo de qualquer modo. Estaria ignorando a voz desrespeitosa daquela garota que por algum motivo, havia a machucado tanto.
No futebol, existem pessoas que nunca perdem a oportunidade de fazer uma boa jogada, independentemente de quais forem as circunstâncias. Victória amava o esporte, mas ela não era esse tipo de pessoa.
Ela preferia perder uma boa jogada, do que ser obrigada a ficar calada. A ignorar. E mesmo que fosse uma atitude nada sensata, resolveu por não chutar a bola. Ali, estaria ela perdendo ou ganhando?
Porque no jogo da vida, deixou-se perder o controle e socar o nariz da menina.
E foi no exato instante que seu punho encostou na garota, que Raquel, do outro lado da quadra, juntou saliva na boca e cuspiu no rosto de outra jogadora de Constelação, por um motivo que só ela e a jogadora sabiam.
***
O apito do árbitro, indicando a falta, pareceu ter significado outra coisa para aquelas garotas. Foi como o som do decretar de guerra. Constelação foi para cima das Guerreiras e Guerreiras foi para cima de Constelação. O arbitro havia levantado o braço para cima mostrando o cartão vermelho para Raquel por ter cuspido na adversária, quando viu o que estava acontecendo do outro lado da quadra. Naquele momento, Olívia já tinha revidado o soco e pulado em cima de Victória que puxou o seu cabelo e depositou em seu rosto perfeito um forte tapa.
Outras também batiam em outras, e as que resolveram por não brigar, agora puxavam as suas colegas, tentando as separar. Os gritos estridentes de quem ficava nas arquibancadas só aumentava a pressão e a tensão que já existia.
O som dos pingos da chuva que batiam sobre o teto da quadra fechada tinha se tornado quase inaudível. O vento gelado se infiltrava pelas frestas e as pessoas abraçavam seus próprios corpos. Quem estava dentro da quadra, mal sentia o frio, efeito de toda a energia e adrenalina que passava pelos seus sangues enquanto chutes e socos eram dados.
- Velho, isso tá melhor do que eu esperava! - Exasperou um dos garotos que assistia tudo pelos bancos.
- Idiota! - Gritou Vicente para o rapaz antes de descer e tentar entrar na quadra para ajudar a separar aquela enorme confusão.
Várias pessoas desciam das arquibancadas às pressas. Umas para verem de perto, outras para tentarem ajudar. O que tornava difícil a acessibilidade à quadra para Vicente, devido a multidão de pessoas que se formava a cada segundo.
Se espremeu e passou pelas pessoas, até por fim, entrar na quadra e correr em direção a Victória que continuava dando e recebendo socos de Olívia. Segurou a colega enquanto a treinadora das garotas de Estrela segurava Olívia. Pegou nos ombros da ruiva, tentando de alguma forma a tranquilizar, levando-a para o mais longe dali.
Porém, de alguma forma, Olívia se soltou de sua treinadora e usou suas forças para correr em direção aos dois, e antes que Vicente visse e impedisse a menina, Victória havia recebido um soco no olho.
Natália levantou-se de supetão e tentou correr, para que pudesse fazer algo sobre aquilo. Mas a rapidez com que ficou de pé, a causou uma grande tontura, e os pés, ainda fracos, cederam-se novamente, fazendo com que caísse para trás, voltando a se sentar nos bancos.
Não chamaria mais aquilo de Grande Jogo. Com toda certeza, aquilo tinha se tornado um Grande Desastre.
•⚽•
Vou te dizer, esse capítulo foi bem difícil de escrever. E ainda mais de ter que revisar e ficar relendo, porque doeu no coração.
Sofrer racismo é uma das piores coisas que alguém pode vivenciar. Se você já sofreu, eu sinto muito, muito mesmo. E espero que nunca sofra novamente.
Bom... Eu queria agradecer vocês pelo carinho. Eu recebo mensagens muito lindas de vocês e eu só tenho que agradecer. Amo cada um!
Me desculpe se eu fiz vocês sofrerem com esse capítulo dramático ksksks mas prometo que tudo tem um propósito e no fim, tudo vai se ajeitar. Prometo!
Um beijão pra vocês! Nos vemos por aí! ❤
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Garotas Também Jogam Bola ✔
Novela Juvenil"Em uma cidade com nome de pássaro existia cinco garotas, cinco nomes, cinco vidas não tão fáceis quanto gostariam, cinco histórias paralelas que se cruzaram de uma forma inusitada e futebolística demais. Cada uma tinha seu motivo para estar no time...