O Dom

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Segunda-feira, 8 de abril de 2019.

Maya se sentiu bem por Helena conseguir esperar dois dias, sua mente era uma confusão sem sentido. Elliot sentiu as costas dormentes quando Maya o acordou. Havia lido inúmeros livros à noite toda, ainda procurava algo sobre sua origem. A escolhida lhe entregou um prato de panquecas e um chocolate quente.

— Deveria ter dormido no quarto de hóspedes.

— Era minha intenção, mas acabei pegando no sono.

— Achou algo?

— Achei, Helena tem uma coleção e tanto hein. — admitiu ele antes de colocar os livros para o lado e começar a comer. — Isso aqui é uma dark web só de livros mágicos.

— Você viu o Peter? — a garota sentou em uma cadeira vaga, tinha outro prato em sua mão.

— Saiu para comprar café... Não o vi indo embora ontem, ele...

— Estávamos conversando e ele caiu no sono. Não quis acordá-lo.

Elliot bocejou. Seu rosto pálido anunciava o começo das olheiras. E parecia que se ele mudasse a posição das costas — se levantando, por exemplo— elas simplesmente quebrariam.

— Precisa tomar um banho, ainda somos adolescentes e temos que ir à escola.

Elliot soltou um gemido de protesto, mas acabou cedendo. Sabia precisar ocupar um pouco a mente. Pernoitar com letras na cabeça não estava dando o efeito que ele desejava, precisava se distrair, para se concentrar melhor. Um passo para trás para ver todo o cenário, sussurrou ele enquanto caminhava até o banheiro do 1° andar. Desde que Maya estava inconsciente em um sono mágico, ele havia pedido a Helena o quarto de hóspedes emprestado. Queria ficar perto dela. Helena aceitou, o quarto já era dele desde a infância.

...

Maya examinou os corredores abarrotados de alunos e encarou o melhor amigo. Uma onda de desgosto atravessou os dois e eles disseram em uníssono.

— Amostra cultural do primeiro ano.

— Precisamos mesmo entrar? Nós podemos dar meia volta e voltar para a casa da Helena. Não precisamos ver isso. — a menina começou, virando as costas.

— Talvez devêssemos, vocês dois já passaram por muita coisa, merecem um descanso, por mais que seja ver uma turma totalmente despreparada para atuar em "Romeu e Julieta".

— Esse é o clássico mais brega que já vimos — Maya se lembrou da promessa que fizera com Elliot. Os dois iriam faltar naquele dia, uma doença coletiva, seria a desculpa.

Peter a encarou.

— Romeu e Julieta é uma das melhores obras já feitas.

Maya riu. Desde quando suicídio coletivo virará uma coisa para se apreciar.

— É melhor entrarmos. — destacou ela. Amava as obras de Shakespeare, mas Romeu e Julieta era uma coisa que ela não entendia. Uma coisa que a fascinava de tal modo que ela evitava. Toda vez que assistia, lia, ou até mesmo escutava alunos pronunciando aquelas palavras tão belas com nenhum sentimento, seu peito se entristecia. Aquela peça nunca deveria ser apresentada por pessoas que não tivessem amor nas palavras que diziam. Palavras essas tão intensas que nem cabiam no peito, palavras que precisaram ser escritas na vã tentativa de aliviar o coração. Em vão. Ela sabia muito bem como eles se sentiam, mas ao encarar os atores em um palco falso; todo o amor pela obra se esvaia em gaguejo e folhas nas mãos, além de, é claro, não concordar que Romeu e Julieta era uma história de amor.

Assim que os três adolescentes se espremeram no corredor e encostaram em corpos desconhecidos, Elliot teve uma sensação estranha e imediatamente seu corpo todo se arrepiou. Cada átomo tremeu, começando a se mexer dentro dele, fazendo o formigamento se tornar maior e maior. Quando se deu conta, o nerd que parecia ter os cabelos como tentáculos, notou que não estava mais no colégio em Allenksville, mas sim em um quarto escuro com cortinas fechadas que ocultavam a entrada do sol. Ele tentou se mover, mas os pés não o obedeciam, não conseguiu. Parecia preso no lugar, em um círculo esbranquiçado.

A Espada de Lilith (Livro 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora