Dois dias depois, em 23 de fevereiro de 2019.
O alarme das 06h30min acordou Maya de um sono profundo. Fazia tempo que ela não sonhava tão bem assim (havia se acostumado com seus gritos durante a noite). No primeiro dia, até achou incômodo abrir os olhos no silêncio de uma manhã ensolarada. A garota bocejou antes de jogar os cobertores de lado e levantar para mais um dia de sua suposta longa vida bruxesca.
As palavras do jovem misterioso surgiram novamente em sua mente. "Também não é assim Kinsley, garanto que Helena teve motivos suficientes para esconder de você. Ela sempre se preocupou com a sua segurança em primeiro lugar, se alguém adivinhasse que ela estava com você, seria o fim, não apenas da vida dela, mas principalmente da sua. Ela não poderia arriscar."
Ao encarar seu reflexo na frente da cama, Maya sorriu. Era estranho, mas ela se sentia viva. Bem consigo mesma. Havia se passado dois dias desde o acontecimento, o "incidente" como chamou ela, e desde aquele dia, Crawford nunca mais entrou em contato, e as coisas com Helena não continuaram iguais.
— Não se ganha todas — ela disparou levantando os ombros. Por mais que Helena não dissesse, ela acabaria descobrindo sozinha, havia decorado o que o jovem bruxo havia dito naquele dia. A senha para loucos em um hospício, ou para ladrões experientes. Agora poderia entrar e investigar por conta própria.
A garota desceu as escadas e virou a direita, indo em direção à cozinha. Um papel verde a esperava preso na bancada de mármore branco. "Volto tarde. Preciso que pegue uma coisa na biblioteca. Tem comida no micro-ondas". Maya jogou o papel no lixo antes de colocar café na xícara. Seus pés caminharam até o escritório. Colocou a boca perto da maçaneta e sussurrou as mesmas palavras e como mágica, sim salabim, a porta estava destrancada. Pegou a bíblia, tirou a chave, destrancou a segunda porta e vislumbrou os inúmeros livros proibidos escondidos pela mulher que tão certamente se passava de uma simples médica.
A escolhida sorriu antes de pegar o livro roxo que pousava delicadamente na mesa e sentar em uma das cadeiras. Por um tempo, apenas o vislumbrou. Um livro pesado, de um roxo escuro reluzente. Uma fita vermelha se amassava dentro dele, tentando escapar. No primeiro dia, se lembrou das palavras do jovem, como se elas ecoassem nas paredes de seu subconsciente. Sangue real, o que significava aquilo? Ela não poderia simplesmente furar o dedo da Rainha Elizabeth! Pensou por um longo tempo e chegou a conclusão que não custaria nada tentar com o próprio sangue. Com relutância, furou. E examinou quando uma pequena gota de sangue vermelho escuro, quase preto, tocou a capa do livro, fazendo um círculo perfeito acima do corvo, prendendo-o em uma gaiola oval avermelhada. Instantaneamente o livro emitiu um barulho alto, o que fez com que a garota o jogasse na mesa e se levantasse, dando alguns passos para trás. Com o passar dos segundos congelantes no relógio do cômodo anterior, a menina viu o livro se abrir completamente, e subir ao ar com uma facilidade absurda. Não o bastante, ele começou a se folhear sozinho, como se tivesse entrando um vento forte por alguma janela. Naquele ambiente não havia janelas.
A menina tomou coragem depois que o livro caiu aberto na mesa. Morto como um soldado abatido em uma guerra. Páginas amareladas a encaravam com desânimo, e a tinta negra se preenchia em cada pedaço do papel.
Maya voltou a sentar. E com esse gesto, horas se passaram. Ela estava presa nos livros, presa naquele mundo novo cheio de coisas maravilhosas e complicadas que ela jamais conseguiria entender. Talvez não devesse entender a magia, talvez apenas devesse senti-la. No primeiro dia, acordou de uma maneira incômoda, e encontrou uma Helena calada na cozinha. O garoto desapareceu como fumaça em seus dedos, e ela não sabia o que fazer. Mas havia alguma coisa que incomodava ele, e foi depois dela ter dito que tudo aquilo era impossível.
...
— Quem inventou essa palavra foi um covarde, okay? Como você sabe que é impossível se você nunca tentou? Tudo é provável até...
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A Espada de Lilith (Livro 1)
FantasíaOs olhos da fera a encararam com curiosidade. Ela dormia envolta por cobertores leves, parecia ter um gosto tão bom, ele quase podia sentir o gosto do sangue dela escorrendo pelo chão, manchando as paredes de escuro. O que sentiria ao cortar sua pel...