O Chaveiro de Corações

18 • Ligações inesperadas

Após remexer na cama a noite inteira, totalmente insone, eu nem sequer precisei do despertador para acordar. Estava de pé quase uma hora antes do habitual, encarando a chave dourada e largada na mesa de cabeceira. Segurei meu telefone, escrevendo e reescrevendo várias vezes uma mensagem para Charlie, pedindo para o ver à noite. Eu devolveria a chave para o relojoeiro e o deixaria livre, mas não podia fazê-lo sem uma explicação.

O nervosismo me tirou até mesmo o apetite no café da manhã. Mamãe me observou remexer nas panquecas até perceber que elas não iriam fazer seu caminho até minha boca. Parando sua refeição e a conversa sobre o dia anterior, ela me fitou com olhos preocupados.

— O que você tem, Maddie? — perguntou, suspirando fundo. — Querida, se for por conta do Josh... — começou, a voz cansada como se aquela conversa lhe custasse muita energia.

— Não, não. — Eu a interrompi, balançando a cabeça negativamente. — Não é por causa dele. Quero dizer, não somente.

Não era como se todos os acontecimentos dos últimos dias tivessem sumido da minha mente. Agora, no entanto, eles haviam sido sobrepujados por outras questões.

— Então você quer falar comigo sobre o que há nessa cabecinha? Sabe que pode me contar qualquer coisa. — Mamãe disse, a voz suave como mel. — É algo com o Charlie? — Ela indagou outra vez, antes mesmo que eu respondesse sua pergunta anterior. Era peculiar como ela sempre acertava seus palpites.

— É, é ele — confirmei, deixando meus olhos caírem para minhas panquecas. Eu definitivamente não as comeria. — Bem, na verdade, sou eu. Eu descobri que talvez não goste tanto dele quanto pensava — confessei, respirando fundo e voltando a olhar para mamãe. Ela tinha um sorriso sereno e compreensivo no rosto.

— E por acaso você chegou a essa conclusão descobrindo que gosta de outra pessoa? — sugeriu, me observando com o queixo apoiado nas mãos e os cotovelos na mesa.

A pergunta me pegou tão desprevenida que nem sequer pude pensar numa resposta adequada. Fisguei o rosto da minha mãe, mas logo desviei os olhos para as panquecas novamente, refletindo suas palavras. Parecia uma indagação direcionada demais para ser apenas aleatória, e pensei que talvez ela tivesse percebido algo que eu não havia ou mesmo que não queria perceber.

— Hmm... — ponderei, suspirando. — Eu não pensei sobre isso.

— Bem, deveria pensar. Sentimentos são traiçoeiros, principalmente os que temos por outras pessoas. — Ela sugeriu, bebericando seu leite e olhando para o relógio. — Hmm, já está na minha hora. Quer que eu te leve para a escola? — perguntou, levando sua louça suja para a pia.

— Com certeza. — Eu disse, desistindo da comida e levantando para ir com ela.

Durante o resto da manhã, as palavras de mamãe remoeram em minha cabeça. No fim, dúvidas eram tudo que eu tinha, mas estava decidida a sanar algumas delas mais tarde, ao passar pela porta da pequena loja do Sr. Garrett, o relojoeiro.

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Quando as aulas acabaram, eu quase corri para fora da escola, não me dando chance de esbarrar em Charlie ou qualquer outra pessoa. Comecei meu caminho pelas ruas tranquilas de Baybrook, e logo o supermercado do qual saíra no fatídico dia da chuva marcou o quão próxima estava a loja do relojoeiro. Meu coração pulou de antecipação e passando as mãos nos bolsos, instintivamente procurei pela chave. Para minha surpresa, no entanto, ela não estava ali.

Confusa, eu parei no meio da calçada, buscando a chave nos meus outros bolsos e pela minha mochila. Meus dedos ágeis invadiram todos os esconderijos possíveis, mas não havia sinal do objeto. Nervosa, espremi minha memória, tentando lembrar onde poderia ter a perdido. Recordava ter visto a chave pela última vez na minha mesa de cabeceira, pela manhã. Então, eu lembrei: havia levantado da cama, apanhado a chave do móvel e a largado na penteadeira no caminho para o banheiro, onde a esquecera antes de sair.