O rosto do meu melhor amigo foi a primeira coisa que avistei assim que entrei em casa. Gregory estava aconchegado no sofá com sua mochila vermelha jogada no colo, muito distraído enquanto digitava no celular. Ele franziu o cenho quando abri a porta de supetão, mas relaxou assim que me viu, deixando uma risada divertida escapar.
Eu estava encharcada e pingando no tapete de entrada como um gato fujão e ranzinza; os indícios de que havia sido pega pela chuva uma segunda vez no caminho de volta da relojoalheria. Me observando naquele estado, Gregory mal conseguiu segurar o riso, largando o celular no sofá e vindo me ajudar com as sacolas do mercado.
— Tudo bem, pode rir de mim hoje. — Eu me rendi, o entregando as bolsas para tirar minhas botas encharcadas. — Fui enganada pela chuva duas vezes e levei um tombo vergonhoso, um belo placar.
Enquanto resmungava, eu tentei me equilibrar num pé só para tirar os sapatos. Puxei minha bota, mas ela parecia presa, então tentei com mais força e quando o calçado finalmente saiu, um respingo d'água saltou na direção de Greg. Ele deu um pulinho para trás com uma gargalhada.
— Você levou um tombo? — perguntou entre risadinhas abafadas. Ele estava vestido todo de preto e o relógio em seu pulso me lembrava do relojoeiro. — Está bem?
— Estou sim — respondi, mas instintivamente esfreguei o inchaço na cabeça.
— Está mesmo? Porque parece que se machucou.
Preocupado, Greg largou as sacolas no chão para olhar minha cabeça. Ele afastou cuidadosamente o cabelo pingando no lugar onde minha mão estivera, buscando por algum machucado entre os fios.
— Maddie! — A voz de mamãe ecoou de repente. Com as mãos ao ar e todo o cabelo castanho preso no alto da cabeça, sua figura logo surgiu na sala, vinda da cozinha. — Meu Deus, como você demorou! Já estava preocupada. — Ela parou e me observou da cabeça aos pés. — Olhe só para você, vai acabar pegando um resfriado.
— Um resfriado e um galo também. — Greg disse, passando os dedos sobre meu machucado.
— Ai! — resmunguei, me encolhendo pelo contato doloroso.
— O que tem aí? — Mamãe perguntou, rapidamente virando minha cabeça para investigá-la. Sem demora, ela achou e palpou o hematoma, me arrancando um grunhido. — Madelyn Rose. O que foi isso?
— Foi só um acidente. Um muito vergonhoso — confessei, querendo rir. — Tentei arrumar um abrigo da chuva, escorreguei e caí numa loja. Mas estou bem, só preciso tomar um banho e...
— E colocar gelo nisso. — Ela interrompeu.
— Claro, capitã — concordei solenemente, segurando uma risada.
Mamãe cruzou os braços no peito e balançou a cabeça, agora sorrindo um pouco. Algumas linhas acumularam-se no canto dos seus olhos e seu sorriso era quase jocoso como o de Gregory, mas ela era melhor em disfarçar.
— Pode me esperar mais um minuto, Greg? — pedi, virando-me para ele.
Meu amigo me entregou um sorriso e deu de ombros antes de assentir levemente. Com isso, eu caminhei para fora do tapete da entrada, molhando o chão sob meus pés. Escutei quando mamãe bufou, largando os braços ao lado do corpo.
— Por Deus, você vai molhar tudo! — Ela resmungou, fazendo um risinho escapar de Gregory. Ouvindo o som, ela virou-se para ele. — E você, Greg, me ajude e leve essas sacolas para a cozinha.
Com o sorriso divertido abrindo-se ainda mais em seu rosto, Greg concordou prontamente e começou a executar sua tarefa; após mais de dez anos estando por perto o tempo todo, mamãe já o tratava como um filho também. Vendo meu amigo partir, eu me apressei até as escadas antes que o olhar dela me achasse encharcando o chão ao lado do sofá. Subi os degraus nas pontas dos pés e quando fechei a porta do banheiro, os resmungos e broncas da minha mãe viraram sussurros no andar de baixo.
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O Chaveiro de Corações
Romance🏅 | Finalista do Prêmio Wattys 2022 🏅 | Finalista do Prêmio Wattys 2021 🌟 | Eleita uma das Melhores Histórias de 2020 pelos Embaixadores do Wattpad ⭐ | Destaque de setembro/2020 do @WattpadRomanceLP O coração de Charlie Berry parece estar sempre...