Capítulo 28 - Eun Woo

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Enfim atracamos, viajar de barco ainda me fazia muito mal. Eu me sentia muito melhor em terra firme, ao contrário de minha irmã, que estava reluzente, coisas da vida. Tirando a alegria apaixonante de minha irmã, todos no barco estavam pensativos, não podia ser diferente comigo. Afinal, pesava sobre as minhas costas a responsabilidade da batalha, a responsabilidade por tantas vidas envolvidas, a responsabilidade pelo sangue que será derramado e a responsabilidade por uma possível vitória. Pois quando entramos em batalha, por mais confiantes que estejamos, não sabemos se toda essa confiança irá nos trazer o destino que sonhamos e almejamos, ou seja, a vitória. E se por acaso isso acontecesse, pesava também o futuro de uma nação. E era impossível para mim naquele momento não pensar que a minha vida mudou em tão pouco tempo, e mudou drasticamente. Aquele rapaz que pensava em livros e morava em um palácio havia desaparecido. Realmente amadureci.

Foi então que eu escutei uma batida na porta de minha cabine, seguida pela voz de meu eunuco.

- Alteza, já podemos desembarcar.

Minha vida estava prestes a mudar, de novo. Eu poderia continuar vivendo, ou poderia encontrar meu fim no calor da batalha.

Subi ao deque do navio e de lá observei o movimento do cais e toda aquela agitação, pude ver a expressão dos homens, o quanto eles estavam compenetrados, mas também eufóricos. Aquele dia estava lindo, o sol brilhava no céu, o que era sempre bom. Via também o agito dentro do navio. Acima de todo aquele burburinho, uma voz grossa e potente se destacava. O capitão Moon Bin berrava ordens para a sua tripulação, coordenando o desembarque do navio. Do lado do nosso navio, mais uma fileira de embarcações se encontrava atracados no cais, de onde desciam armas, soldados, cavalos, mantimentos e muitas caixas. Vi o mestre Rocky, o general Jin-Woo, o governante e seu primo, acompanhados também de mais soldados, se dirigindo aos seus cavalos. Eles estavam indo para o acampamento. Rocky levava consigo uma carta ao dirigente do acampamento, marechal Mal-Chin, amigo íntimo de minha vó. Estava nos prevenindo de um possível imprevisto e o combinado foi de que assim que ele chegasse no acampamento, enviasse um assistente para relatar os acontecimentos do encontro.

Assim que vi eles se afastando, decidi que iria verificar como as coisas estavam indo com os outros. Ao passar por Moon Bin o cumprimentei com um aceno de cabeça e ele fez o mesmo. Entrei novamente no navio, porém fui em direção a ala das cabines. Passei pela primeira cabine, onde encontrei minha irmã sentada em seu colchonete enquanto escovava os longos cabelos negros. Quando ela me viu abriu um sorriso e me explicou que iria sair daqui a pouco, pois queria terminar de se arrumar e também pois queria esperar a concentração de pessoas se dissipar um pouco. Após a breve conversa me despedi dela. Porém, ao sair da cabine de minha irmã, pude ver várias outras moças belamente vestidas se dirigindo a cabine dela. Revirei os olhos e abri um sorriso. Mulheres, não sei por que elas precisam de tantas outras para se arrumar. Até parece que estamos indo para uma festa.

Passando a cabine da minha irmã, cheguei na cabine do médico e de Myungjun. Os dois haviam ficados mais próximos desde o incidente da floresta. Felizmente o médico Sanha já estava se recuperando de seu ferimento, e já podia se movimentar com a ajuda de uma muleta. Ao abrir a porta da cabine do médico, me deparei com a seguinte cena: Myungjun e Sanha estavam sentados no colchonete jogando dados e apostando. Apostando comida. Myungjun tinha um sorriso travesso no rosto enquanto Sanha continha uma expressão de desespero, acho que Myungjun ia ganhar. Soltei uma risada fraca e voltei a andar pelo convés. Como eu queria poder ter a paz daqueles dois, enquanto eu observava eles pareciam que não estávamos mais em guerra, como se tudo tivesse voltado ao normal e estivéssemos fazendo apenas uma viagem em conjunto, explorando os vários locais de nosso país. Porém eu sabia que não era nada daquilo. Tínhamos uma batalha pela frente, uma batalha que não seria nada fácil. Só de pensar naquilo meu coração acelerava. O que iríamos encontrar pela frente? Como um homem estudioso, a perspectiva de não saber o que iria acontecer me assombrava. Eu sabia que a resposta que eu tanto buscava não estava em nenhum de meus vastos livros. Aquela resposta só seria encontrada depois da batalha. E era isso que me deixava mais ansioso. Eu precisava encontrar alguma tarefa para me distrair, porém, o que? Meu mestre e o general haviam saído, Moon Bin estava trabalhando, minha irmã se arrumando, bom, não que eu gostasse da ideia de ela me encher de laços de cabelo e batom. Sobraram apenas o médico e Myungjun. Não, eu não era bom em jogos. Resolvi então que iria dar uma volta pelo porto, talvez até pela cidade.... Arejar um pouco a mente.

Assim que pisei no porto novamente respirei fundo e deixei com que o ar marítimo preenchesse meus pulmões, era uma sensação boa. Caminhei pelo meio dos trabalhadores, olhando atentamente enquanto eles realizavam seus trabalhos. Era estranho estar de volta. Aquele porto me trazia à tona antigas lembranças, lembranças do dia em que partimos daquele local. Saímos de lá como príncipes e retornamos como rebeldes. Não pude me impedir de sorrir. Eu, um rebelde? Se me falassem isso um ano atrás eu com certeza não acreditaria. Enfim, coisas da vida.

Conforme fui me misturando a multidão meu eunuco e mais alguns guardas se aproximaram de mim.

- Alteza, o senhor acha prudente entrar no meio desta multidão? - Meu eunuco falou, preocupado - O seu irmão pode ter enviado assassinos para matá-lo.

Abri um sorriso e respondi:

- Não se preocupe, afinal, eu tenho vocês - falei enquanto olhava para ele e para os guardas que me acompanhavam.

Dito isso, virei as costas e continuei a andar no meio da população. Conforme passava pelas ruas, antigos moradores da capital me cumprimentavam com felicidade. Achei incrível como eles pareciam bem melhores, realmente são um povo guerreiro. Conseguiram suportar todas as restrições e punições de meu irmão, e ainda conseguem sorrir. Eu não poderia ser mais grato por ter um povo tão bom. Aquilo despertou um sentimento em mim, um sentimento de determinação. Eu precisava ganhar aquela batalha. Eu tinha que fazer isso pelo meu povo, era o mínimo que eles mereciam. Imerso em meus pensamentos, nem percebi o momento em que várias crianças se aproximaram de mim, seus grandes olhos brilhavam de curiosidade. Abri um sorriso para elas, que se sentiram envergonhadas.

- Não precisam ficar com vergonha - falei enquanto me abaixava - não vou lhes fazer mal.

Uma menininha, com os cabelos pretos trançados e as bochechas sujas de terra se aproximou mais de mim.

- O senhor veio salvar a gente?

Aquilo me estilhaçou por dentro. Crianças daquela idade não deveriam se preocupar com aquilo, não deveriam ter que sofrer tanto. Não era justo. Elas deviam estar brincando, estudando, correndo pela cidade e gritando. Não se preocupando com o futuro do país. Meu irmão estava destruindo a infância delas. Senti nojo ao me lembrar de que carregávamos o mesmo sangue nas veias.

- Vim tentar, minha querida.

Aquilo pareceu ser o suficiente para ela. Seus grandes olhos brilharam mais com a perspectiva da salvação.

- Muito obrigado senhor - eles se curvaram em uma rápida reverência.

- Não estou fazendo mais do que a minha obrigação - sorri fracamente e me levantei - agora, vão brincar, o dia está lindo e quente.

Elas se entreolharam e segundos depois saíram correndo e rindo. Eu esperava que eu pudesse estender aquela alegria para sempre. Eu tinha que conseguir.

Depois que vi as crianças desparecerem na multidão, me direcionei até um bar que ficava de frente para o porto. Me sentei em um banco e fiquei observando a movimentação. Não se passou muito tempo, até que avistei um guarda vindo da direção da planície. Ele deveria estar trazendo as notícias do acampamento. O segui com o olhar, vendo ele procurar atentamente por mim no meio do porto. Vi que ele foi em direção ao barco e se reuniu com alguns soldados que transitavam por lá, provavelmente para perguntar onde eu estava. Eles conversaram um pouco até que ele voltou a andar por entre a multidão. Sinalizei para que um de meus guardas fosse encontra-lo. Não se passou muito tempo até que ele retornasse com uma carta em mãos. Peguei o papel e o abri, me deparando com a caligrafia típica do mestre.

"Tudo está indo como o esperado aqui. Me reuni com Mal-Chin e devo dizer que a sua carta teve uma grande serventia, foi sensato tê-la trazido comigo. Fora isso, tudo estava indo bem. Mal-Chin nos levou para conhecer o acampamento, porém, algo aconteceu. Jin-Woo descobriu. Devemos tomar algumas providências a respeito. Assim que eu retornar podemos conversar sobre o que vamos fazer."

Aquilo não era um bom sinal. Jin-Woo descobriu sobre o seu amigo. O que iríamos fazer agora? Li mais uma vez a carta para confirmar se aquilo realmente havia acontecido. Tanto eu quanto o mestre sabíamos as possíveis consequências daquela descoberta e elas não eram nada boas.

The beginning of a new eraOnde histórias criam vida. Descubra agora