Declínio

262 29 4
                                    

Foco nos olhos dele e me sinto completamente perdido, no quarto escuro o azul de seus olhos passa despercebido. Esse momento, com apenas a luz laranja do poste passando pela janela, deixa algo poético e solitário refletido nele.

Levo minha mão ao seu rosto, completamente distraído do fato de que ele também esta me encarando, completamente alheio ao silêncio no cômodo. Só consigo pensar no rosto entre as minhas mãos. Lance também é uma pessoa, com defeitos, com sentimentos, com inseguranças, com corpo e alma, será que alguma vez desde o inicio eu pensei nisso? Será que alguma vez desde o inicio eu me preocupei com ele? Eu se quer ouvi o que ele tinha a dizer?

Eu só tenho o questionado, apenas o julgo em silêncio, mesmo depois de conhecer ele há tanto tempo, mesmo depois de ter me apaixonado pelas piadas burras e o sorriso fácil, mesmo depois de ter o visto mudar e crescer, eu o objetifiquei. Esse tempo todo eu tenho o admirado como se fosse de outro mundo, me comparado a ele como se ele fosse o próprio padrão de beleza que me oprime.

E agora ele está aqui, Lance McCain, eu tenho uma queda por ele desde que me lembro. E recentemente, isso vem aumentando muito. Meu coração bate rápido e alto, minhas pernas ficam bambas, minhas mãos tremem.
Não, não é só uma queda, já tem muito tempo que é mais que isso

Foda-se todas as lideres de torcida do mundo, e todo mundo preso nesse mundo social venenoso do Ensino Médio, de alguma forma ele está comigo, e eu quero ser a pessoa que vai fazer ele sorrir.

Lance é alto, moreno, com olhos azuis, e um sorriso encantador. Os rostos viram quando ele entra no cômodo, ele irradia uma luz única, é cativante e magnético. Mas mesmo que ele pareça ser o garoto mais lindo do mundo, e talvez seja, a pessoa que ele é consegue ser ainda mais linda.

Ele é determinado, inteligente, humilde, simpático, empático, sincero, leal, divertido, eu poderia passar dias descrevendo seu coração puro, sua devoção aos seus princípios morais, seu caráter impecável, e provavelmente ainda deixaria passar um detalhe como... como a forma que ele mexe o nariz quando está com raiva, ou como ele é atencioso e sempre se lembra de todas as datas, ou como a voz dele soa ainda mais bonita em espanhol, e assim por diante.

-Desculpa.- sussurro antes de beijar ele- Eu te amo.

Ele franze a testa em um primeiro momento sem entender o pedido desculpas, mas ouvindo a declaração sorri como se não existisse nada mais.

-Eu te amo.- ele responde, simples e sincero.

-Tudo bem em casa? Com sua mãe e todos os seus irmãos?

-Sim, tudo bem.

-Tudo bem com Hunk?

-Eu acho que sim, por que?- ele se apoia em um cotovelo, erguendo um pouco o corpo.

-Hmm... Ele é seu melhor amigo, só queria saber.

-Como está Tom?- ele pergunta, como se testasse a utilidade da questão.

-Perdido nos braços do Marco, certeza. - sorrio sem pensar muito sobre isso, meu objetivo é saber dele e do mundo dele- E o time de futebol?

-Você está pensando em voltar?- os olhos dele parecem brilhar pela hipótese- A gente tem um jogo importante agora e seria muito melhor se...

-Não, de jeito nenhum. Fala sério, Pidge me mata, tem o concurso da banda, tem a desgraça do ENEM... Eu ainda tenho um namorado que precisa de atenção, não tenho tempo pra time nenhum.

-Ha-ha, quem vê você falando assim até pensa que você precisa separar tempo pra mim, quando eu também faço parte da banda, sou seu principal método de estudo de ENEM, e ainda estaria no time ao seu lado.

-Meu principal método de estudo de ENEM?- não entendo ao que ele se refere, uma vez que eu nem estudo.

-Eu decidi isso agora...- ele diz, pegando minha mão com carinho- Eu vou obrigar você estudar comigo pelo menos uma hora por dia até o dia do ENEM.

-Não.... Por que?- resmungo, infeliz com a decisão mas sem vontade de protestar.

-Porque eu preciso estudar, e quando 'to longe de você não consigo me concentrar em nada.- claramente uma mentira, mas longe de mim contornar o flerte.- Eu realmente não quero viver longe de você.

-Eu também não.

***

Novo plano. Eu tive um plano antes não tive? Eu posso ter um novo, diferente. Acordar e tomar café com a minha familia, ir para a escola de carona com Shiro, voltar da escola andando com o Lance.
Eu realmente não acho que tenho condição de estar em um clube agora, a banda é suficiente. É uma atividade social e é meu espaço seguro, onde posso liberar meus sentimentos de uma forma produtiva.
Estudar para o Enem deve ser a pior parte. Eu sei que se eu for de pouco em pouco, eu posso recuperar minha alimentação de forma saudável, e focar em jeitos mais saudáveis de emagrecer. Eu consigo reconhecer que desenvolvi bulimia e anorexia, isso é bem visível agora. Dizer que eu tenho distorção de imagem que não me parece correto, não tenho o corpo que quero e acho que tudo bem eu lutar por isso.

Mas o Enem, pelo que eu estou lutando? Fazer faculdade de música é completamente insano, e inútil, e eu não passaria na prova de avaliação específica. Ir pra faculdade só para ficar perto do Lance porque minha insegurança me diz que ele encontraria alguém melhor estando longe de mim é meio doentio, e muito tóxico, além de patético.

Mas então o que EU quero fazer?
Eu gosto de exatas e de literatura. Eu gostaria de ter um emprego de 9h as 17h, desses que meu chefe não fica do meu lado, e que não estivesse relacionado a criar.
Eu poderia fazer administração? Contabilidade? Com o que as pessoas trabalham nos dias de hoje?

-'Ta pensando em que? -lance questiona enquanto andamos de volta pra casa.

-Faculdade....- os olhos dele brilham em expectativa ao ouvir a resposta- Eu quero fazer alguma coisa mas não sei ao certo o quê. O que você vai fazer?

- Biologia Marinha.

- Soa bem apropriado. Acho que eu vou ter que fazer testa vocacional.

- Por que não faz música? Artes? Literatura?

- Não quero ser professor, nada contra, só não quero ter que voltar pra escola.

Conversamos com facilidade sobre minhas habilidades, meus gostos, minhas dificuldades, e as coisas que odeio. Os nossos passos lentos parecem se perder no tempo de forma distraída, como a temperatura quente do verão se torna amena debaixo de qualquer sombra. Talvez nada seja pior na vida de um adolescente privilegiado do que o ano de formatura. Ter 17 anos é uma merda. Mas no meio disso tudo, Lance, meu próprio romance de ensino médio, é como uma brisa primaveril.

Talvez muitos dias tenham sido horríveis, mas ainda assim, tantos dias foram bons.

[N.A:
Por favor não se ofendam com o posicionamento do Keith, é um pensamento limitado, faculdade de música é algo válido sim.

Essa história será concluída em mais 6 capítulos, o que se Zeus quiser é antes do próximo verão acabar. Essa autora pede desculpas a todos que vieram até aqui, pela inconstância, entendam que eu não sou quem eu era quando comecei essa fic, e isso é incrivelmente saudável pra mim, mas também um pouco confuso de se lidar.

Feeling Bad By Being FatOnde histórias criam vida. Descubra agora