Não revisado.
Quando a tarde caiu eu já havia pegado no sono, mas eu senti no momento em que Ezra me soltou, porque eu finalmente consegui rolar no colchão ficando de bruços. Notei o ambiente ao redor se agitar, e o cheiro de magia ficar mais forte, aquela mistura de flores com a leveza da chuva. E em seguida sua respiração próxima do meu rosto. Apesar de meus batimentos terem se afetado, e meus sentidos atentos carregando meu sono para qualquer lugar distante, eu me obriguei a permanecer de olhos fechados, mesmo sendo inundada pela mistura de cheiros que ele compunha.
–Olhe só para você – sussurrou, senti sua mão sobre meu rosto, não estava tão gelada quanto achei que fosse estar, mas tal ato apenas me deixou ainda mais agitada. –Tão serena dormindo – ele sorriu, seu hálito batendo contra a pele do meu rosto.
Me virei na cama, ficando de costas para ele, acordada demais para conseguir pegar no sono de novo, alerta o bastante para ouvir até mesmo seus passos ao redor da cama. O afundar do colchão me deixou tensa, eu senti o deslizar lento de sua mão sobre a minha costa.
Eu só queria ficar sozinha, não ouvindo suas palavras ensaiadas, na melodia perfeita da sua voz, para conservar a parte da minha alma que ainda estava distante o suficiente de sentir algo, e agora parecia mais próximo de ser completamente absorvida por aquela pessoa.
Senti seus lábios sobre a minha bochecha, em um carícia demorada com a leveza mais extraordinária de todas. Eu precisava me lembrar que ele havia me deixado sozinha, tinha que me fazer consciente de que se deixasse, ele destruiria cada parte significativa de mim. Me forcei a lembrar da sensação solitária que eu tinha sentindo na noite anterior, principalmente quando sua mão alisou meu braço levemente.
Seus lábios desceram para perto dos meus, e eu o senti depositar um selinho ali, antes de afastar completamente, deixando o alívio crescer dentro de mim. Parte de mim queria aquilo, mas a outra parte de mim, aquela que era racional, sabia que devia ficar esperta antes que fosse tarde demais para sair da armadilha.
Ao ouvir o som da porta batendo minutos depois, me permitir abrir os olhos para encarar as paredes ao meu redor, arrependida por ter me casado, me perguntando se havia futuro e uma escapatória mínima que fosse, onde eu ainda poderia ser feliz, sem ser com um imortal.
Era absurdo no final.
Me apaixonar.
***
Mais tarde naquele dia.
Estava escuro, praticamente escuro, de algum jeito o jardim não era mais tão frio assim para mim, e o único lado positivo de tudo isso era justamente poder apreciar a paisagem daquele lugar. Algumas daquelas flores só floresciam à noite, e eu pretendia ver isso.
–Zoe? – eu me virei para dar de cara com Eike, a última pessoa que eu esperava ver naquele dia. Uma pessoa que eu havia tolamente, acreditado poder construir uma amizade, eu estava errada.
–O que está fazendo aqui? – perguntei de forma rude demais. Eu não consegui controlar o tom de voz, a raiva só estava ali, unida a minha voz como se fizesse parte de mim desde sempre.
Eu havia conseguido enxergar a verdade por trás de tudo aquilo, eu era humana, uma amizade com um imortal, qualquer gênero que fosse tal "amizade", só poderia ser construída longe dos olhos de qualquer um. Eu seria apedrejada, eu no caso, e ele só ficaria olhando.
–Me desculpe – ele disparou. Eike se aproximou de mim, ajoelhando no chão, entre os poucos flocos de neve que ainda pairavam ali. –Mas Ezra era quem tinha que defender você, o que diriam se fosse eu – eu só arquei uma das minhas sobrancelhas para esse papinho ridículo dele. –Mas com certeza eu devia ter feito algo, mas eu só percebi quando era tarde demais – muito conveniente eu acho.
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Cetro de Gelo - O Canto do Lobo Branco
FantasíaZoe Bellum é a filha adotiva do general do Clã do Inverno. Como humana, ela sofre preconceitos por parte de quase toda a sociedade do clã desde a sua infância. Mas quando o terceiro príncipe do Clã do Inverno se vê no meio de uma fofoca maldosa sob...