O sexo e a cidade

85 4 4
                                    

Decidi comprar uma casa em Nova York. Um apartamento que me custou uma fortuna, mas acho que, no final das contas, foi de bom merecimento. Comprei ontem, e hoje já estou nela. A comprei mobilhada, o que me permite levar apenas as roupas e bom, não ter trabalho de ter bom censo e não escolher cores erradas ou coisas do tipo. A comida vai ter que ser comprada por mim e eu terei que me virar com o resto que aparecer. Michael me deu um laptop de presente e me fez prometer escrever e-mails para saber como ficarei. Ainda não sei quanto tempo ficarei aqui, mas, julgo que talvez, tenha que esperar e não poder sair em menos de uma semana. Estou consciente, ou menos que isso: ciente.

Abro a porta, a escancarando até ela se encontrar com a parede. Volto para o corredor e arrasto as malas para dentro do lounge. As solto no chão, suspirando tenso.

...

"Querida Nova York,

você ainda é a mesma desde a primeira vez que pisei aqui. É como um veterano de guerra: não perde hábitos. Pelo contrário, faz parecer que a cada minuto absorve mais e mais hábitos ovos. Você é fumante, alcoólatra, viciada em viver. Cosmopolitana. E parece, que o Amor anda com você. Correm para um lado ou outro. Eu não esperava nada de você. E ainda não espero."

Enviado em 27/07/2020 as 10:35 para mitch.pessoal@outmail.com

...

No jantar, decidi comer sorvete com calda de morango. Pelo visto, ainda não estou afim de elaborar pratos e passar a tarde toda me cansando para depois comer – e ficar mais cansado ainda. Deixei o pote vazio na pia e segui para o quarto. Abri minhas caixas com vinis - que foram roubados da gravadora por Michael (alguns são até de outras) - e vasculho buscando um para me fazer dormir. Acho o de HAIM - Days are gone - e o coloco para tocar. Deito na cama e admiro a janela. A rua está silenciosa; Como meu coração. A lua está brilhante. A música está baixa. Talvez eu deva dormir, esperar algo de bom e ver no que dá.

...

Quando acordei, foi devido a uma batida entre dois carros. Aconteceu na rua logo abaixo do meu nariz. Um dos carros ainda foi prensado contra um poste, que caiu e esse, no qual, fornecia energia ao prédio. Fiquei sem energia. Desde às 05:00 da manhã não pude dormi mais. Isso só pode ser um sinal. Essa cidade não gosta de mim ou apenas prepara o pior para eu ver, justo quando dou mais uma chance a ela. Não tem nenhuma cafeteria aberta ainda - de acordo com meu navegador - e minha fome está como a de um domingo familiar. Não comprei nada para um café da manhã. Tudo deu errado, concluindo.

Já vi ambulâncias - inúmeras -, já vi carros com alimentos e a última novidade do momento é um carro de transportadora que acaba de chegar no prédio. Observo-o. Um cara salta dele e vai para a parte traseira do carro. Ele some dentro. Mas logo aparece, apenas com um envelope em mãos. Ele entra no prédio. O interfone toca. Corro para atender.

- Sr. Styles? - Pergunta o porteiro, na outra linha.

- Eu.

- Tem carta para o senhor... você quer que eu mande o entregador levar aí?

- Claro.

- Como você consegue ligar?

- Reservas. Ele já entrou no elevador. - Responde, desligando.

Em alguns segundos, ele chega. Toca a campainha. Saio do sofá e corro para atendê-lo.

Ao abrir a porta, dou de cara com um cara alto, preto e com um lindo sorriso de jogador de basquete - o que transparece o pedaço de pano em sua cara.

- Sr. Styles?

- Eu.

- Correspondência. Assine aqui.

Assino e pego a carta. Dou bom dia.

Rasgo o envelope imaculado e a abro. Puxo o conteúdo e o desenrolo, começando a ler.

"Harry,

soube que se mudou para a cidade que nunca dorme.

A chamo assim por que aparece em qualquer ferramenta de busca. Ela nunca dorme.

Espero que você esteja bem. Esteja curtindo algo - ou alguém. VOCÊ SABE QUEM não apareceu, não deu notícias e parece que sumiu do mapa? Ela (digo, ALGUÉM) não apareceu.

Você ainda tem algum vestígio do ferimento?

Deixou de mentir sobre tudo?

Ainda quer passar um dia comigo?

Bom, espero que esteja bem.

Estou mandando um "mega, fofo e singelo abraço - mega "bro" masculino" para você e toda a sorte possível nessa nova vida.

Com "amor masculino"

Joe.

A campainha toca. Não estou esperando ninguém. Será que é Joe? Ou pior, Taylor...

Corro para atender.

A pessoa na porta não passa de um entregador.

-Sr. Andrew? Por acaso foi você que pediu um monte de compras.

Franzo o cenho e boto minha cabeça para fora do corredor. Limpo.

-Minha geladeira está vazia... Se eu dizer que sou o Sr. Andrew, por quanto você me vende essas compras?

...

A melhor barganha na vida, é saber barganhar.

Fiz minhas compras sem nem sair de casa e nem precisar escolher os itens.

Fecho a porta e guardo a carteira no bolso. Arrasto-as para perto da geladeira. Abro a geladeira e me surpreendo ao ver a luz ligada. Sorrio de alegria e saio saltitante até a janela. A empresa cuida do poste e tudo parece voltar ao normal.

Bom, quem disse que reclamar tanto resolve alguma coisa?

Mas, nesse caso, eu deveria pensar que, após a carta de Jay, tudo voltou ao seu devido lugar.

Obrigado, santo Jay.

A campainha toca. Após o dia movimentado, não espero mais nada. Destravo a magnífica maçaneta que - parece complicada demais das outras partes do mundo. Ao terminar, abro a porta. E vejo a cena mais terrível do mundo acontecer comigo, outra vez.

- Taylor?

Ela sorri e passa a mão no cabelo, o desembaraçando batendo suas botas pretas no assoalho.

Escutamos um estrondo, e logo em milésimos de segundo, a luz se esvai.

Um terrível presságio.

"Ah, se essa cidade soubesse que ando fumando em cantos misteriosos, becos com saída e ando ficando coagido por uma pessoa em especial.

Você está pensando o mesmo que eu?"

Enviado em 28/07/2020 as 19:48 para mitch.pessoal@outmail.com

31 de 1989Onde histórias criam vida. Descubra agora