XXXI. Hayley

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A entrada do abrigo jamais me causou todas as sensações que eu senti ao pisar ali naquela manhã. Embrulho no estômago, taquicardia e suor excessivo em minhas mãos.

Eu estava nervosa, apavorada! Eu não me importava em sofrer as consequências, não me importava comigo, mas o destino de uma garotinha de três anos estava na linha de tiro, uma garotinha tão especial... Minha filha!

A filha que eu tive sem saber, sem esperar, sem sequer sonhar que viria. Recebi esse presente e agora corria o risco de perdê-lo. Eu não ia permitir, me recusava a aceitar que Matthew arriscaria a minha família só pelo prazer de me controlar novamente.

Não, não. Eu não vou permitir.

Henry estava certo, eu não podia fugir. Eu não precisava fugir. A ideia de me tornar mãe assim ainda estava sido absorvida pelo meu cérebro, mas a parte de mim que já se identificava mãe, se recusava aceitar que essa era a lição que eu estaria deixando para Anne.

Devo ensiná-la a ser corajosa, a não fugir. Devo ensiná-la a confiar e acreditar que haverá pessoas que a amam para protegê-la. Eu já tinha cometido muitos erros e eles tinham me ensinado muito também, mas dessa vez não. Não aceitaria outro erro, os que eu já tinha cometido bastavam.

Respirei fundo, tentei ao máximo me acalmar, e entrei no prédio imponente diante de mim. Caminhei rápido entre os corredores, buscando a sala da minha chefe, a única pessoa que poderia lidar com isso agora.

— Hayley? – ela parecia surpresa em me ver, talvez Matthew não tivesse dito nada ainda – Achei que só voltasse na próxima semana.

— Era o planejado, mas houve um imprevisto – falei tentando manter calma – Podemos conversar?

Ela me olhou sem entender, mas assentiu e me ofereceu um lugar pra sentar.

— O que aconteceu? – ela perguntou ainda confusa. Fechei os olhos, deslizei as palmas suadas de minhas mãos sobre o par de jeans que eu usava e respirei fundo – Hayley?

— Quero pedir que o caso da menor Anne, adotada por Henry Cavill seja reavaliado por outra assistente social. – declarei depois de reunir toda a minha coragem, recebendo um olhar confuso – Com urgência.

— Do que está falando, Hayley? – ela perguntou chocada – Designamos você porque conhecemos o seu currículo e acreditamos na sua capacidade de decidir. Acha que a criança está sendo negligenciada?

— Eu não estou questionando minha capacidade e não há a menor chance dela estar sendo negligenciada, ela é perfeita e Henry é um pai incrível! – falei – Mas há conflitos de interesse – expliquei imediatamente – Henry e eu crescemos juntos, éramos melhores amigos de infância e eu... Bom, quando fui designada ao caso, nós estavamos sem contato há vinte anos, briga feia na adolescência, não nos falamos desde então.

— E não se incomodou em falar nada disso antes?

— Como eu disse, estávamos afastados e eu não tinha intenção de retomar a amizade – suspirei – Eu estava sendo profissional, mas... Sei que errei e é por isso que estou aqui.

— Isso é sério, Hayley. Como posso confiar que não vai fazer isso outra vez? – ela questionou e eu a olhei séria, repensando pela última vez a decisão que eu tomei horas atrás.

— Não vai precisar – falei sorrindo fraco – Eu me demito.

O silêncio sepulcral na sala chegava a ser incômodo. Ela me olhava como se eu estivesse louca e eu a olhava como se perguntasse o que havia de errado.

— Você o quê? – ela perguntou lentamente e eu suspirei mais uma vez

— Me demito. Efetiva e imediatamente. – reafirmei com uma calma que não era minha. Talvez eu estivesse mesmo um pouco louca.

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