Capítulo 30

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Eu estava no quarto de João, minhas duas mochilas foram colocadas no canto do cômodo. Meu amigo estava sentado com as pernas cruzadas na cama, enquanto eu me encontrava no colchonete que ele arrumou para que dormisse essa noite ali.

Quando saí de casa, fui com a própria roupa do corpo. Ainda estava de pijama quando peguei um táxi e fui até o meu amigo. Meu corpo tremia, reflexo do que havia acontecido a poucas horas por causa de Paul, e eu não conseguia tirar aquela sensação.

Contei tudo a João, mesmo envergonhado. Falei sobre a desconfiança que eu já estava tendo em relação a Paul há dias, e que aquela noite foi a gota d'água para mim. Ele não disse uma palavra enquanto eu contava, se manteve imóvel com as mãos no queixo e me olhou fixo depois de ter revelado toda a história.

Sua voz saiu dolorosa.

— Ele tentou te... Droga, Charlie. Que babaca. Isso foi assédio, não, foi pior. — Ele passou a mão nos cabelos ruivos e meu corpo se encolheu. Aquela palavra deixou o ar pesado, mais do que já estava.

— E-eu não sei se chega a ser isso, eu não sei, eu...

— Mas foi o que aconteceu. Filho da mãe. — João estava com muita raiva, seu maxilar estava tenso e ele fechou os pulsos. — Se um dia eu ver a cara desse cachorro, os Deuses sabem... Os Deuses sabem.

Meu amigo abaixou a cabeça.

— Me desculpa por isso tudo. — falei, sem saber o que dizer de fato. João não deveria estar daquela forma por minha causa, ele não tinha nada a ver com isso. — Eu só falei com você porque seria estranho dormir na casa da Sam, os pais dela... Sabe. — Dei de ombros.

— É, são seus sogros. Eu entendo, tá tudo bem. Não tem que pedir desculpa não.

Balancei a cabeça. Meu relacionamento com Sammy estava bom demais para eu surgir na porta da sua casa procurando abrigo. Não era essa a imagem que eu queria passar.

E João continuava com o semblante fechado de puro ódio.

— Que droga, era pra denunciar um filho da puta desses. Que ódio, bicho. Tu quer fazer alguma coisa sobre isso? Eu te ajudo.

— Não, não, eu não posso. — Abracei meu próprio corpo. Eu me sentia minúsculo. — Eu não... É só minha palavra e... Talvez seja loucura minha e...

— Não, Charlie! Cala a tua boca! — João desceu da sua cama rapidamente e se agachou para ficar na minha altura, sentado no colchonete. Ele segurou os meus ombros com força e me fez olhar para ele. — Tu não tem culpa de nada nessa história, então pode parar! Se tua mãe não tivesse chegado, acha que ele ia parar por ali? Ele ia te estuprar, caralho! A culpa é dele!

— Não fala essa palavra!

— Mas não tem outra palavra! Tu tem que aceitar pra entender que a culpa é só dele!

João estava tão abalado quanto eu. Seus olhos eram suplicantes e ele piscava várias vezes para se conter. Meus braços foram ao redor do estômago, pois eu me sentia enjoado.

O ruivo respirou fundo e fechou os olhos. Quando os abriu novamente, estava um pouco mais calmo.

— Me desculpa por gritar, não tô com raiva de ti, tô com raiva porque essas coisas acontecem e a gente nunca consegue fazer nada. As pessoas não acreditam quando a gente fala.

— É. — O bolo formado em minha garganta estava começando a se amenizar, mas ainda longe de acabar completamente. — Foi assim com o Jason.

— Como assim? — João se sentou no colchonete e estreitou os olhos para mim.

⚧ | Azul é a Cor do SilêncioOnde histórias criam vida. Descubra agora