Capítulo 46

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O resto do dia foi movido a beber a maior quantidade possível de água.

Depois de um almoço leve com uma boa quantidade de salada que João insistiu em preparar, além de algumas histórias que Fred contou sobre seu trabalho como segurança de um shopping center, estava na hora de me despedir dos meus amigos.

Marcos saiu do quarto apenas para tomar o mesmo líquido que tomei para melhorar a dor de cabeça, mas logo em seguida voltou para a se deitar. Aparentemente ele ganhou a competição de ontem à noite, o que resultou em uma ressaca ainda maior para ele.

Sammy estava no banheiro quando me despedi de João e Fred, mas antes de cruzarem a porta meu amigo mexeu nos bolsos à procura de algo.

— Quase esqueci de te falar! Fred tem um colega da empresa que é segurança de uma clínica e ele conseguiu o contato de um psicólogo popular, ele só cobra um preço simbólico de cinquenta reais.

João me passou um cartão branco com o nome Katiana Bernardi em letra azul e cursiva. Do outro lado, havia suas informações de contato e endereço.

— Ela tem boas recomendações. — Fred falou confiante, eu precisava esticar o pescoço ainda mais para vê-lo, o homem de pele negra parecia um jogador de basquete e a cabeça raspada ainda ajudava na visão atlética. Olhei para os dois com um sorriso tímido.

— Obrigado, gente. Vou ligar pra ela.

— É isso aí! Até amanhã, baixinho. — João bagunçou o meu cabelo e bufei, só porque ele era mais de vinte centímetros de altura do que eu. Era um absurdo.

Fechei a porta quando saíram e, quando me virei, Sammy estava encostada no corredor que dava para o meu quarto, com sua mochila em um dos ombros. Quase pulei de susto ao vê-la.

— Há quanto tempo você saiu do banheiro?!

— O suficiente para saber sobre a psicóloga e conferir se tu vai ligar mesmo! — Ela andou rápido até mim e pegou o cartão das minhas mãos para conferi-lo. — Você vai ligar, não é?

— Eu... Vou, claro. — Na verdade, eu não tinha certeza.

Eu sabia que precisava de terapia, muita coisa em mim estava fora do lugar e um psicólogo me ajudaria a pôr tudo em ordem. Contudo, eu nunca havia ido em um. E se fosse uma pessoa conservadora? E se tratasse minha transgeneridade como uma doença mental? E se...

— Tu tá criando mil e uma teorias na tua cabeça, dá até pra ouvir daqui! — Sammy estalou os dedos em minha direção. — Vamos fazer um acordo: nós vamos morar juntos se tu fizer terapia.

Abri a boca para protestar, mas me contive. Era uma ideia justa. Afinal, eu seria uma companhia melhor morando com Sam e indo ao psicólogo.

A garota ergueu a mão no ar para firmarmos o acordo, e o selei.

— Ok, eu vou ligar essa semana.

— Muito bom. — Ela empinou o nariz, orgulhosa. Eu adorava quando fazia isso, era engraçado e fofo.

Nos despedimos e a casa ficou silenciosa, com Pedro e Ramón trabalhando e Marcos ainda destruído no próprio quarto.

Tentei me distrair o máximo possível mexendo no celular, mas até isso estava entediante. Procurei o perfil do Jason e ele não postava algo novo há dias. Eu também não o via pela faculdade. Contudo, eu não podia questionar alguém sobre isso, pois eu já havia deixado claro que não queria mais contato.

Também não adiantava falar com ele, caso eu conseguisse. O que ele diria para mim? Para sair de casa e encher a cara com ele?

Eu repetia para mim mesmo que fiz a escolha certa ao afastá-lo.

⚧ | Azul é a Cor do SilêncioOnde histórias criam vida. Descubra agora