Capítulo 49

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Eu estava irritado.

Por quê? Eu não sabia. Mas havia uma angústia interna dentro de mim que me dava vontade de resmungar alto toda vez que um cliente demorava mais do que cinco segundos para responder a alguma pergunta. Ou quando demorava uma eternidade para passar um compra.

Foi o caso da senhora que estava procurando a senha do cartão de crédito em um papel dentro da carteira. Primeiro: já era um absurdo colocar uma senha privada de algo com limite de crédito em um papel. Segundo: se ela ia precisar da senha, por que não deixou o papel de forma mais fácil para pegar na hora da compra?

- Só mais um minuto, minha linda! - A mulher deu uma risada fina e irritante e eu me controlei para não revirar os olhos. Nem estava mais incomodado por ela me tratar no feminino, só queria que ela fosse embora. Já havia uma cliente atrás dela esperando.

Jennifer estava ocupada fazendo a reposição de algumas peças em promoção, e eu não queria incomodá-la pedindo ajuda.

Por fim, a mulher desistiu de procurar o papel e disse que arriscaria uma sequência de números. Ela digitou e a máquina avisou que a transação foi aprovada.

Ela sabia a maldita senha esse tempo todo!

Tentei me controlar e respirei fundo antes de atender a próxima cliente. Ninguém tinha culpa da minha irritação, aparentemente sem motivo. Ou melhor, motivos eu possuía aos montes, mas nenhum em específico naquele dia. Talvez fosse a ansiedade por ir à clínica da psicóloga no dia seguinte.

- Oi, bonito! - Leo apareceu atrás de mim, procurando algo pelas gavetas do caixa. - Tem grampeador por aqui?

- Tem sim. - Abri uma das últimas gavetas e peguei o objeto para ele.

- Bah, tu é lindo! Valeu! - Ele sumiu de volta para a área reservada. Leo gostava de chamar todas as pessoas de bonitas e lindas. Isso era engraçado quando ele ocasionalmente atendia um cliente que era feio, mas a expressão parecia não ter mais sentido de beleza para ele.

Terminei de atender a última cliente e levei minha mão até o meio da barriga, estava sentindo um desconforto na região. Tateei com os dedos e notei um leve inchaço.

Então era por isso que eu estava irritado.

Eu tentava ignorar o fato de que a menstruação existia na minha vida. Quando ela chegava, eu evitava pensar nisso o máximo possível e tomava remédios para cólica antes mesmo da dor se instalar.

Contudo, meu humor estava cada vez mais desequilibrado. Isso deveria ter impactado os meus hormônios, pois eu provavelmente estava de TPM.

Que coisa mais insuportável. Por que eu tinha que nascer em um corpo que passava por isso?

Era como um aviso mensal programado automaticamente para me lembrar de que eu tinha o corpo de uma garota.

O relógio deu quatro horas da tarde em ponto e Jennifer me cobriu no caixa para fazer meu intervalo, e eu agradeci aos céus por isso, pois queria ir ao banheiro conferir se estava tudo bem ou se eu já precisava de um absorvente. O recomendável seria colocar logo um, mas eu não faria isso no banheiro masculino de forma alguma.

Caminhei até os toaletes torcendo para ser só uma dor pré-menstruação. Felizmente era, não havia nada demais.

Mas minha mente estava um turbilhão de pensamentos. Todo mês era a mesma coisa, e Sammy chegou a sugerir que eu tomasse anticoncepcionais de uso contínuo para nunca menstruar, mas a ideia de colocar hormônio feminino no meu corpo era ainda mais perturbadora. Eu já tinha o suficiente, não precisava demais.

⚧ | Azul é a Cor do SilêncioOnde histórias criam vida. Descubra agora