Capítulo 13

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Sara estava deitada em uma grama escura, descalça e sem roupa. O coração palpitando e a respiração descompassada. Ela já não podia controlar as incontáveis lágrimas que eram derramadas de seus olhos.
-Papai, por favor... - Ela murmurou numa voz trêmula. - Me ajude. Eu estou cansada.
As raízes surgiam do solo, rastejando até ela como cobras peçonhentas, prontas para atacar. Quando estavam prestes a abocanhá-la, Sara fechava os olhos, com medo.
-Vovó, por favor... - Ela volta a dizer, chorando - Me ajude. Eu preciso de você.
Os soluços ecoavam num vazio, enquanto pouco a pouco as raízes se enroscavam ao corpo desnudo da menina, lhe estrangulando aos poucos e tapando sua boca.
-Ajuda.

Sara se contorcia na cama, vibrando com energia negativa por conta dos medicamentos em seu corpo.

(Inicie a música)

Ainda na enfermaria, Amina tenta acalmar Theresa.

-Precisamos contar. - Theresa dizia - Não podemos guardar esse segredo.

-Você sabe que não podemos fazer isso. - Amina segura as mãos da irmã, juntando-as perto de seu peito - Não podemos fazer isso.

-Se ela for a primeira elemental... se as visões estiverem certas, precisamos avisá-los. Precisamos impedir a guerra. Precisamos impedir Sara.

-Não podemos. - Insistiu Amina - Você se lembra? "Aqueles que tentarem impedir a profecia quando chegar a devida hora, estarão fadados ao desespero e sofrimento." - ela estava séria - Está escrito no manuscrito. Não podemos ir contra a vontade dos elementais, muito menos do destino. O que tem de acontecer, vai acontecer. Não há nada que possamos fazer sobre isso. E se dissermos aos outros, eles irão sacrificá-la.

-Você não viu o que eu vi. - Soluçou Theresa - Cadáveres espalhados no jardim. Ela vai causar tudo isso.

-Você não tem certeza disso. Não viu a cena toda. Não pode tirar essas conclusões precipitadas, sabe disso. Se nos envolvermos, seremos punidas pelo universo e sabe-se lá o que pode nos acontecer. Não vê que os tempos de mudança chegaram?

-Amina, estou com medo. - Ela abraça a irmã com força - Não estou pronta.

-Eu também não estou, mas iremos descobrir uma forma. - Ela a abraça de volta - Agora, limpe o rosto. Ninguém pode suspeitar sobre nada.

Theresa passa uma das mãos sobre o rosto, enxugando os resquícios molhados das lágrimas. Ela funga, antes de tomar sua postura anterior, gélida e profissional.

-O que viu no menino? - Ela pergunta olhando para Fintan atrás de Amina, ainda inconsciente.

-Você falou sobre os mortos no gramado nas visões da Sara... - Amina olha também em direção a Fintan - mas nas visões de Fintan eu não consegui ver quase nada. Tudo estava muito embaçado. Havia gritos e um cheiro adocicado no ar. Ele abraçou alguém, como se estivesse consolando por algum acontecimento.

-Talvez estivessem no mesmo cenário. - Disse Theresa tendo um flash de ideia - Talvez Fintan estivesse em um lugar diferente, mas no mesmo momento. Gritos e mortes não podem ser coincidência.

-Eu realmente não sei dizer, mas acho improvável. - Amina cruza os braços, pensando e refletindo sobre tudo o que vira no menino - Esse menino tem muita perturbação dentro de si. Faz sentido ele estar deixando todos abalados. Está sugando energia demais, remoendo várias coisas. Tudo misturado e ao mesmo tempo. Se Althaia estiver certa pelo menos sobre as trocas de energia, talvez Sara tenha sido a fonte, e Fintan a potência maior.

-Não é bem uma surpresa. - Theresa parecia conformada - Sendo filho daquele brutamonte não poderíamos esperar menos. Você acha que ele fez algo com Fintan?

- Sebastian? Eu não sei. Talvez sim. Talvez não. Como eu disse, não pude ver nada, só o escutei gritar ao fundo, mas não entendi o que dizia. Ah! E havia alguém murmurando uma canção.

-Alguém que lhe acalmava quando o pai ficava bravo. - Tentou Theresa. - Alguém que certamente se foi. Que levou o último resquício de calmaria dele.

-Há uma grande chance.

E a porta da enfermaria se abriu com força. A mãe de Kai estava inconsolável, choramingando enquanto andava até o leito do filho. Cecília veio logo atrás, os olhos fundos e vermelhos, denunciando que chorou pelo caminho todo. Alcançou a mão de Sara quando chegou perto da cama e deitou a cabeça ali. Sara tinha um curativo na testa, resultado do desmaio na floresta.

Félix observava da janela, camuflado no disfarce de Corrupião, e vigiando todos os acontecimentos, pronto para voar e contar a Mavka e os outros seres da floresta. Estavam levando a culpa e agora estavam ameaçados e sem a pessoa que mais depositaram esperança, Sara.

-Por favor, senhoras, me acompanhem até o escritório da diretora. - Disse uma das enfermeiras ao entrar no salão. - Ela quer vê-las.

Nenhuma das mães relutou, abaladas demais pela imagem mórbida de ver os filhos deitados inconscientes num leito de enfermaria. Apesar da cena ser familiar para a senhora Celeste Charis, mãe de Kai, ainda sim lhe causava grande desconforto, com medo de perder mais uma de suas crianças. Cecília estava morta por dentro, sentindo finalmente o que Sara tentou tanto lhe explicar: ficar sozinho no mundo parecia devastador.

Ao deixarem o local, Theresa e Amina voltam a indagar coisas.

-Sei que não devemos interferir em nada, mas... - Theresa encarava a porta de entrada - não aguento ver essas pessoas assim. Se pudéssemos acordá-los de alguma forma.

-Temos que ser cautelosas nessa situação. Dissemos a Althaia que iríamos ajudar, e é isso que iremos fazer, mas depois vamos embora. - Amina caminha até Fintan - Vamos tentar bloquear essas lembranças de Fintan, amenizar o sofrimento dele. Se der certo e eles acordarem, lucro. Mas do contrário, iremos dizer a Althaia que não há o que fazer. Eu não quero estar aqui quando Sara acordar. Não sei se posso segurar minha boca e não dizer nada à ela. Está de acordo?

-Estou.

Amina coloca uma das mãos de volta na testa de Fintan, e Therese se junta à irmã, tocando o peito do menino. Elas começam a murmurar palavras quase inaudíveis, como um pequeno poema cheio de rimas na língua antiga. Fintan abre a boca para suspirar, e Amina tenta não bloquear, mas deixar escondido e difícil de lembrar as memórias mais traumáticas. Apesar de saber que algo ruim havia acontecido recentemente, não quis arriscar e esconder essa memória em específico, deixando que Theresa amenizasse a dor no peito, o medo e a angústia.

O corpo de Fintan estremeceu e se arrepiou. Ele se contorceu e praguejou coisas ainda num sono profundo, gemendo agoniado. A pele começava a esfriar e a vermelhidão sumia.

-Torça para que eles acordem. - Amina disse depois de terminarem o que tinham feito. - Vamos embora, antes que algo aconteça.

E rumaram para o lado de fora sem se despedir de ninguém. Mais tarde mandariam um pergaminho explicando à Althaia o que haviam feito com Fintan, esperando uma ótima recuperação.

Mudanças Noturnas: A Filha da OrnaOnde histórias criam vida. Descubra agora