Capítulo 4

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"A terra chama aquela que primeiro nasceu para tomar o lugar que lhe é seu por direito. A profecia agora começa e os perigos se espreitam pelos ares. Confie apenas naqueles que lhe acompanharão durante essa longa jornada. Não olhe para trás, pequena criança. Nada ali lhe pertence mais. O que aconteceu, já aconteceu, e o que deve acontecer está nas mãos do destino."

Sara se levanta num impulso, sentindo o coração pulsando rápido e alguém lhe observando pelas costas, com os olhos pregados em sua cabeça. Sem virar-se, observou a mãe deitada no colchão no chão, ainda num sono profundo e tranquilo. Por cima do ombro, tentou enxergar qualquer sombra que pudesse lhe fazer mal, logo lembrando-se da invasão que sofreu a três noites atrás e que ainda lhe assombravam os pensamentos. Por fim, encarou o canto do quarto de uma vez, não vendo nada além de um vaso de plantas decorativo.

Mas o medo parecia não ter desaparecido. O cochicho de seu sonho ainda parecia incomodar a orelha e lhe tirava a concentração. Nunca nenhum sonho havia parecido tão real como aquele, apesar de não se lembrar de nenhuma imagem em específico. Ela tinha a estranha sensação de que alguém realmente havia dito algo em seu ouvido e então desapareceu.

Pensou em voltar a dormir, mas agora com os olhos acostumados com a luz que invadia o quarto, vinda do lado de fora, não poderia fazer outra coisa a não ser se levantar. Resmungou enquanto caminhava em direção ao banheiro no final do corredor, e reclamou  ainda mais quando encontrou plantinhas nascendo de dentro do ralo da pia. Alguns insetos também estavam incrustados na janela fechada do ambiente, e Sara jurou para si que eles pareciam enxergá-la de alguma forma.

Saiu do banheiro dando de cara com a mãe recém acordada e com os cabelos desgrenhados.

-Acordei e não vi você. Achei que tivesse fugido. - Disse ela num tom rouco e ajeitando uns fios.

-Fugir? E para onde eu iria exatamente? - Debochou Sara num mau humor matinal.

-Você é criativa. Tenho certeza que se daria muito bem na floresta ali de trás.

-Acho que não preciso ir até ela, já que ela veio até mim. - Reclamou a menina irritada - Tem plantas em todos os lugares, e bichos nas janelas. Esse lugar é uma espelunca.

-Sara, não comesse com suas reclamações logo de manhã. Eu não estou tão acordada para lhe responder à altura.

-Mas mãe, você não precisa me responder à altura. Só precisa me levar para casa.

-Já tivemos essa conversa ontem. - Cecília resmunga voltando para dentro do quarto com a roupa amassada.

-Eu sei, mas isso não significa que aceitei a situação. Não é justo você poder voltar para casa, no conforto, e eu ficar aqui. - Sara vai atrás da mãe.

-E quem disse que voltarei para casa?

-E para onde iria?

-Althaia arranjou um lugar para que eu ficasse enquanto você estuda. Ela não acha seguro que voltemos para casa. Pelo menos não agora.

Sara ficou estática, se remoendo.

-Mas, - Ela parecia aflita - e as coisas do papai? Os livros? O escritório? As nossas plantinhas? Fotos...

-Oh, Sara. - A mãe a encarou com pena - Não podemos trazer tudo, mas posso pedir que tragam algumas coisas.

-As plantas irão morrer se não cuidarmos delas! Você sabe que o papai tinha um método específico para que elas crescessem! E depois daquele homem estragando algumas delas, não podemos abandonar as outras!

-Por que está tão preocupada com as plantas? São apenas plantas.

-Não são apenas plantas. São as plantas do meu pai!

Mudanças Noturnas: A Filha da OrnaOnde histórias criam vida. Descubra agora