30. Confissões bêbadas

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"A raiva é apenas um modo diverso de chorar."

Mia Couto

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O corredor que liga a escadaria das masmorras a do porão está perfeitamente quieto. Que horas são? Onze? Talvez um pouco mais. A reunião dos monitores demorou mais do que eu esperava, se bem que começamos bem depois do horário também... Oscar estava uma pilha de nervos por conta disso, eu só queria que acabasse logo para que pudesse voltar para o dormitório e desmaiar na cama.

Me arrasto pelo corredor escuro. Estou quase chegando na escadaria do porão quando noto alguém parado no corredor, apoiando-se na parede.

Quase passo direto, mas sinto que seria cruel não perguntar nada. Por mais que eu esteja cansada, a pessoa pode estar precisando de ajuda. E não me custa nada também.

Me aproximo.

Não consigo ver direito, a iluminação aqui é horrível, mas parece um garoto.

Não, com certeza é um garoto.

— Ei, tudo bem aí?

Ele dá uma risada estranha ao se virar para mim.

Macmillan.

Como se meu dia já não tivesse sido ruim o bastante.

— Ora, ora, se não é a Bard. – ele diz, numa voz meio arrastada.

Rolo os olhos, porque eu realmente não estou com saco para isso. Não hoje.

— Deve estar ótimo se está fazendo gracinhas.

— Por que veio atrás de mim, Bard? – provoca ele.

— Eu não... – começo, mas sei que é inútil – Só estou voltando pra minha comunal, estou cansada e não vou discutir com...

Eu me interrompo.

Alguma coisa aconteceu.

Ele está com uma aparência péssima, a camisa branca está amassada, com alguns botões desabotoados, o nó da gravata frouxo e o cabelo, sempre impecável, bagunçado.

Parece que foi atropelado ou...

— Isso é um machucado? – pergunto, notando uma mancha vermelha no canto de sua boca – Quem...?

— Quem fez isso comigo? – ele ri – Por que se importa?

Sinto cheiro de cerveja amanteigada e... alguma outra coisa, mais forte e definitivamente alcoólica.

— Não me importo, eu só... não acredito que estava enchendo a cara enquanto eu...

Enquanto eu pensava se tinha acontecido alguma coisa contigo. Não digo.

— Enquanto você o que, Bard? – ele indaga, erguendo a sobrancelha com um risinho debochado.

Uma torrente de raiva inunda minhas veias.

— Enquanto eu salvava sua pele inventando desculpas pra você! – vocifero – Duas vezes! Na aula e na reunião!

— Pelo menos conseguiu o meu Excede Expectativas?

— Não. Consegui um Ótimo.

— Essa é a minha sabidinha! – ele ri, meio grogue.

— Argh, como consegue ser tão cara de pau?

— Você não negou.

— Quê?

— É minha sabidinha.

O abismo que há entre nósOnde histórias criam vida. Descubra agora