Capítulo 11: Um espaço no meu coração

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Eu queria poder apagar as lembranças das últimas horas da minha memória porque eu não sei se serei capaz de viver com elas.

Por todo caminho de volta ao Reino, tenho a mão em meu colar atrás de algum resto de força interior que exista em mim. Me sinto, no entanto, em um estado de choque tão intenso que as únicas coisas que passam pela minha cabeça são as mesmas cenas repetidamente:

Minha visão ficando preta. De repente, acordando num celeiro. Em volta, várias pessoas armodaçadas e amarradas. Siddiq, Tara, Henry, Enid e outros coitados que não sei o nome. A felicidade quando dois homens vieram em nosso auxílio, e lutamos pela liberdade apenas para sermos derrotados novamente por mais Sussurradores. Mordaças fora para ouvirmos os gritos agora. Desespero ao ver cada um ser morto lentamente na minha frente. Uma faca no pescoço, e de repente, cabeça e corpo estavam separados. Sangue. Gritos. Lágrimas.

Na minha vez de ser morta eu tive medo. Queria dizer que não, mas tive. Não estava preparada mesmo achando que estava pronta para sair desse mundo escuro. A faca estava em meu pescoço, e eu já podia sentir sangue escorrer enquanto a dor, ainda leve, começava, quando Enid grita que eu estava grávida. Ingênua Enid, como se fosse fazer diferença.

Mas fez.

Alfa mandou a pessoa que iria me matar parar, e disse que eu poderia ser mais uma testemunha. "Para você ver como sou misericórdiosa" disse para mim.

Em seguida, mataram Enid.

Ainda tenho sangue dela no meu rosto.

Olho ao horizonte mas não vejo o céu.

Em minha cabeça vejo Henry, também morto. O pobre corajoso estúpido apaixonado Henry.

- Beba um pouco de água. - diz Daryl ao meu lado. Ele estava entre mim e Carol, mas ninguém falava um palavra.

Apesar de não querer, aceito.

Chegamos no Reino no início da manhã, e quase não podia acreditar que horas atrás eu estava ali me divertindo como nunca depois dos últimos anos. Mas, o conto de fadas sempre tem fim.

Sem conseguir suportar perguntas, mais lágrimas ou pessoas ao meu redor, tento sair de perto de todos que se aglomeravam no portão de entrada. A ultima coisa que vejo é Ezekiel abraçando Carol aos prantos. Sufocada, saio sem nem ver para onde estou indo, mas sinto que estou sendo seguida.

Daryl pega minha mão com delicadeza e me puxa para algum lugar. De repente, estou sentada na cama em um quarto com as paredes beges. Apenas uma cama, uma mesinha e um guarda-roupa. Nem sei direito como foi o caminho até ali.

Vejo Daryl pegando um pano e mergulhando num vaso que estava na mesa. Ao se virar para mim, se ajoelha na minha frente, e começa a limpar o sangue do meu rosto.

É algo tão delicado que sinto afeto no seu gesto. Cuidado. Carinho.

Olho em seus olhos e por um segundo sinto que as coisas vão ficar bem, mas tenho medo de me apegar a esse sentimento.

- Sinto muito. - diz ele com sua voz rouca.

- Eu também. - digo quase num suspiro.

Carol. Não consigo imaginar sua dor nem por um minuto. Eu mesma estava achando difícil assimilar a perda de Henry.

Tara. Mal a conhecia mas foi gentil em me aceitar em Hilltop. Nunca agradeci propriamente. E agora, não teria chance.

Enid. Tão jovem, tão amiga, tão boa e disposta a ajudar. Alguém que eu poderia realmente construir uma amizade. Fomos tão felizes na feira, juntas.

Minha luz no fim do mundoOnde histórias criam vida. Descubra agora