MALLORY CIRCE
7 ANOS ATRÁS
Os seus corpos estavam mortos antes mesmo de se chocarem ao chão.
Não sei como ou quando aconteceu, só sei que minha boca está aberta e um grito silencioso e as lágrimas caem abundantemente contra as minhas bochechas. Estavam mortos.
Meu corpo está tremendo tanto que Mich tem que me segurar para os meus joelhos não irem de encontro ao chão. Seus corpos caem tão rapidamente que o primeiro instinto que tenho é correr em direção deles, não posso, no entanto. Michael coloca a mão sobre minha boca e me puxa mais para o canto onde é mais escuro. Onde ninguém nos vê. Não reajo meu corpo estava tácito e eu estava em choque demais.
Olho para a minha irmã que está com os olhos arregalados e com as mãos fechadas ao lado de seu corpo. Ela não chora. Não respira. Não se move.
Dora, não precisa segurá-la. Ela está parada, parecendo uma estátua. Parecendo um anjo caído.
Um corte que começa do seu ombro rasga toda a sua roupa até a metade de sua coxa e um fino filete de sangue escorre em seu supercílio. O cheiro de ferro envolve minhas narinas e um bolo se forma em minha garganta e a ânsia sobe por minha garganta.
Me pergunto se ela está com dor, ela não se mexe. Não mexe.
Meus músculos doem tanto que tenho a impressão que vou desabar e que todos eles vão quebrar. Mas a dor interna me corrói mais do que a dor externa.
Uma dor se sobressai da outra. É possível isso? É possível que os seus sentimentos doerem mais que a dor física?
— Vamos! — Dora diz sussurrando ao mesmo tempo nos puxando para o carro, chorando — Ora bambini!
Sua mão envolve a minha e me puxa para o carro, Mich destrava o automóvel e guarda a sua arma no cós de sua calça. Vejo que está todo machucado também. O último vislumbre que eu tenho é dos dois corpos caídos no chão com uma poça de sangue ao redor deles e um tiro certeiro na testa dos dois, as pessoas que atiraram já foram embora há muito tempo do galpão escuro enquanto nós, acidentalmente, assistíamos tudo. Minha culpa.
Ainda me lembro do estampido dos seus corpos caindo ao chão. Ainda consigo ver uma última lágrima escorrer dos olhos azuis escuros da minha mãe e um último suspiro de medo do meu pai quando notou nossa presença. A última vez que ele nos viu. Minha mãe caiu igual uma bailarina, com toda a sua graciosidade até na morte. Meu pai... meu pai resistindo ainda, se arrastando ao corpo da sua linda amada. Mãe. Esposa. Namorada. Parceira. Ele viu o amor da sua vida morrer.
Eu quero gritar.
Eu quero chorar.
Eu quero parar de sentir isso.
Eu queria ter ido com eles.
Olho de soslaio para uma Chasina que está calada e encolhida no canto do carro quando eu entro. Mich engata o carro e voa para onde quer que ele esteja indo o ambiente fica em silêncio, Dora dando soluços pequenos enquanto Mich tenta não desabar na nossa frente. Todos em seu próprio luto. Éramos uma família feliz.
Eu estou chorando, silenciosamente, deixando as lágrimas rolarem por meu rosto. Chasina está calada, não consigo sequer ouvir sua respiração. Os cabelos pretos como penas de corvos caem em seu rosto pálido. Suas feições são neutras, mas os olhos... seus olhos são uma tempestade. Raiva, medo, choque, compaixão e dor transbordam por suas íris.
Aqueles olhos nunca mais foram os mesmos. Em algum momento adormeço com a mão de Dora enroscada na minha. Sua pele quente se envolve na minha, seu conforto me deixa um pouco mais calma. Mas aquela não é a mão de minha mãe. Não é o cheiro de jasmim e muito menos o toque calmo e delicado.
Ela sempre me tocava como se eu fosse uma boneca de porcelana. Afinal, eu era o seu bebê.
Mamãe estava morta e essa era a realidade. Eu nunca mais iria ver seus sorrisos largos e nunca mais iria gargalhar com as cócegas que o meu pai fazia. Doía. Eu sei que em algum momento a morte chegaria a todos nós, eventualmente, todos iríamos morrer. Mas meus pais... meus pais não mereciam aquilo.
— Eu juro... — sua voz rouca sussurrou ao meu lado depois de várias horas em silêncio. Horas. Muitas horas depois. Eu já tinha acordado. Dora disse que ela não bocejou uma vez ou piscou lentamente. Chasina estava fria, mais fria do que já era. Sua voz rouca ressoou por todo o carro como se fosse uma linda canção de ninar, o ronronado presente e até mesmo a raiva presente fez todos os pelos do meu corpo arrepiarem. Eu vi o momento em que Mich ficou tenso e Dora arregalou os olhos com a sua fala. Chasina depois desse dia nunca mais falou mais de uma frase inteira para quem ela não conhecia.
— O-o quê? — pergunto com a voz trêmula e rouca por conta da secura de minha garganta. Seus olhos cor de quartzo se voltam para o meu e me assusto com tamanha frieza que eles emitem. Eu estremeço.
E pela primeira vez na minha vida eu tenho medo da minha irmã.
— Eu juro que vou encontrar quem fez isso — ela volta a olhar para a janela, vejo que sua mão se aperta em volta do coro do banco do carro fazendo o nó dos seus dedos ficarem brancos e antes o que era sangue seco com as feridas já coaguladas, voltam a ser um sangue escuro escorrendo pelos nós de seus dedos. Suas unhas enterram na carne ferida e ela não parece notar. Eu arregalo os olhos — Nem que eu precise me matar no final. — diz por fim. A cicatriz semi-aberta de sua sobrancelha lhe dava um ar perigoso; mortal.
Ali eu fiz uma promessa junto com ela. Eu iria ajudá-la a encontrar quem fez isso.
Sangue por sangue.
Eu iria encontrar a pessoa que tirou de mim quem eu mais amava.
E iria fazê-la sentir a mesma dor que eu estava sentindo naquele momento. Não adianta matar aqueles que machucaram quem você ama. Você tem que retribuir o favor; tirar a coisa mais importante da vida deles.
Éramos uma família perfeita, mas o que aconteceu só nos fez ficar mais fortes. Não éramos mais fracas. Crescemos e essa promessa será comprida. Custe o que custar.
OFICIALMENTE AGORA:
BEM VINDOS AO MUNDO DE MADE IN HEAVEN
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MADE IN HEAVEN (FINALIZADO)
RomanceUma vez há sete anos atrás uma garotinha corria por sua vida. Aquela era a noite onde mil e um sonhos seriam destruídos. Onde a esperança seria extinta. E o medo se tornaria uma sombra constante. Sete anos depois de volta a Wilmington onde tudo com...