Capítulo 42

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Eu já não tinha mais uma noção perfeita de tempo, o céu de cores exóticas dificultava ainda mais distinguir o que é dia ou noite. Com base no que meu próprio corpo indicou, foram sete noites, sete vezes em que o sono falou mais alto, por isso chutava ter passado-se em torno de duas semanas.

Duas semanas desde o início do Weirdmageddon, e, ao contrário do que tanto desejei, as coisas apenas pioraram, a decadência fora veloz, a cada minuto contado nos ponteiros do relógio, a cidade afundava mais na lama de puro caos.

Vez ou outra eu conseguia ter acesso à única janela do quarto, onde em todas as vezes eu recebia uma visão ampla da pequena cidade que, cada dia mais, percebia o quão deteriorada se tornava.

Percebi, também, o quão horrível os prisioneiro estavam sendo tratados, e isso, infelizmente, incluía a minha família. Eram reduzidos à meros vermes inúteis, como o Cipher sempre faz questão de deixar claro. 

Tentava, à todo custo, não pensar no que eles estariam passando; fome, sede, sem ao menos terem onde dormir, além do chão frio e imundo. Por vezes, Bill retornava ao quarto com manchas vermelhas na roupa. Sangue. Neguei com todas as forças a ideia do sangue pertencer à eles.

Em todas as suas saídas, ele fazia questão de me informar para onde iria, principalmente se este fosse os calabouços. Sempre com aquele sorriso, sempre com o mesmo maldito sorriso; aberto, exibindo com perfeição os seus caninos afiados que muito me marcaram. O canto direito repuxado para cima, dando-lhe um ar mais ladino e cruel.

Contudo, Bill parecia tornar-se mais agressivo com o decorrer dos dias, mais bruto, arrogante e egocêntrico. Muito mais que o habitual. Com falas ácidas, afiadas, exalando impaciência. 

Frequentemente eu pedia, implorava e até mesmo suplicava, em busca de um consentimento para o meu sôfrego pedido de poder ver a minha família. O pouco bom humor que ele tivesse, iria diretamente para o espaço após meus pedidos, os quais o loiro sempre negava.

Ele se irritava, acabava soltando palavras grossas e doloridas em gritos revoltados. Eu, estando em uma situação nada favorável e presa, sem qualquer chance de escapar, encolhia-me, sempre temendo que algum descontrole o fizesse recorrer a agressão. 

O demônio parecia se arrepender, me olhando com mais ternura, voltando a falar com mansidão. Ele então vinha até mim, sempre com o seu típico charme; os fios loiros caindo sobre o rosto, junto daquele sorrisinho de desculpas que já revelava suas intenções. 

Seus braços envolviam-me pela cintura, com a autoridade na qual eu já me acostumara e passara a gostar. Um beijo ali, um beijo aqui. Um afago breve na bochecha. O pedido de desculpas nunca vinha, não em falas claras, afinal, Bill Cipher é orgulhoso, ele não tentaria se desculpar, mas sim compensar o erro. E assim, sempre com os mesmos gestos, ele me desarmava, o final era sempre o mesmo; um beijo intenso que nos levava para algumas horas de sensações indescritíveis.

Entretanto, a frustração mostrou-me o quanto eu estava sendo fraca, caindo nas tentações do pecado da luxúria, sempre estando na palma da mão do demônio, sob o seu controle doentio. O Cipher sabia usar as coisas ao seu favor.

Com esses pensamentos, revoltei-me, pisei firme na minha decisão para não deixa-la escapar, mantive o meu foco, o meu único objetivo, neguei o seu toque, recusei me entregar, ao menos uma única vez. Mas os resultados não foram nada satisfatórios.

A partir dessa minha escolha, iniciou-se uma discussão, um debate, um bate-boca se assim você quiser chamar, que fora deveras desgastante e cansativo. 

Eu o xingava de muitos nomes e, o loiro sendo como é, não se permitiu ser submetido à uma série de difamações, passando a retribuir na mesma altura. Eu chorava. Ele gritava. Bill estava descontrolado, tomado por sua insanidade. Mas eu também não estava no meu melhor estado, pois lembro-me bem de falar em alto e bom tom, para que todos os quatro ventos escutassem; eu disse que o odiava.

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