Arthur - Degolificada

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Passamos por estradas rurais escuras, praticamente estávamos no meio do nada. Eu não fazia ideia de como sr.Veríssimo conseguia manter a calma o suficiente para dirigir enquanto éramos perseguidos pelo corpo de Agatha. Me encolhi entre meus amigos, precisava perguntar, não aguentaria se os abandonassemos com aquela coisa...
– E os outros alunos e professores? Aquela coisa ainda está na escola!
– Ela não quer eles, está nos perseguindo – disse Veríssimo. – Na verdade, não creio que esteja interessada em mim está atrás de vocês.
– Nossa que animador – disse Cesar em um tom irônico.
– E nossas famílias? – disse Joui. – Minha mãe vai me matar se souber que fugi da escola!
– As suas mães sabem para onde estamos indo – disse sr. Veríssimo. – Elas já sabiam que um dia vocês precisariam ir para o acampamento, sempre souberam quem vocês eram.
– Quem nós somo? O que você quer dizer com isso? – Cesar franziu a testa. – O que você quer dizer com isso?
Um estranho rugido ergueu-se em algum lugar atrás de nós, mais perto do que deveria. O que quer que fosse aquele monstro ainda estava na nossa cola.
– Há muito a explicar e não temos tempo suficiente. Precisamos por vocês em segurança – disse o Veríssimo.
Tentei envolver minha mente no que estava acontecendo, mas não consegui. Eram informações demais.
Veríssimo vez uma curva fechada para a esquerda. Desviamos para uma estrada mais estreita, passando com velocidade por casa de fazendas no completo escuro, colinas coberta de árvores e placas sobre cercas brancas.
– Agatha, que é exatamente esse acampamento? – chamei. – Porque ir para lá?
– É um acampamento para pessoas como nós, digamos que nossos pais fizeram o mínimo e nos deram um lugar seguro.
– Nosso pais? – disse eu. – Nenhum de nós chegamos a conhecer nossos pais biológicos, fomos criados somente por nossas mães.
– Eu sei disso, eu também fui, porque eu sou como vocês – disse Agatha. – Nossos pais são pessoas importantes, bem mais importantes do que possam imaginar e, por conta disso, a gente praticamente nasce com um alvo nas costas, os monstros conseguem sentir nosso cheiro facilmente, quando mais temos conhecimento sobre isso, mais fácil fica de nós rastrearem.
– Aquela coisa está nos seguindo por causa dos nossos pais? – perguntei, confuso.
– Não, é por que nós somos nós – disse Agatha.
– Nossa, agora entendi tudo – disse Cesar irritado.
– Vocês vão entender quando chegarmos lá – ela respondeu.
– Você pelo menos pode nos falar como caralhos você trocou de corpo? – disse Cesar. – Você falou alguma coisa de ritual...
– Aquele idiota do Gabriel... – ela murmurou com raiva. – É melhor nos concentrarmos no que realmente importa agora, fugir da Degolificada e levar vocês até o acampamento em segurança.
– Não fale em voz alta! – alertou sr. Veríssimo. – Você sabe muito bem que os nomes têm poder. Isso vale para vocês também, meninos.
– Esse é o nome do bicho tá com seu corpo? – perguntou Joui.
– Sim – disse Agatha.
– Não tem como sei lá... Desconvocar ou prender ela? – perguntei. – A gente não pode deixar um negócio daqueles solto por aí!
– Não tem como prender um monstro intangível – Agatha explicou. – Mas é possível expulsá-la da nossa Realidade.
– Como? – perguntei. – Eu posso ajudar.
– Obrigada, mas fui eu quem a invocou, é meu dever derrotá-la – disse Agatha – Virou questão de honra.
– Não se preocupe, nós iremos dar um jeito nisso – Sr. Veríssimo garantiu. – Esse tipo de monstro só pode ser derrotado queimando o corpo que ela está tomando posse e tirando forças para se manter nesse plano.
– Pera, a De... A criatura está tirando forças da Agatha? – perguntou Joui.
– Não, do Gabriel – Agatha respondeu. – Quando a troca aconteceu, ele foi para meu corpo, então ela está o usando atravéz do meu corpo.
– Meu Deus... – exclamei. – Ele vai conseguir sobreviver?
Naquele momento, esqueci completamente tudo que ele havia feito contra mim e meus amigos, ninguém merecia aquilo.
– Ele já está morto – disse Agatha. – O problema maior é que ele não está conseguindo passar para o Outro Lado, com o monstro sugando energia da alma dele daquele jeito... ele não vai conseguir fazer a passagem.
– Outro Lado? – perguntei. – Tipo o Céu?
– Não, estou falando do Mundo Inferior, a onde todas as almas vão – disse Agatha.
– Não sabia que você é religiosa – disse Cesar.
– Isso não é uma religião, é o que acontece quando você morre _ disse Agatha. – Fala para eles sr. Veríssimo!
– É verdade – Veríssimo conformou. – Vocês podem até não acreditar, mas isso é um fato.
Depois de ver tantas coisas estranhas, acreditar na possibilidade de existir algo depois da morte não parecia tão absurdo.
Agatha também sempre conviveu com esse tipo de coisa, nem conseguia imaginar como devia estar a cabeça dela naquele momento...
– Agatha, se o único jeito de acabar com aquilo é queimando seu corpo... – Fiz uma pausa, hesitante. – Você está presa no corpo do Gabriel para sempre?
Ela desviou olhar para a janela. Pela sua expressão melancólica já consegui entender o recado.
Ninguém perguntou mais nada. Confesso que estava com um pouco de medo de Agatha, ela não parecia estar muito sã, e todo aquele sangue... Não era dela, não tinha nenhum sinal de ferimentos e o jeito que ela falou com tanta raiva de Gabriel... Algo no tom de sua voz me causou calafrios.
Olhei para o lado de fora, nada além escuridão. Olhei para Agatha e pensei naquela coisa fantasmagórica flutuando em nossa direção. Meus membros ficaram amortecidos de choque. Aquele corpo não era mais da minha amiga, nem humano mais aquilo era. E estava vindo nos matar.
Então pensei no sr. Veríssimo e na espada que ele jogara para Joui. Antes que pudesse perguntar, os cabelos da minha nuca se arrepiaram. Vi um vulto preto pela janela do carro e mais um grito pode ser escutado, mas dessa vez foi quase ensurdecedor, tive que tapar meus ouvidos. Em seguida, me lembro de ter me sentido sem peso, e depois como se estivesse sendo esmagado.
– Tá todo mundo bem? – perguntou sr. Veríssimo.
– Estamos bem – disse eu.
Cesar, Joui e Agatha confirmaram que estavam bem também.
Eu não estava morto, era um bom começo. As janelas do carro estavam com os vidros quebrados. A van tinha virado.
Ela havia nos alcançado.
– Puta merda! – disse Agatha.
– Saim do carro! – sr. Veríssimo falou.
Agatha, que estava no banco da frente, abriu a porta do motorista e ajudou sr. Veríssimo a sair. Cesar abriu a porta para nós.
Ao sairmos, demos de cara com a Degolificada. Ela flutuava em frente a nós, seus longos cabelos pretos se moviam em nossa direção como se fossem braços, eles cobriam totalmente o rosto que antes pertencia a Agatha, seu corpo agora estava pálido, esquelético e sua pele havia tomado um tom acinzentado, a criatura ainda usava o uniforme da escola - que estava rasgado e com manchas de sangue - ela se voltou diretamente para nós.
– Falta pouco – disse Veríssimo. Agatha, leve eles até o acampamento!
– Eu não vou deixar você aqui para morrer! – ela gritou.
– Agatha, sua missão é escoltar os meninos em segurança. Eu sobrevivi por todos esses anos, já lutei com muitos monstros, agora, vá! – ele estava tentando nos proteger.
A Volkomeen hesitou, olhou para trás uma última vez e começou a correr, fomos logo atrás dela.
Quando estavamos a uma boa distância da van, Agatha parou bruscamente.
– É logo ali! – ela apontou para a colina mais próxima. –depois daquele pinheiro é a entrada do acampamento. Continuem, vocês verão uma casa branca logo de cara. Vão até ela, não parem até chegar, depois gritem por ajuda.
– O que você pretende fazer? – perguntou Joui.
A garota preparou sua lança ( eu não faço a menor ideia de onde ela tirou aquilo) que também estava ensanguentada, com um sorriso meio sádico.
– Eu não vou deixar o sr. Veríssimo para trás, não se preocupem comigo, vou ficar bem.
– A gente não vai deixar você para trás! – afirmei. – Olha, eu não sei o que aconteceu naquele bunker... Mas você ainda é nossa amiga.
– Que tal escutarmos a Agatha e irmos logo antes que o bicho venha atrás da gente? – propôs Cesar.
– Cesar-Kun! – repreendeu Joui.
– Tá bom, vamos com você.
– Atá, com que arma vocês vão enfrentar a Degolificada? Vocês não tem preparação nenhuma! – retrucou Agatha.
– Bom – Joui tirou a caneta esferográfica do bolso – acho que tenho uma arma.
– Mas você não sabe usar, vai acabar se acertando com a própria espada.
– Mas... – comecei.
Por trás de Agatha, consegui ver a cena do monstro flutuando novamente em nossa direção e sr. Veríssimo suspenso no ar sendo o segurando com os cabelos da criatura.
Quis gritar, mas não consegui. Eu havia paralisado. Quando foi que ela tinha chegado tão perto de nós?
– Não! – Agatha correu para cima da Degolificada com a lança.
A criatura ergueu os cabelos em direção de Agatha, ela conseguiu desviar da primeira mecha, a outra se onrolou no seu braço, Agatha a cortou com a lança e deu a volta pelo monstro chegando até sr. Veríssimo, ela cortou a mecha que estava o segurando com a parte pontiagudo de sua lança.
Ela ajudou o homem a se reerguer e recuar em nossa direção.
– Nesse momento, não temos escolha a não ser fugir – concluiu sr. Veríssimo. – Continuem e não olhem para trás.
Voltamos a correr, agora todos juntos, fiz como instruído e não olhei para atrás, acho que, mesmo se quisesse, não teria coragem de olhar novamente para aquilo.
Subimos a colina a passos largos, a grama ultrapassava a altura dos joelhos, o que atrapalhava um pouco. Chegamos as pressas até o grande pinheiro. Consegui ver lá embaixo várias construções, a casa grande casa branca se destacou em minha visão.
Deve ser essa a que Agatha falou. Pensei.
Eu estava certo, Agatha e sr. Veríssimo nos lideraram até o local.
Subimos em uma varanda de madeira, não demorou muito até um grupo de adolescente vir em nossas direção, todos vestiam camisas laranja. Uma menina de cabelos pretos levava com sigo um kit médico, ao seu lado, um garoto com uma cicatriz na lateral do rosto segurava sua mão. Outros dois adolescentes os acompanhavam: uma ruiva e um garoto moreno. Todos nos olhavam com curiosidade e preocupação.
– Pai! – a ruiva se pronunciou. – O que aconteceu?
Pai? Sr. Veríssimo tem filhos? Pensei.
– São eles! – interrompeu a menina com o kit médico nos olhando. – Isso não é um bom sinal...
– Silêncio, Elizabeth – disse sr. Veríssimo. – Vamos para dentro.
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Como podem ver, eu tenho uma criatividade limitada para títulos.
Desculpem pelo capitúlo mais curto.

O Segredo No AcampamentoOnde histórias criam vida. Descubra agora