Possível gatilho: crise de choro.
Oi meus querides, demorou mais saiu, esse é o capítulo mais longo que eu já escrevi, 7909 palavra kkkk.
Espero que vocês gostem S2.
PS: Leiam as notas finais.
_________________________________________Dor fantasma é uma sensação bizarra, um estado em que alguém que perdeu algum membro do corpo continua o sentindo mesmo depois da amputação. Liz me explicou depois que acordei que eu poderia continuar sentindo o meu braço por um tempo, já que meu cérebro ainda não havia processado o que tinha acontecido, mesmo que toda vez que eu olho para o lado, encontro apenas a manga da minha blusa.
Eu sintia uma intensa sensação de formigamento, que as vezes se transformava em dor, nada insuportável, somente algumas pontadas na região onde meu braço havia sido arrancado.
Eu não queria preocupar os outros com mais alguma coisa, então pedi para Liz que não contasse para ninguém, ela respeitou minha decisão.Encontrei Dante e Beatrice no caminho do pavilhão pela manhã. Quando estávamos prestes a seguir cada um para suas mesas, ouvi alguém nos chamar:
– Pessoal! – Joui indicou a mesa 1 com a cabeça antes de ir pegar seu prato.
Ele parecia bem mais animado do que ontem, tinha um grande sorriso no rosto mas seu semblante também não era o mesmo calmo de sempre, parecia mais agitado e ansioso.
Alguma coisa aconteceu e eu não estou sabendo. Pensei.
– Arthur, nós podemos nos sentar com ele? – Dante me perguntou. – Não seria contra as regras?
– Teoricamente sim, mas essa regra tá só de enfeite mesmo – expliquei. – Ninguém mais segue isso e o sr. D e o sr. Veríssimo fingem que não vêem.
– Viu, Dante? – disse Beatrice. – Deixa de ser paranóico.
Pegamos nossos pratos, fizemos a oferenda aos deuses queimando parte do alimento e, por fim, nos sentamos a mesa 1 junto de Joui, Cesar, Tristan, Agatha e Liz.
Tristan fez questão de se sentar ao lado de Beatrice, o que tive certeza que deixou Dante meio irritado, apesar do loiro não costumar ser tão expressivo, eu conseguia capitar pequenos detalhes que entregavam seu desconforto quando o Monteiro fazia cantadas descaradamente para sua irmã. Dante cuidava de Beatrice como se sua vida dependesse disso, era nítido o quanto a amava e, apesar de as vezes ser um pouco superprotetor, ele definitivamente tinha muitos motivos para agir dessa forma, eu nunca o obrigaria a me dizer qualquer coisa, mas seu passado era algo que me intrigava muito, na verdade, Dante por si só era uma pessoa intrigante. Sua personalidade discreta e introvertida não deixavam muitas vezes transparer por completo quem é esse garoto de verdade, somente dos momentos de maior intensidade ele realmente se soltava. Aqueles olhos azuis eram tão enigmáticos que facilmente me tirariam noites de sono para tentar decifrá-los.
– Arthur, você está bem? – Dante me perguntou baixo.
– Sim, desculpa – me toquei que estava o encarando a tempo demais.
– Tudo bem – o sorriso doce de Dante me fez quase derreter de tanta fofura. – Eu não me importo que você me olhe.
Quase caí da cadeira de susto com um som metálico ecoando na mesa, olhei para o lado e vi que Agatha estava nos encarando com a cara fechada, ela havia derrubado uma colher (tenho quase certeza que foi de propósito).
– Desculpa – ela pegou o talher do chão. – Não queria ter atrapalhado sua conversa com o senhor feiticeirinho fodão.
É, ela definitivamente fez de propósito. Pensei.
– Eu fiz alguma coisa para ela e não me lembro? – Dante cochichou para mim.
– A Agatha tá com ciúmes, não leva pro lado pessoal – disse eu. – Tenho certeza que vocês vão se dar muito bem depois que ela parar com isso.
– Agora estou com medo do que ela pode fazer quando marcarmos nosso encontro – Dante cochichou brincando.
– Você quer mesmo sair comigo? – perguntei receoso.
Eu realmente ainda não conseguia entender o que Dante iria querer comigo. Eu não tenho nada de interessante, ficaria menos surpreso se ele me dissese que quer sair com Joui ou até Cesar mas eu? Logo o cara que nem uma guitarra consegue tocar mais, o que foi um estorvo durante a missão inteira, um filho de Apolo qualquer.
– Eu aceitei seu convite, não? – Dante me questionou.
– Sim – corei.
Ouvi Agatha resmungar alguma coisa em grego (tenho quase certeza que foi um xingamento).
Olhei para Joui quase clamando para que ele desse um sermão em Agatha, mas acho que ele nem se quer notou o que estava acontecendo, muito menos meu pedido de socorro silêncioso.
O asiático mantinha os olhos em Cesar enquanto o mesmo cochichava algo para ele. Sabe aquele jeito que gente apaixonada fica se olhando? Então, era exatamente o que estava acontecendo naquele exato momento, era como se os dois estivessem em um plano paralelo. Se antes já estava óbvio o quanto eles estavam apaixonados um pelo outro outro, agora nem tentavam mais esconder.
Mas tinha alguma coisa diferente... eles eram dois bobos apaixonados e tudo mais, a cena era muito fofa de se ver, mas não era a forma que eles costumavam agir um com outro.
Cesar vivia na defensiva, ele estaria surtando e seu rosto estaria igual um pimentão se Joui estivesse tão próximo de si como estava naquele momento.
Já Joui era sempre muito atento a tudo ao seu redor e, com o intuito de ser educado, mesmo que não estivesse a fim daria atenção para todos da mesa, mas seu foco estava completamente voltado para o Cohen.
– Cesar? Joui? – chamei pelos dois.
– Oi, Arthur-San – Joui sorriu simpático.
– Fala Tutu – Cesar se virou em minha direção também.
– Vocês estão mais estranhos do que o normal – disse eu. – O que tá rolando?
– Eu não te falei que ele ia perceber? – Cesar disse para Joui.
– Eu... posso contar? – Joui perguntou a Cesar.
– Opa, fofoca? – Tristan se ajeitou na cadeira. – Pode falar, sim.
– Aconteceu alguma coisa?– Liz finalmente quebrou o silêncio que se mantinha.
Quando me dei conta, todos presentes na mesa olhavam em direção a eles.
– Eles iam descobrir de qualquer forma mesmo – disse Cesar. – Arthur, você lembra o que eu te falei quando a gente tava indo pro pavilhão ontem a noite?
– Que você ia dar um jeito de descobrir o que o Joui estava escondendo ainda ontem? – perguntei. – Descobriu?
– Que história essa de que o Joui está escondendo alguma coisa? – Beatrice perguntou.
– Não importa agora, a gente vai contar – disse Cesar.
– Espera Joui, então você disse pra ele... – comecei.
– Sim – disse o asiático corando.
– Isso quer dizer que... – disse eu.
– Eu e o Cesar-Kun estamos namorando – disse Joui.
– É o quê? – disse Liz.
– Já tava na hora – disse Agatha com um sorriso ladino.
– Ué, mas vocês já não estavam juntos? – Tristan perguntou confuso.
– Não, mas agora sim – disse Joui.
– Que fofos – disse Beatrice.
– Eu já suspeitava de que vocês tinham alguma coisa – disse Dante.
– E alguém não suspeitava? – disse Agatha.
Abri um sorriso genuíno. Finalmente alguma boa notícia depois de tudo o que passamos.
Me levantei e dei a volta pela mesa para chegar até onde Joui e Cesar estavam e os abracei com força, quase acabei derrubando os dois no processo.
– Só vou dizer uma coisa – disse eu. – Eu vou ser o padrinho do casamento de vocês, não quero nem saber. Eu mereço por ter que aguentar essa enrolação por anos!
– Combinado – disse Joui rindo.
– E eu vou ser a madrinha! – disse Agatha.
– Não, eu é quem vou ser – disse Liz.
– Você pode ser madrinha dos filhos deles – disse Agatha.
– Fechado – disse Liz.
As duas apertaram as mãos como se tivessem selado um acordo.
– Ah, eu queria ser madrinha dos filhos também – disse Beatrice.
– A Liz pode ser madrinha do primeiro e você do segundo – disse Agatha.
– Já estou começando a me questionar se foi uma boa idéia contar – disse Cesar corado. – A gente começou a namorar ontem e vocês já estão planejando o nosso casamento.
– E filhos – os lembrei.
– Por Hades – Cesar revirou os olhos.
– Como isso aconteceu? – Tristan perguntou. – Preciso de detalhes.
– Foi depois da fogueira – disse Joui. – eu acompanhei o Cesar até o chalé 13 e quanto chegamos ele me arrastou para dentro contra a minha vontade e....
– Falando assim, parece até que eu te sequestrei – disse Cesar cruzando os braços.
– Desculpa, meu anjo – Joui beijou a bochecha do namorado. – não foi minha intenção.
– Eu tô brincando, Jojo – Cesar riu. – Eu não fiquei bravo.
– Mas é como diz aquele ditado, né? – disse Agatha. – Tal pai, tal filho.
Cesar fransiu a testa.
– Hades sequestrou Perséfone... – disse Agatha. – entendeu?
– Eu vou colocar a Liz no seu lugar como madrinha – Cesar estreitou os olhos, encarando Agatha.
– Não! – Agatha se apressou em dizer. – Desculpa, foi uma péssima piada.
– Vou pensar no seu caso – disse Cesar.
– Mas então, deixa eu ver se eu entendi. Você arrastou o Joui pro chalé 13 no meio da noite e agora vocês tão namorando? – Tristan perguntou.
– Sim – disse Joui. – Nós conversamos e percebemos que sentiamos o mesmo um pelo outro.
– Sei bem qual foi essa conversa – Tristan sorriu malicioso.
– O que você quer dizer com isso? – Joui perguntou genuinamente confuso.
– Tristan deixa de ser inconveniente – Liz o repreendeu.
– Só tô falando a verdade – disse Tristan. – Até parece que vocês ficaram sozinhos no chalé 13 e nem se quer se beijaram.
– É claro que a gente se beijou, mas só foi isso – disse Cesar.
– Como melhor amigo deles, posso comprovar que eles são inocentes e lerdos demais para fazer qualquer coisa além disso – disse eu.
– Ei! – disse Cesar. – Tá, você tem razão.
– Eu sei – disse sorrindo. – Ainda nem parece verdade que vocês realmente estão juntos.
– Eu só não entendo uma coisa, o que você estava escondendo exatamente, Joui? – Liz perguntou. – Porque você me falou ontem que o segredo tinha a ver com Thiago e eu não consigo entender como o namoro de vocês tem a ver com isso.
– Bom, eu talvez tenha omitido que Héstia foi a única deusa que me visitou em meus sonhos – disse Joui.
– Você mentiu pra mim?! – disse Liz.
– Eu não menti! – disse Joui. – Eu omiti informações!
– Dá no mesmo! – disse Liz.
– Deixa ele explicar – disse eu.
– Basicamente, Afrodite me disse que o Thiago-Sensei está vivo – Joui contou.
– E porque você não me disse isso antes?! – Liz perguntou, quase gritando.
– Liz-Sempai, fala baixo – disse Joui. – Eu não disse nada porque essa foi a única informação relevante que ela disse... ai!
– Eu não sou relevante? – Cesar deu uma cotovelada em Joui.
– Você entendeu o que eu quis dizer. Essa foi a única coisa que ela disse sobre o Thiago-Sensei – disse Joui. – O resto da conversa foi ela jogando na minha cara que eu gosto do Cesar-Kun. Eu não falei nada antes porque estava com vergonha de vocês começarem a fazer mais perguntas e eu ter que falar dessa parte sendo que nem o próprio Cesar sabia.
– Ah, faz sentido – disse Liz. – Está perdoado por ter mentido pra mim.
– Calma lá, muita informação – disse eu. – Afrodite fez você perceber que gosta do Cesar?
– Sim – disse Joui.
– Pois então, Afrodite está certíssima, faria o mesmo – disse eu.
– Você já ficava fazendo isso comigo – disse Cesar. – O tempo todo!
– Era divertido ficar te provocando – confessei. – Vou sentir falta disso.
– Eu não – Cesar disse e puxou Joui para beijo.
Eu, que estava praticamente entre os dois, fiquei meio chocado vendo a cena.
– Vocês mal começaram a namorar e já vão me fazer ficar de vela? – perguntei fingindo indignação.
– Que ódio de ser semideus, eu queria ter filmado! – disse Tristan. – Meu celular tá lá na puta que pariu.
– Tenta filmar pra ver se eu não arremesso o celular na sua cara – Cesar ameaçou ao se separar de Joui.
O asiático riu com as bochechas coradas.
– Cês tão ligado que tem gente olhando pra cá, né? – Agatha apontou para as mesas mais próximas, onde os campistas de fato estavam nos encarando descaradamente.
– Puta merda – disse Cesar corando.
– Cesar-Kun, olha a boca – Joui o repreendeu.
– Vão cuidar das suas vidas! – Liz gritou. – Não tem nada para ver aqui!
Os campistas realmente a obedeceram, se virando para frente e cochichando entre si.
Dante, que estava comendo seu sanduíche de presunto e queijo quietinho, levou um susto com a gritaria.
– Liz, eu tenho certeza que isso chamou mais atenção ainda – disse Beatrice.
Bea estava certa. Mais campistas olharam em nossa direção curiosos, o que resultou em um burburinho entre as mesas.
– Bom, pelo menos vocês não vão ter que ficar contando pra todo mundo que estão namorando – disse Tristan. – Essas maria fifi já estão fazendo esse trabalho por vocês.
Dito e feito. Não deu nem quinze minutos e Fernando e Nathaniel já estavam na nossa mesa perguntando se o que estavam dizendo era verdade.
– Sim, nós estamos juntos – Joui passou o braço pelos ombros de Cesar, o abraçando de lado.
O Cohen tentava conter que o sorriso estampado em seu rosto se alargasse.
Fernando teve a mesma reação que eu e abraçou o casal alegremente.
Nathaniel forçou um pequeno sorriso, mas seu semblante entregava que ele não estava muito feliz.
– Que bom. Vocês são realmente um casal muito... bom, não era como se eu não esperasse que isso fosse acontecer.
Joui sorriu claramente feliz, mas ainda parecia preocupado com a reação do amigo. Ele era lerdo mas não tanto a ponto de não perceber que Nathaniel, o cara que dava encima dele descaradamente o tempo todo, gostava dele.
– Tá tudo bem, Nath? – Joui perguntou.
– Claro – ele riu com amargura. – Eu tô ótimo. Eu só...vou voltar pra mesa 11. Você sabe como é, meus irmãos a essa altura já devem estar brigando porque alguém roubou alguma coisa um do outro... tchau.
– Ok. Até...
Antes que Joui completasse a frase, Nathaniel saiu correndo de volta para sua mesa.
– Ele vai superar – disse Fernando. – Só dá um tempo pra ele.
Joui concordou.
– Gente, é o Nathaniel – disse Agatha. – Daqui a meia hora ele já vai estar dando encima de outra pessoa.
– Ela tem razão – Tristan concordou.
– Bom, acho melhor comermos logo, daqui a pouco é a reunião – disse Joui.
– Eita, é verdade – disse Tristan e pegou um pão de queijo do prato. – Agiliza aí pessoal, o Veríssimo não gosta de atrasos.
Assim que terminamos de comer, nos dirigimos até a Casa Grande para começar a reunião, era hora de colocar os pingos dos is e resolver o que faríamos em seguida.
– Kenan-Sama! – Joui exclamou ao ver o mais velho na sala de reuniões.
– Japinha! Emo! Menino de Apolo! – Kenan veio de braços abertos em nossa direção.
Liz cruzou os braços, nos observando com atenção.
– É Joui, Cesar e Arthur – disse o asiático enquanto éramos apertados em um abraço por Kenan.
– Caramba, o que aconteceu com o seu rosto? – Kenan apontou para a cicatriz de Joui.
– Você viu senhor Kenan, estava com a gente na hora – disse Joui.
– Ah, é verdade – disse Kenan se virando para mim. – Ué, o que aconteceu com seu braço? Você tava inteiro da última vez que... ai!
– Kenan, isso é coisa que se fale?! – Liz puxou sua orelha. – Peça desculpas pro Arthur, agora!
– Desculpa – Kenan não parceria estar arrependido, talvez só tivesse se desculpado pelo puxão de orelha da irmã.
– Porque você não vai procurar o sr. Veríssimo para começarmos a reunião? – disse Liz.
– Tá bom – Kenan a obedeceu sem hesitar.
– Me desculpe por ele, Arthur – disse Liz envergonhada. – o Kenan não está nada bem, ficar naquela sala branca por anos não fez bem para a cabeça dele.
– Eu entendo – apertei a mão no nó de minha manga. A sensação de formigamento cessou por alguns instantes, como se meu cérebro tivesse se lembrado de que meu braço não estava mais lá. – Tá tudo bem.
– Sr. Veríssimo acha que Kenan pode nos ajudar com informações – Liz nos contou. – Mas ele mal fala coisa com coisa...
– O Kenan mudou muito desde a última vez que eu o vi – disse Tristan entrando na sala. – Ele sempre cuidava de todo mundo, nunca falaria uma coisa daquelas.
– Acho que todos nós mudamos mudamos muito nos últimos tempos – Agatha se sentou em uma das várias cadeiras espalhadas pela grande mesa de madeira no centro da sala. – Eu já vi isso antes, ele está enlouquecendo. Se vocês não tivessem o encontrado, já teria perdido completamente a cabeça.
– Eu te entendo – Dante olhou discretamente para Beatrice, o que não passou dispercebido por mim.
– Como assim? – Beatrice perguntou.
– Essa é uma coisa a qual eu duvido que um dia poderei te contar – disse Dante. – Hum... – Beatrice olhou para o chão.
Franzi o cenho confuso.
– Mas então... – Tristan começou, provavelmente tentando não deixar o clima desagradável. – Cadê o Orpheu, Bea? Não vi ele com você hoje.
– Tá pelo acampamento – disse ela. – Eu percebi que mesmo se Orpheu voar para longe, quando eu o chamo, ele sempre volta.
– Que doido – disse Tristan. – É como se ele já tivesse sido treinado para te seguir.
– Sim – Dante ficou pensativo de repente. – Esse pássaro é muito esquisito.
– Voltei! – Kenan veio saltitando como uma criança agitada. Veríssimo e Mia o acompanhando.
– Oi crianças – Veríssimo nos cumprimentou.
– Oi gente – Mia acenou para nós.
– Sentem se, por favor – disse Veríssimo, indicando a mesa. – Fiquem a vontade enquanto esperamos o restante chegar.
Não demorou até que o ambiente fosse preenchido por adolescentes. Engoli em seco vendo aqueles campistas experientes a minha volta impacientemente discutindo entre si.
– Silêncio – Sr. Veríssimo bateu na mesa para chamar nossa atenção.
Ele puxou a única cadeira vazia e se sentou na ponta da grande mesa retangular.
– Gostaria de começar, Liz? – perguntou sr. Veríssimo enquanto olhava os documentos que havia trazido consigo.
– Claro – disse ela. – Joui recebeu uma profecia que nos guiou durante a missão, acho que vale a pena relembrá-la e analisar seus trechos.
– Finalmente resolveram nos contar – disse Naomi, a líder do chalé de Hermes.
Liz abriu seu bloco de notas e folheou algumas páginas.
– "Do início de sua jornada retornará" – Liz começou. – Foi fácil concluir que iríamos ter que voltar a escola onde Joui, Arthur, Cesar e Agatha estudavam. Alguém quer continuar?
– "Do sussurador o desespero ganhará" – disse Joui.
– O que significa? – Jiro perguntou, ele estava assumindo o papel de Thiago temporariamente como conselheiro chefe do chalé de Afrodite.
– Não sabemos, o que não faz sentido nenhum porque, teoricamente, isso já era para ter acontecido – disse Joui.
– Cês tão ligado que isso pode ser uma metáfora, não é? – Luciano, o líder do chalé de Ares, comentou. – "Desespero" não fazem vocês se lembrarem de nada não?
– A Máscara do Desespero – Liz concluiu.
– Exatamente – disse Luciano. – Porra, até parece que nunca decifraram uma profecia.
– Pelo o que eu me lembre, quem nunca nem recebeu uma profecia foi você – Agatha rebateu o irmão.
– Fica na sua – disse Luciano. – Quem é que te chamou pra conversa?
– Fui eu – disse Veríssimo. – Agatha pode ser de grande ajuda para nós.
– Que seja – Luciano revirou os olhos.
– Lu, não fala assim com ela – Fernando o repreendeu.
– Desculpa, Agatha – disse Luciano.
– Susurrador... ele ganhou a Máscara? – Liz pareceu ignorar toda a discussão a volta. – Será que está se referindo a Nemesis? Ou Hades...
– Meu pai não tinha falado que uma tal de Seita das Máscaras eram os seguidores de Nemesis? – disse Cesar. – Será que eles tem alguma coisa haver com isso?
– Seita das Máscaras? – Sr. Veríssimo arregalou os olhos, seu rosto expressava uma mistura de surpresa e medo. – O que vocês sabem sobre elas?
– Ah, ótimo, agora vamos ter que nos preocupar com uma seita também? – Yuki, a líder do chalé de Hécate, reclamou.
– Bom, nós fomos ao Mundo Inferior – contei. – e Hades nos falou que Nemesis havia roubado a Máscara e começado a juntar novos membros para essa tal de Seita. Nem ele soube dizer porque ela está fazendo isso.
– Minha mãe roubou a Máscara? – Rana, a líder do chalé de Nemesis, perguntou. – Isso não faz sentido!
– Desculpa, mas é verdade – disse Liz. – Hades nos contou a história de como a Máscara foi criada, ela é um artefato de Nemesis, não dele.
Rana encarou Veríssimo em busca de respostas.
– É verdade o que eles estão dizendo – disse Veríssimo com pesar. – Sinto muito, Rana.
– Continuando... – Liz voltou a olhar para seu caderno. – "o desconjurador e a diplomata ao seu lado caminharam".
– Segundo vocês, sou eu e o Dante – disse Beatrice. – Mas ainda não entendi porque a profecia se referiu a nos assim.
– Nem a gente sabe direito – disse eu. – Era para já termos decifrado a profecia inteira, mas tem muitas coisas que não fazem sentido, tipo esses nomes.
– Bom, ainda falta o último verso – disse Liz. – "e, da fúria dos traidores, os marcados se revelaram".
– Traidores? – Fernando perguntou preocupado. – Como assim traidores?
– É isso que estamos tentando descobrir – disse eu.
– Esse é um dos vários motivos do porque a missão era confidencial. Imaginem o que não poderia ter acontecido se vocês ficassem sabendo do último verso enquanto estavam tomando partido na guerra? – disse sr. Veríssimo. – Iriam colocar a culpa uns nos outros de serem os traidores, só pioraria tudo.
– Você tem razão – disse Fernando. – mas e se os traidores estiverem aqui na reunião?
– Não temos muito o que fazer quanto a isso – disse sr. Veríssimo. – não tem como ficar sem nos comunicarmos com vocês.
– E sobre esse negócio de marcado, meu pai falou comigo e ele me disse que eu sou isso – Cesar contou. – Mas não faço a menor idéia do que significa.
– Bom, eu sei – disse Mia. – Acho que está na hora de contar a verdade a eles, pai.
– Do que ela está falando? – Naomi perguntou.
Sr. Veríssimo inspirou fundo, demorando alguns segundos para começar a falar, parecia receoso.
– Um marcado é alguém que foi escolhido por uma Marca.
– Marca? – disse Joui preocupado. – E isso é uma coisa boa?
– As Marcas são entidades que escolhem pessoas para se conectar – disse sr. Veríssimo. – E essas pessoas, os marcados, não são limitados pelas regras que regem a Realidade, em outras palavras, eles são livres das amarras dos deuses.
– Resumidamente, ele quer dizer que os deuses não mandam em você, Cesar – disse Mia. – Você joga com suas próprias regras.
– Imagino que esse seja mais um motivo para os deuses quererem me matar, que animador – disse Cesar.
– Infelizmente você está certo – disse sr. Veríssimo. – Os deuses não costumam se meter nos assuntos das Marcas por um motivo.
– Porque não nos contou sobre isso antes? – perguntei. – Você já tinha ouvido a profecia.
– Arthur, os deuses me concederam a imortalidade apenas para poder treinar vocês – disse sr. Veríssimo. – E eles podem me tirar isso em um estalar de dedos se quiserem.
Em outras palavras, ele foi ameaçado de morte se contasse.
– Isso não é justo! – disse eu.
– Sr. Veríssimo, porque as Marcas fazem isso? – Liz perguntou. – Se elas são entidades que conseguem livrar as pessoas das amarras, então, tecnicamente são mais poderosas que os deuses, não?
Um trovão ressoou no lado de fora.
– Desculpa pai, só estamos tirando dúvidas – disse Joui. – Não mate o sr. Veríssimo, por favor, ele só quer nos ajudar.
Veríssimo deixou escapar uma risada anasalada, senti uma certa melancolia em seu olhar. Não creio que ele tenha achado graça em Joui pedir a Zeus para não matá-lo, talvez apenas achasse o asiático ingênuo em pensar que seu pai o ouviria.
– Sim, as Marcas são mais poderosas que os deuses – disse sr. Veríssimo, respondendo a pergunta de Liz. – É por isso que ninguém nunca fala sobre elas, mas seus pais não podem esconder a verdade de vocês para sempre.
Joui e eu trocamos olhares de preocupação.
– Continuem o relatório, por favor – disse Veríssimo.
– Bom, assim que chegamos na escola Nostradamos, fizemos um plano para derrotar a Degolificada que Agatha invocou – Liz contou. – Nós chegamos até a biblioteca da escola e acabamos encontrando com Hécate que estava se disfarçando de bibliotecária.
Yuki não disfarçou o olhar em direção a Dante e Beatrice.
– Hécate queria nossa ajuda para tirar Dante de lá – disse eu. – Ela nos falou que ele fazia parte de algo maior, mas nem se quer mencionou a Bea.
– Ela não disse mais nada? – Yuki perguntou.
– Disse que se fissesemos isso, ela nos protegeria da Degolificada – disse Cesar. – E antes de ir embora, disse que nós somos a última esperança de alguma coisa e que a desconjuração está próxima, seja lá o que isso for.
– E não foi só a senhorita Hécate que nos falou sobre essa tal desconjuração – disse Joui. – Ouvimos essa palavra várias vezes.
– O que?! – Sr. Veríssimo exclamou surpreso, nunca havia o visto daquela forma. – Isso não é possível, não era para isso estar acontecendo agora.
– Você sabe o que isso significa, não é pai? – Mia perguntou, apesar de parecer já saber a resposta.
– A desconjuração é uma profecia – disse Veríssimo. – A nova Grande Profecia.
– Não pode ser – disse Liz incrédula. – A Grande Profecia já se cumpriu, nós nem se quer recebemos uma nova!
– Nós recebemos sim – disse Veríssimo. – No dia em que a Ingrid tentou virar do novo Oraculo, ela conseguiu por um breve momento, uma profecia foi dita, mas logo em seguida, o espírito de Delfos voltou para a antiga portadora.
– Minha mãe recitou uma Grande Profecia? – Agatha perguntou. – Porque não nos contou?
– Foi decisão dos deuses, eu não pude fazer nada – disse sr. Veríssimo. – Mas também devo admitir que não dei muita importância na época. Havíamos acabado de cumprir uma Grande Profecia, não imaginava que a próxima começaria a se concretizar ainda nesse século.
– A gente já quase foi destruído por conta da última – disse Tristan. – e vamos ter que passar por outra agora?!
– Eu temo que sim – disse Veríssimo. – Mas não creio que você seja um dos heróis dessa profecia, Tristan.
– Espera, um dos? – Luciano perguntou.
– Porque os deuses não queriam que soubéssemos? – Fernando perguntou.
– A desconjuração pode trazer um mal muito antigo de volta – Veríssimo explicou. – Os deuses não queriam que o mundo se quer soubessem da existência disso. Contar antes da hora poderia gerar pânico.
– E você vai continuar deixando isso em segredo, não é? – perguntou Jiro.
– Eu não tenho escolha – disse Veríssimo. – Jurei pelo rio Estige que não contaria.
– Mas que merda, primeiro Cronos... – disse Luciano irritado. – Quem vai querer voltar para nos destruir dessa vez? Gaia?
– Lu, não fala assim com o sr. Veríssimo – Fernando o repreendeu.
– Me desculpa – disse Luciano.
– Porque vocês estão tão preocupados? – Kenan perguntou tranquilamente. – Seja qual ameaça for, a gente acaba com ela em dois palitos.
– Continuem o relatório, por favor – sr. Veríssimo ignorou totalmente o comentário de Kenan.
– Bom, nós abrimos o bunker na biblioteca e... – contou Joui.
– Vocês entraram no bunker? – a voz de Agatha quase não saiu, enquanto a mesma se encolhia na cadeira.
– Eu tenho uma pergunta melhor – disse Jiro. – Porque caralhos tem um bunker em uma biblioteca de escola?
– Não é importante agora, mas ainda teremos muito o que investigar sobre a escola Nostradamos – disse Veríssimo. – Continue, Joui.
– Lá embaixo tinham várias salas e em uma delas nós encontramos a Lina transformada num zumbi de sangue – Joui contava com dificuldade. – Ela tinha vários cortes pelo corpo todo e sangue... muito sangue. Ela morreu sendo torturada. A Liz disse que provavelmente foi usada para enfraquecer a membrana e... foi horrível.
Cesar segurou a mão de Joui, tentando o trazer algum conforto.
– A Lina? – disse Agatha, consegui ver as lágrimas se formando em seus olhos. – Não! Porque alguém faria isso?!
Eu não conhecia muito Lina, mas pelo pouco do que via em sala de aula, ela era uma garota muito gentil, uma das poucas pessoas que tratava Agatha que nem gente.
– Aquele lugar é mais perigoso do que achei que fosse, eu devia ter percebido antes – Veríssimo fechou os dedos eu um dos documentos. – Eu sinto muito por tudo o que vocês viveram, são muito jovens para ver tanta brutalidade...
– Isso é algo que acaba se acostumando quando se é um meio-sangue – disse Liz indiferente. – eles iriam ver esse tipo de coisa uma hora ou outra.
– Agora entendi porque vocês não queriam nos deixar entrar nas salas... – disse Beatrice.
– E tinha mais do que isso – disse Cesar. – Em outra sala, nós encontramos uma outra pessoa transformada em mostro, mas ele era todo esquelético e tinha tatuagens por todo o corpo, e ele ficava murmurando coisas que eu conseguia entender mas os outros não. Ele estava desesperado, implorando por ajuda, pedindo para que o olhassemos e repedido...
– "Saber tudo é perder tudo" – Dante e Cesar disseram em uníssono.
Todos os olhares se voltaram ao loiro. Ele mantinha a cabeça baixa, seus longos cabelos impedindo de vermos seu rosto com clareza.
– Dante, como você sabe disso? – Cesar perguntou confuso.
– Porque eu já vi essa criatura antes – ele contou. – Várias delas para ser mais exato.
– Você já viu? – sr. Veríssimo perguntou.
– São existidos – disse Dante. – Digamos que são pessoas que souberam mais do que deveriam.
– Como assim? – Beatrice perguntou.
Dante engoliu em seco.
– É como se eles fossem para um outro plano entre a vida e a morte, não se tornam exatamente fantasmas, mas posso afirmar que também não estão vivos – o loiro contou tenso. – Eles estão presos ao próprio corpo, não fazem nada a não ser que se sintam ameaçados, só vivem procurando uma maneira de voltar a existir. Mas existem formas de liberar quem foi transformado nessas criaturas.
– Matando? – disse Liz.
– Não! – disse Dante assustado. – Com magia. São pessoas ainda ali, eu nunca mataria... quer dizer... é desumano fazer uma coisa dessas sabendo que eles podem ser transformados de volta com o ritual certo.
– Dante, o que mais você sabe sobre os monstros e magia? – Veríssimo perguntou.
– Mais do que eu gostaria – ele disse.
– Você parece saber muito mais do que um campista de Hécate comum que acabou de chegar – disse Yuki desconfiada.
– É uma longa história – disse Dante nervoso. – Mas objetivo da reunião é falarmos da missão, não das nossa vidas pessoais.
– Beatrice, você sabe alguma coisa sobre esses existidos? – sr. Veríssimo perguntou. – Magia? Monstros?
– Não, eu não lembro de grande parte da minha vida e Dante diz que eu não posso saber – Beatrice olhou para as próprias mãos. – A única habilidade mágica que eu tenho é controlar as plantas.
– Controle da natureza? – Clara, a líder do chalé de Deméter se pronunciou. – Esse tipo de poder que meu chalé tem.
Me lembrei do que Ares havia dito a Beatrice para tentar a manipular, "Esses filhos de Deméter são todos iguais". Acabei soltando um suspiro surpreso pela minha própria suposição, o que não passou despercebido pelos demais campistas.
Yuki encarou Dante, seus olhos azuis pareciam faiscar como raios. Não sabia só certo o que ela iria fazer, mas tive que intervir antes que algo acontecesse.
– Dante me contou boa parte do que aconteceu – o defendi. – Ele só está a protegendo de alguém com más intensões.
– Como assim? – Tristan perguntou. – O que aconteceu?
– Já chega! – disse sr. Veríssimo. – Eu irei averiguar a situação com calma, depois.
– Tudo bem – disse Yuki séria. – mas eu ainda vou descobrir o que ele está escondendo.
Dante engoliu em seco, assustado com o que havia acabado de acontecer.
– Ei – segurei o ombro do loiro. – Quer conversar sobre isso mais tarde?
– Sim... – disse Dante.
– Podem continuar – disse sr. Veríssimo. – e sem mais interrupções até eles terminaram.
Cesar contou sobre a última sala antes da porta principal do bunker. O lugar onde encontramos Álvaro Augusto morto e um bilhete.
– É isso daqui – Liz tirou de seu caderno o papel e o desdobrou. – "Começou. O filho da magia tem consciência de quem é, os marcados logo chegaram. Kian sabe"
Sr. Veríssimo e Mia trocaram olhares preocupados.
– Quem é Kian? – Rana perguntou.
– Não sabemos – disse Cesar frustrado. – É uma das muitas coisas que não sabemos.
– Nós vimos esse nome em outros lugares – disse Liz. – E essa frase "Kian sabe", parece uma espécie de mantra, como se esse tal de Kian fosse alguém importante, talvez até adorado.
– Pai – Mia o chamou em um tom de repreensão. – Você prometeu que não iria mais esconder nada deles.
– Eu sei, mas isso é algo que os deuses me proibiram de falar – disse sr. Veríssimo. – Terei que conversar com sr. D. Mas você está certa, eu não posso mais esconder ele deles.
O resto da reunião seguiu sem mais interrupções relevantes. Contamos como derrotamos a Degolificada, como Dante e Beatrice nos salvaram, o sonho de Cesar com Hades, a perseguição dos venti a mando de Zeus, Santo Berço, nossa ida Mundo Inferior e finalmente a luta contra Ares, o que nos obrigou a falarmos de Thiago.
– O que faremos quanto a isso? – Liz perguntou. – Não podemos deixar Thiago para lá! Já faz três dias, sr. Veríssimo!
– Eu sei, Liz – disse sr. Veríssimo. – Eu conversei com sr. D. Nós chegamos a um acordo, se em uma semana Thiago ainda não tiver aparecido, nós iremos mandar uma equipe de busca atrás dele.
– Uma semana?! – perguntou Liz indignada. – É tempo o suficiente para que ele morra até de fome e sede!
– Me perdoe, Liz – disse sr. Veríssimo. – Eu tentei convencer o sr. D, mas ou era isso ou ele não permitiria a busca. Você sabe como ele é... difícil de se convencer.
– Tudo bem... – disse Liz, ela parecia tentar se acalmar. – uma semana ele consegue sobreviver sozinho. Thiago é inteligente.
– Alguém tem alguma consideração a fazer antes de encerramos por hoje? – Veríssimo perguntou.
– Na verdade, sim – disse Cesar. – Antes de viajarmos nas sombras, meu pai me falou para eu te dizer que aliquam vivere Ordo Realitas.
Veríssimo arqueou as sobrancelhas em surpresa, logo depois, pude ver um sorriso se formando em seu rosto.
– Alguém andou treinando latim – disse Veríssimo. – Muito bem, Cesar, sua pronúncia melhorou muito.
– Obrigado – disse o Cohen sem jeito, ele definitivamente não estava esperando um elogio.
– Eu que agradeço, agora sabemos qual o tipo de ameaça estamos lidando para Hades querer convocar a Ordo Realitas – disse sr. Veríssimo.
– E o que isso quer dizer? – Cesar perguntou.
– Tudo tem seu tempo. Estão dispensados – disse sr. Veríssimo.
– Ótimo. Ele está falando que nem a Hécate agora – disse Cesar se levantando.
Enquanto nós dirigiamos até a saída, minha cabeça não se passava outra coisa a não ser que eu precisava ter uma conversa urgentemente com o Dante.
– Eu vou ir dar comida pro Orpheu – disse Beatrice. – Alguém quer vir comigo?
– Eu! – Tristan disse rapidamente.
Dante estava pronto para seguir a irmã e Tristan quando o parei, segurando em seu ombro, um modo sútil de dizer para esperar um momento.
– Vocês dois não vão sair, não? – Cesar nos perguntou, Joui ao seu lado.
– Podem ir sem a gente, vocês acabaram de começar a namorar – disse eu. – não quero ficar de vela vendo vocês enfiando a língua na boca um do outro.
– Arthur-San! – Joui corou.
– Tô mentindo? – sorri ladino. – Só quero dar privacidade para vocês, mas se quiserem que eu vá junto...
– Me convenceu, vamo Jou – Cesar segurou a mão no namorado, o guiando até a saída.
Sorri vitorioso.
– Porque fez isso? – Dante me perguntou.
– Vem – segurei na mão do loiro para que ele me seguisse.
Ele não resistiu, na verdade, retribuiu o apertou em minha mão.
O levei a praia. Sabia que não tinha muita movimentação por lá naquele horário, o que nos permitiria ter uma privacidade maior para conversarmos.
– Aqui é muito bonito – disse Dante.
– É sim – disse sorrindo. – Sabia que é tradição aqui soltarem fogos de artifício na praia no 4 de julho?
– Sério? – ele perguntou.
– Sim, é até considerado algo romântico convidar alguém para assistir os fogos – contei.
– Você está querendo me dizer alguma coisa com isso, Arthur? – Dante sorriu.
– N-não. Mas se você quiser... sim.
Dante riu. Sua voz melodiosa e doce ecoou pelo local.
O mar estava bem calmo, sem muitas ondas ou movimentação. Andamos por um tempo pela orla em silêncio, até que finalmente tive coragem de perguntar:
– Dan, sobre a reunião – acariciei sua mão com o polegar. – Quer conversar sobre o que aconteceu?
– Sim. Eu acho que está na hora de eu te contar a verdade completa dessa vez – o sorriso de Dante se desfez na hora.
– Você não precisa me contar se não quiser – deixei claro.
– Eu quero – disse Dante. – Eu preciso falar para alguém, eu não aguento mais guardar isso para mim.
Nos sentamos na areia fofa e quente por conta do sol.
Dante enfiou a mão no bolso e de lá tirou uma foto dobrada eu duas partes. Ele a desdobrou e a me mostrou, era um grande grupo crianças posando, como naquelas que as escolas tiram com a turma toda reunida, entre os vários rostos, dois me pareceram familiares.
– Esses são você e a Bea? – apontei para as duas crianças do centro da foto.
– Sim – Dante sorriu nostálgico.
Na imagem, Beatrice segurava o braço do irmão com um grande sorriso no rosto, Dante sorria para ela de volta. Olhando com mais atenção, pude ver uma nota escrita a mão no alto da foto que dizia "Orfanato Santa Menefreda".
– Lembra que te falei que eu morava mnum Orfanato? – Dante me perguntou. – Bom, essa foto é de lá.
– Caralho, quanta gente – disse sem pensar.
– Pois é – disse Dante. – Alguns foram adotados ainda pequenos, nem me lembro seus nomes. A maioria continua lá até hoje.
– Seu pai é dono do orfanato, não é? – perguntei.
– Sim – Dante apontou para um homem alto e pálido, o reconheci daquele sonho bizarro. – Esse é ele.
Apoiei minha mão em seu ombro, o incentivando a continuar.
– Eu e a Lilian tivéssemos uma criação incrível, nos amávamos nosso pai e ele parecia sempre querer o melhor para nós... mas tudo mudou quando recebemos aquela missão – disse Dante, a tristeza era presente em sua voz, claramente era um assunto delicado. – Ele nos mandou salvar uma criança que estava em estado terminal, nos deu um livro que parecia ser muito antigo de magia e falou que tudo o que teríamos que fazer era recitar o encantamento e desenhar os símbolos.
A voz do loiro começar a ficar trêmula.
– Tinha tudo para dar certo. A criança veio para o Orfanato e começarmos o feitiço, tudo como o combinado, mas... – Dante travou, vi lágrimas escorrendo por seu rosto involuntariamente. – Eu estraguei tudo... eu sou um monstro, Arthur. Eu matei uma criança que deveria salvar.
O abracei o mais firme que consegui. Ele apoiou o rosto na curvatura de meu pescoço e retribuiu o abraço. Vê-lo daquele jeito quebrou completamente meu coração, Dante se sentia um monstro, ele se achava uma pessoa horrível, um assassino.
Queria o dizer o contrário, exaltar o quão incrível Dante era, mas sabia que isso não iria ajudar em nada naquela hora. Fiquei por um tempo apenas o abraçando, mas depois de alguns minutos me toquei que ele não iria se acalmar tão rápido sozinho.
– Tá tudo bem. Você está seguro aqui, sua irmã também – disse acariciando seus longos cabelos loiros, percebi que isso era algo que o deixa mais calmo. – Respira fundo. O clima hoje está bem agradável, consegue sentir o cheiro de maresia?
– S-sim – ele respondeu com dificuldade, inspirando bem fundo, tentando recobrar o controle de sua respiração.
– Estamos em uma praia. Me fala, o que você consegue ver ao nosso redor?
– A-areia, o mar... – Ele se afastou um pouco para me olhar nos olhos. – Você.
– Sim – segurei sua mão, mantendo o contato visual o tempo todo. – Eu tô aqui com você.
Ele inspirou fundo, voltando a me abraçar com mais calma agora.
– Obrigado – disse Dante.
– Você está bem? – perguntei preocupado.
– Eu... posso continuar te abraçando?
– Claro – disse eu.
Ele aconchegou a cabeça em meu peito, a ajeitando de lado, de forma que seu ouvido ficasse em direção a minha caixa torácica.
Senti minhas bochechas esquentarem. Seu toque era tão delicado e acolhedor que me fez questionar se ele estava me enfeitiçando ou era realmente real o que eu estava sentindo.
– Seu coração tá acelerado, Thur – ele disse em um tom divertido, quase rindo.
Eu não o que mais me quebrou, Dante escutando meu coração ou o apelido. Só sabia dizer que queria proteger aquele garoto de todo o mal do mundo. Caralho, é assim que o Joui e o Cesar se sentem?
– Dante, você não precisa me contar o resto se isso vai te fazer mal.
– Tá tudo bem agora, eu quero contar – disse ele.
– Ok – disse ainda receoso.
– Meu melhor amigo, Leo... ele entrou na sala, gritando desesperado, tentou nos avisar, falou que estávamos em perigo mas era tarde demais. O ritual já estava sendo feito, se fosse interrompido, as consequências poderiam ser desastrosas e sabíamos disso – disse Dante. – Eu hesitei em ouvir ele, meu pai tinha dito que iríamos salvar uma vida... porque ele iria querer interromper aquilo? A Lilian concordou comigo e...
Acariciei suas costas, esperando o que ele iria dizer.
– Leo está morto, Arthur. Ele entrou no círculo do ritual e me empurrou para fora no último momento e... para ser sincero, eu nem entendi o que aconteceu depois – disse Dante. – Uma luz muito forte me cegou e eu senti uma energia terrível no ambiente. Era magia, com certeza, mas parecia querer destruir cada célula de meu corpo, senti como se eu estivesse em chamas e então... eu desmaiei.
– Eu sinto muito, Dante – foi a única coisa que consegui pensar em dizer.
– Eu acordei na minha cama, com meu pai na porta do quarto. Perguntei onde estava a Lilian e o Leo e ele finalmente resolveu me contar a verdade por trás do que estávamos fazendo – disse Dante. – Ele disse que o ritual não deu errado, Leo apenas assumiu meu lugar como receptáculo de uma entidade chamada... Kian.
– Aquele Kian?! – arregalei os olhos, preocupado.
– Acho que sim. O Leo parecia uma casca vazia, não falava, nem reagia a nada e seus olhos... eles se tornaram amarelos. Era para ser eu no lugar dele – disse Dante. – Desculpa não ter falado nada na reunião, mas eu nem soube como reagir quando vocês começaram a falar sobre ele.
– E a Lilian? – perguntei.
– Depois do ritual se tornou um existido, eu nunca tive a resposta exata do porque, meu pai não se preocupou em me dizer – disse Dante. – ele disse que só nos teve para cumprirmos a desconjuração... e que nós nos tornariamos marcados. Perguntei se Lilian nunca retornaria e ele me falou que iria a transformar de volta quando chegasse a hora certa.
– Deuses – disse completamente horrorizado. – Como ele teve coragem de fazer isso com vocês?!
– E o garotinho... ele se transformou em um monstro – disse Dante. – Meu pai deixava eles todos trancados em um lugar que parecia uma prisão.
A cada palavra que o loiro dizia eu ficava mais chocado com toda a situação.
– Depois disso, eu me isolei de todos do orfanato. Meu pai queria que eu o continuasse o ajudando, fingi que concordei com aquilo e prometi a mim mesmo que iria fugir daquele lugar – disse Dante. – Por um ano eu fiquei estudando todo o tipo de magia e criaturas em busca de algo que pudesse libertar a Lilian e eu achei um feitiço... mas eu não podia simplismente a destransformar, teríamos que sair daquele lugar se quisessemos sobreviver, então eu bolei um plano.
Dante fez uma breve pausa para respirar fundo.
– Então eu fui escondido até onde Lilian estava no meio da noite, garantindo que todos já estivessem dormindo e a transformei de volta – disse Dante. – O feitiço consistia em apagar e trancar todas as memórias e conhecimento que ela tinha sobre o mundo mágico. Assim que o fiz e vi que havia realmente dado certo, eu fugi dali com ela.
– A Beatrice não se perguntou onde estava? – perguntei.
– Ela ficou desacordada por dias – disse Dante. – Eu planejei irmos para bem longe, não tinha um rumo ao certo. Nem lembro direito como viemos parar em Nova York... tão longe do orfanato... eu só sei que assim que chegamos, precisava procurar um lugar seguro urgente e que lugar seria mais seguro para dois adolescentes do que ela escola? Eu não sei explicar, mas a Nostradamos parecia... me chamar assim que passei em frente aquela escola... então eu manipulei os funcionários para que pensassem que somos estudantes e o resto você já sabe.
– Te chamar? – perguntei.
– Sim, como uma aura familiar... – disse Dante. – Agora que as coisas mudaram drasticamente, eu consigo entender que o que eu senti foi vocês.
– Como assim? – perguntei.
– Você, Joui, Cesar e sua amiga Agatha – disse Dante. – Eu senti a aura mágica em vocês, é basicamente o mesmo processo que um monstro para rastrear os semideuses... só os monstros sentem de fato o cheiro do sangue divino.
Eu não soube o que dizer, apenas continue em silêncio.
– Mas talvez eu seja um monstro mesmo. Eu causei tanta dor as pessoas que eu amo...
– Ei, olha pra mim – me afastei o suficiente para conseguir olhá-lo e segurei seu rosto. – Você é a pessoa mais doce e inteligente que eu conheço. Não é um monstro, você é um herói.
– A onde eu sou um herói? – disse Dante. – Eu tranquei as memórias da minha própria irmã, não posso nem permitir que ela se lembre. Se ela souber, vai voltar a se tornar aquela coisa... eu a amaldiçoei.
– Não, você a salvou – disse eu. – Assim como salvou nossa equipe diversas vezes. Você é uma pessoa boa, Dante.
– Você parece sempre saber o que dizer para animar as pessoas – Dante sorriu, seus olhos brilhavam como duas safiras. – Obrigado.
– Que bom que passo essa impressão, porque eu não faço a menor idéia do que estou fazendo – brinquei, tentando disfarçar a timidez.
– Você tá com vergonha, Arthur? – Dante me perguntou, um sorriso ladino se formou em seu rosto.
– O que? – disse sentindo minhas bochechas esquentarem. – Não, acho que só estou a tempo demais no sol.
– Uhum, claro – Dante se inclinou em minha direção, nossas testas se tocaram. – Então, se eu fizer isso você não vai se importar, certo?
– O que... eu... eu não... – resolvi calar minha boca, já completamente derrotado pelo olhar do loiro em mim.
Dante se aproximou ainda mais, conseguia sentir sua respiração quente se misturar a minha.
Meu cérebro simplismente parou de funcionar. Percebendo o que estava prestes a acontecer, fechei os olhos, uma mistura de ansiedade e nervosismo subiu pelo meu corpo.
Senti as mãos de Dante em meu rosto e, então, o filho da puta simplesmente soltou uma risada anasalada e se afastou.
– Dante? – pisquei algumas vezes, confuso.
Me deparei com um largo sorriso estampado no rosto do loiro.
– Ei! Você não pode simplesmente ameaçar me beijar e sair como se nada tivesse acontecido! – disse irritado.
– Desculpa, eu queria ver se você ia comprar a idéia – ele voltou a se aproximar, dessa vez, sua boca parou perto de meu ouvido. – Quem sabe no nosso encontro eu não te beije de verdade?
Esse é o Karma por ter enchido o saco do Cesar por semanas por conta do Joui? Justo agora universo!
– Nossa, então tá – fingi está bravo, mas não consegui esconder meu sorriso. – Eu nem queria mesmo.
Dante riu e disse:
– Falado sério agora, obrigado por ter me ouvido.
– Eu que tenho que agradecer por você ter confiado em mim – beijei a bochecha do loiro. – Você é incrível, eu realmente espero que isso que nós temos dê em algum lugar.
– Eu também espero – Dante beijou minha testa tímidamente.
Apesar de tudo, foi bom poder conhecer outros lados de Dante por trás de seu semblante quieto e tímido. Ele parecia agora tão a vontade com a minha presença quando sinto com a dele.
_________________________________________
Oi de novo. Tenho uma novidade pra vocês.
irei começar a escrever outra AU simultaneamente com essa (a próxima atualização provavelmente será o primeiro capítulo dessa fanfic) que será basicamente uma fanfic do força G mas provavelmente não do jeito em vocês estão imaginando.
Só isso mesmo, até a próxima =D
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Segredo No Acampamento
FanfictionDeuses são reais. Todas as criaturas mitológicas são protegidas aos olhos mortais através da Névoa, porém, tudo tem suas brechas: semideuses, os descentes meio mortais dos deuses gregos. Seres extremamente poderosos e ao mesmo tempo tão vulneráveis...