Joui - Acampamento Meio-Sangue

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Depois de termos assimilado que o diretor do acampamento na verdade era Dioniso, o deus do vinho, começamos o passeio.
Thiago falava com entusiasmo das coisas incríveis que o acampamento oferecia.
– O treinamento serve para nos preparar para o mundo lá fora. Aqui nós aprendemos arco e flecha, luta com espadas, temos a parede de lava, equitação de pegados, luta contra monstros na floresta...
– Luta contra monstros? – perguntei. – Tipo... uma Benevolente?
– Exatamente – disse Thiago. –, mas não se preocupe, não temos nenhuma delas na floresta.
– Existem coisas bem piores nesse mundo do que Benevolentes – avisou Elizabeth. –, nós temos que estar preparados para enfrentar todo e qualquer tipo de monstro.
– Pera, você está dizendo que a gente vai ter que lutar contra coisa pior do que aquelas coisas? – gaguejou Arthur.
– Quando você é um meio-sangue, aprende a se acostumar com isso – disse Elizabeth. – Com o treinamento certo, vocês irão sobreviver.
– Que animador – disse Cesar em um tom irônico – o que é um meio-sangue, afinal? O que nós somos?
– E porque eu não posso ficar no mesmo chalé que Joui e Cesar? – perguntou Arthur.
– Porra, mano, eu não acredito que o Veríssimo deixou isso pra gente explicar – disse Elizabeth.
– Calma, minha querida, depois de tudo que eles viram, vão acreditar numa boa. – disse Thiago passando o braço em volta do pescoço da namorada.
Ela inspirou fundo.
– Arthur, nós não podemos simplesmente escolher nossos chalés – Elizabeth explicou. – Depende de quem são seus pais.
– Minha mãe se chama Ivete, ela é barista... – disse Arthur.
– Não, não é isso que eu quis dizer – respondeu Elizabeth sem paciência.
– Seu pai ausente – disse Thiago – Depende de quem é o seu pai ausente.
–Ele está morto, não cheguei a conhecê-lo – disse Arthur.
Elizabeth inspirou fundo novamente.
– Seu pai não tá morto, os pais dos outros dois também não estão.
– Como você sabe? – perguntei. – Você conhece nossos pais?
– É claro que não
– Então como pode dizer... - comecei.
– Porque eu conheço vocês – disse Elizabeth. – Não estariam aqui se não fossem um de nós.
– Você não sabe nada sobre a gente – respondeu Cesar.
– Não? – a morena ergueu uma sobrancelha. – Aposto que vocês ficaram passando de escola em escola e que foram expulsos de várias delas.
Cesar arregalou os olhos.
– Como...
– Tiveram diagnóstico de dislexia e provavelmente de TDAH também – disse Thiago.
– O que isso tem a ver? – perguntou Cesar.
– Tudo junto, é quase um sinal certo. As letras flutuam para fora da página quando vocês lêem, certo? Isso é porque suas mentes estão fisicamente programadas para o grego antigo, e o TDAH... vocês são impulsivos, isso são seus reflexos de batalha, numa luta real, eles os manterão vivos – explicou Elizabeth. – Quanto aos problemas de atenção, isso é porque vocês enxergam demais, é claro que os professores querem que vocês sejam medicados, a maioria deles são monstros, não querem que vocês os vejam como são
– Você... vocês dois passaram pelas mesmas coisas? – perguntei.
– A maioria dos campistas daqui passou – disse Thiago. – Se não fossem como nós, não teriam sobrevivido a Benevolente, e muito menos a Degolificada.
– Encarem os fatos, vocês são semideuses – disse Elizabeth.
– Semideuses? – perguntou Arthur.
– Sim – disse Thiago. – Lembra do símbolo de Apolo em sua cabeça? Aquele é o símbolo do seu pai, ele te reclamou antes mesmo de você saber quem é.
– Vocês estão nos dizendo que nossos pais são deuses? – perguntei.
– Sim – Thiago e Elizabeth responderam juntos.
– Quem são os pais de vocês, então? – perguntou Cesar.
– Minha mãe é Atena, deusa da sabedoria e da estratégia de guerra – disse Elizabeth.
– A minha mãe é Afrodite, deusa do amor e da beleza – disse Thiago.
– E então... meu pai é Apolo, deus da música, do sol e de mais trinta coisas... – disse Arthur.
– Até que enfim caiu a ficha – disse Elizabeth.
– Tá, mas... e os nossos pais? – perguntei me referindo a mim e a Cesar.
Thiago sorriu.
– Acho que já tá na cara que você tem essa resposta, Jojo.
– Não, não está – disse Elizabeth. – Ele ainda é indeterminado.
– Eu reconheço um irmão meu quando vejo – insistiu Thiago.
– Na verdade... eu moro com minha mãe, então suponho que meu pai seja um deus – disse eu.
Thiago pareceu desapontado mas logo voltou a sorrir.
– Não se preocupe, você será reclamado em breve, acho que até o jantar – disse Thiago. – Ou no Captura a Bandeira,  muita gente é reclama enquanto joga também.
– Tá e eu? – perguntou Cesar – Vocês sabem quem é meu pai?
– Eu não sou o Oráculo de Delfos, meu querido – disse Elizabeth. – Você ainda não manifestou nenhum poder para conseguirmos deduzir, acho que terá que esperar igual seu amigo para saber.
Manifestar poderes... me lembrei da situação na escada, de como Cesar ficou irritado e claramente teria partido para cima do Gabriel se o chão não tivesse rachado... bem na hora que ele iria fazer algo.
– Na verdade, Elizabeth... – disse eu.
– Pode me chamar de Liz – interrompeu ela.
– Ah, ok – disse eu. – na verdade, Liz-Sempai, acho que eu vi ele...
– Ah, vocês devem ser os novatos.
Olhei para trás. Um garoto negro, mais ou menos da minha idade, com os cabelos bem curtos vinha em nossa direção. Ele era bem forte e sua postura era rígida, parecia com aqueles garotos de escola militar (os que vão lá porque realmente querem).
– Oi Lu – cumprimentou Thiago.
– Eles são os três novatos que o Tristan não para de falar, não é?
– Eles mesmo – respondeu Thiago.
– Muito prazer, eu sou o Luciano – o garoto se apresentou – bem vindos ao acampamento Meio-Sangue
– Obrigado Luciano-Kun – agradeci.
– Vocês já foram reclamados? – perguntou Luciano.
Liz logo interviu. Ela se pôs na nossa frente, como se tentasse nos proteger. Já percebi que Elizabeth não se dava bem com o garoto, ou no mínimo não gostava dele.
– Porque está tão interessado nisso? – perguntou ela.
– Ué? Pelo mesmo motivo que o Tristan e minha irmã estão ansiosos para saber, quando você encontra seu pessoal, você encontra seu lugar aqui.
– Eu sou filho de Apolo e você? – disse Arthur animadamente.
– Sou filho de Ares, o deus da guerra – diss Luciano. – Vocês já conhecem minha irmã, a Agatha.
– A Agatha é filha de Ares? Que legal! – disse Arthur.
– Eu e o Cesar ainda não fomos reclamados – disse eu. – meu nome é Joui.
– Na verdade, a gente estava discutindo sobre os pais deles agora pouco – disse Thiago.
Liz olhou para o namorado apreensivo. Eles pareciam ter uma discussão silênciosa. Thiago assentiu com a cabeça, como se dissesse "está tudo bem". Liz suspirou, vencida.
– É verdade. – disse ela. – Sobre o que você estava falando, Jou?
– Então, o Cesar... – tentei continuar, mas novamente fui interrompido.
– E aí, gente! Bom dia!
Essa voz carismática e cativante era impossível de se esquecer. Tristan vinha junto a um garoto loiro muito bonito.
– Deuses, desse jeito nunca vamos acabar isso – resmungou Liz. – hoje é dia de Captura a Bandeira, eu tenho que me preparar.
Thiago riu, abraçou a namorada pela cintura e deu um selinho demorado na garota.
– Relaxa, minha querida, vai dar tempo de fazer tudo, ainda é cedo.
Todos se apresentaram novamente.
– Mais um filho de Apolo! Mais alguém pra me ajudar a irritar a Liz com a cantoria na fogueira! – disse Tristan. 
– Ei! – exclamou Liz.
– E você Tristan? Quem é seu pai? – perguntou Cesar.
– Eu sou filho de Poseidon, o deus dos mares.
– Que descolado! – disse eu.
Tristan riu.
– Pois é – disse Tristan sorridente. – Sou o único filho de um dos Três Grandes no acampamento atualmente.
– Três Grandes? – perguntei.
– Zeus, Poseidon e Hades. – disse Nathaniel, o loiro que veio junto de Tristan. – Eles não tem filhos a muito tempo, até o pai do Tristan quebrar o juramento.
– Que juramento? – perguntou Arthur.
– A muito tempo, Zeus recebeu uma profecia que dizia que um filho dos deuses antigos poderia ser a destruição ou a salvação do Olimpo – disse Nathaniel. – Por causa disso, os Três Grandes fizeram um juramento de que não iriam mais ter filhos, mas não tem como escapar de profecias... o Tristan nasceu e deu uma confusão tão grande que os deuses literalmente votaram para ver se deixavam ele vivo ou não.
– A maioria votou contra me matar, graças aos deuses – disse Tristan olhando para os céus.
– Eles não vão querer matar a gente também não, né? – perguntou Cesar se encolhendo ao meu lado.
– Não – tranquilizou Luciano. – Pelo menos, não pelos mesmos motivos que o Tristan.
Arthur engoliu em seco.
– Desculpe, não queria assutar vocês – disse Luciano. – só tentarem não aborrecer nenhum deus que vocês vão ficar bem.
– Mas e se a gente acabar irritando algum deles? – perguntou Arthur. – É morte certa?
Tristan e Luciano começar a tentar acalmá-los desesperadamente.
Nathaniel chegou do meu lado para falar comigo.
– Fiquei sabendo que você derrotou uma Benevolente, é verdade? – pergutou Nathaniel.
– É, acho que sim... – disse eu.
– Incrível! Você deve ser bem poderoso – disse o loiro.
– Acho que foi mais por sorte, mesmo – disse eu.
– Bom, no mínimo você deve ser bem ágil – disse ele. – Só espero que não seja filho de Hermes.
– Porque não? – perguntei.
– Você seria meu irmão – disse ele.
– E isso é uma coisa ruim?
– Dependendo do ponto de vista, sim... se você fosse meu parente, seria errado tentar te chamar pra sair.
Ergui uma sobrancelha. Eu estava inventando coisas ou ele realmente estava dando em cima de mim?
Olhei para trás sem saber o que fazer. Eu vi Thiago e Tristan se matando de rir de alguma coisa que Arthur tinha dito, Liz e Cesar olhavam Nathaniel com uma cara de poucos amigos enquanto cochichavam entre si (bom, pelo menos, eles estavam se dando bem agora). Luciano havia ido embora.
Acho que Cesar percebeu a situação. Ele veio em minha direção e me abraçou. Fiquei surpreso, ele só me abraçava bem de vez em quando e nunca era na frente de outras pessoas. Apesar de não poder me olhar, tive certeza que meu rosto estava corado.
– Acho melhor nós irmos, a Liz tá com uma cara de que vai matar todo mundo se não formos logo. 
– Você tem razão, Cesar-Kun – disse eu. – Tchau pessoal. 
– Tchau! Estejam preparados para o Captura a Bandeira, quero vocês no meu time – disse Tristan.
– Pode deixar – disse Arthur. 
– Obrigado – falei em voz baixa para Cesar.
– Não gostei daquele cara – disse Cesar emburrado.
– O Nathaniel? – perguntei. – Porque?
– É que... – vi suas bochechas tomarem uma leve coloração avermelhada. – a Liz me falou que ele não é confiável.
– Ele parece ser legal – disse eu.
– Ok, o que tá rolando? – Arthur se aproximou de nós.
– O Nathaniel deu em cima de mim e o Cesar tava tentando me ajudar – disse eu.
– Sei... pra mim o Cesar tava é com... – Arthur foi interrompido pela mão de Cesar em sua boca.
– Vamos logo, a Liz e o Thiago já estão lá na frente – disse Cesar.
Nós coversavamos com nossos guias enquanto andávamos.
– Na moral, rapaziada, vocês são lerdos mesmo – disse Thiago. – Se conhecem a seis anos e nunca acharam estranho o fato de todos vocês terem TDAH e dislexia, não conhecerem seus pais biológicos e terem o histórico de serem expulsos de várias escolas?
– A gente achava que era uma grande coincidência, mas no fundo sabíamos que isso não tinha como ser um simples acaso – respondeu Arthur.
– Deve ter sido o efeito da Névoa sobre eles – disse Liz.
– Névoa? – perguntei.
– Ah sim, a Névoa é uma espécie de véu que separa o mundo dos mortais com o mundo mágico, as mentes mortais não conseguem processar coisas estranhas como deuses e monstros, então, a Névoa constrói realidade, faz os mortais enxergarem tudo de uma forma que consigam entender – explicou Elisabeth. – É como se seus olhos simplesmente não notassem esse vale, semideuses também podem ser afetados por ela, os monstros que se infiltram em escolas, por exemplo, se passando por humanos, a Névoa pode influenciar a memória, ou mesmo criar lembranças que nunca aconteceram.
– Então é isso que aconteceu com a professora Fátima, nossa professora de inglês, ela era uma... Benevolente? – disse Cesar. – É assim que se fala?
– Isso, benevolentes – disse Liz. – são como devemos chamá-las, seus nomes verdadeiros não devem ser pronunciados nem aqui.
Busquei na minha memória as aulas de mitologia com Veríssimo.
– Quer dizer, as F-Ú-R-I-A-S? – soletrei com dificuldade.
– Isso – disse Liz rindo.
– Jou, o que você ia falar sobre o Cesar naquela hora? – perguntou Thiago.
Contei para eles como o chão da Escola Nostradamos havia se rachado depois que Gabriel me empurrou da escada.
– Você acha que eu fiz aquilo? – perguntou Cesar surpreso.
– Sim. – respondi. – Você consegue ser bastante... intenso quando se trata de nos proteger.
– Faz sentido – disse Arthur, sua expressão era pensativa.
– Nunca vi nada parecido – disse Liz. – Acho que o Cesinha pode ser mais poderoso do que parece...
– Ei! Tava me substimando, é? – perguntou Cesar.
– Um pouco – confessou Liz.
Thiago apontou para o pavilhão. Explicou que sobretudo o Acampamento Meio-Sangue era um acampamento de férias, mas que alguns campistas ficavam ali o ano inteiro, e eram tantos chegando que o lugar agora estava sempre lotado, até no inverno.
Subimos a Colina Meio-Sangue até os limites do acampamento. De lá dava para ver tudo: grandes bosques a nordeste, a praia, o riacho, o lago de canoagem, campos verdejantes e os chalés que formavam a letra grega ômega (Ω), com um grande centro e dois anexos nas extremidades.
Eram ao todo vinte chalés.
– O vale está protegido do olhar dos mortais – disse Thiago. – O clima também é controlado, cada chalé representa um deus grego.
– Vocês tem quinze anos, não é? – perguntou Liz – Que nem a Agatha.
– Isso mesmo e vocês? – disse Arthur.
– Dezesseis – respondeu Thiago.
– Isso é estranho, semideuses costumam ser reclamados aos treze – disse Liz. – Esse é o trato.
– Trato? – perguntou Joui.
– É, nós fizemos um acordo com os deuses – disse Liz. – Bem, é uma longa história... mas eles se comprometeram a não ignorar mais seus filhos semideuses, a reclamá-los quando eles completassem treze anos, algumas vezes demora um pouco, mas vocês viram que o Arthur foi reclamado assim que vocês chegaram na Casa Grande hoje de manhã, deve acontecer a qualquer momento.
– Você e o Thiago que fizeram esse acordo? – perguntou Artur.
– É, a gente tava lá – respondeu Liz.
– E porque aos treze anos? – perguntou Cesar.
– Quando mais velhos vocês ficam, mais facilmente são notados pelos monstros – disse Thiago – Isso normalmente começa por volta dos treze anos, então, enviamos protetores sátiros às escolas, para encontrá-las e trazê-los ao acampamento antes que seja tarde demais.
– Sr. Veríssimo nos disse que a Nostradamos era uma exceção, não tinha protetores lá, somente Agatha – disse eu. – Porque não enviaram um sátiro depois que nos descobriram?
– Não sei – respondeu Liz.
– E porque a Nostradamos não tinha nenhum sátiro? – perguntou Cesar.
– Bom, exitem alguns lugares que a manifestação de monstros do Mundo Inferior é tanta, que chega a ser perigoso até para sátiros, apesar de eles não terem alma mortal e reencarnem em plantas, nunca é bom arriscar a vida de ninguém até saber se realmente vale a pena – disse Liz. – Mas se querem saber minha opinião, a mãe da Agatha tem um dedo nisso, ela enlouqueceu a muito tempo, eu não me dou muito bem com a Agatha...
– Já vi que você não se dá bem com várias pessoas – Cesar a cortou.
– Mas sei que ela pode estar em perigo por causa da Ingrid, acho que ela está envolvida com a troca de corpo também – concluiu Liz ignorando completamente o comentário de Cesar. 
– Eu acho que a Ingrid, a mãe da Agatha, enlouqueceu quando foi rejeitada como Oráculo de Delfos – contou Liz.
– Como assim? – perguntei. – O que é esse Oraculo?
– O Oráculo de Delfos é como se fosse um cargo, quem abriga o espírito de Delfos se torna o orador das profecias – explicou Thiago. – As profecias são o que nós instrui nas missões, ele era passado de pessoa para pessoa, quando a última portadora do espírito morreu, tentamos colocá-lo em outra pessoa...
– O Oráculo sempre é uma mortal que é capaz de ver através da Névoa – continuou Liz. – A mãe da Agatha se encaixava em tudo, mas algo deu errado no processo, ela saiu de lá completamente perturbada e sem o espírito de Delfos.
– E agora temos que ir falar com um cadáver em decomposição para conseguirmos ir em missãoes – finalizou Thiago.
– Nós nunca chegamos a ver a portadora viva, mas estávamos no dia que Ingrid iria se tornar o Oráculo – explicou Liz. – Desde o incidente, estamos investigando o que deu errado, e ninguém mais pode tentar se tornar um portador, não iremos arriscar até que esteja totalmente seguro.
– Caralho – disse Cesar.
– Mas vai ficar tudo bem, vocês tem amigos aqui – disse Thiago indicando a si mesmo e a Liz. – Já vivemos muita coisa estranha, nos entendemos melhor do que ninguém mais no mundo, enquanto estivermos todos juntos vamos conseguir resolver qualquer situação, não precisam se preocupar com isso.
– Bom, vocês contaram muita coisa sobre vocês, mas nós mal contamos sobre nós – disse Liz.
Thiago pareceu surpreso pela iniciativa de Liz.
– Eu sou uma das campistas que passa a maior parte do tempo aqui, já fui expulsa de quatro escolas no mesmo ano, apesar disso, eu sempre gostei de ir a escola, pra mim, quando mais conhecimento eu puder ter, melhor. – disse Liz. – Sua vez Thi.
– Tá bom – disse ele sorrindo. – Um fato interessante sobre mim: além de me meter em brigas normais de escola, eu roubava coisas, bom, na verdade, não exatamente roubava.
– Sua família é pobre? – perguntei.
– Nem um pouco – disse Thiago. – Eu sou filho do Arnaldo Fritz, aquele ator sabe?
– Mentira! – disse Arthur.
– Eu sabia que já te conhecia de em algum lugar! – exclamou Cesar. – Meu padrasto é o Cristopher Cohen, um dublê, conheci seu pai em algum dos eventos que ele me obriga a ir, vi você lá.
– Sério? – ele encarou Cesar. – Não me lembro de ter te visto antes...
– Do jeito que você é avoado, é capaz de terem passado o dia conversando e não se lembra – disse Liz.
Thiago fez uma falsa expressão de ofensa.
– Eu só o vi de longe, nunca havíamos parado para conversar – disse Cesar.
– Mundo pequeno esse, não? Quanta coincidência nós dois sermos semideuses – disse Thiago.
– Coencidência até demais... – comentou Liz.
– Você que é noiada com tudo, acasos acontecem – disse Thiago despreocupado.
– Bom, o que você estava dizendo antes? –  Cesar perguntou voltando ao assunto. – Você roubava as pessoas?
– Então, eu só pedia as coisas e as pessoas me entregavam, ninguém acreditava em mim, mesmo as pessoas que eu roubava, ficavam constrangidas e negavam tudo. 
– Que doido – disse eu confuso.
Liz deu uma risada.
– É uma habilidade de semideus: o charme de Afrodite – disse ela. – ele tem uma capacidade de persuasão incrível, literalmente, as palavras dele tem magia.
– Gente, amei, também queria ser filho de Afrodite – disse Cesar.
– O pessoal subestima demais o chalé 10 – disse Thiago convencido.
– Concordo – disse Liz.
– Sem querer parecer inconveniente, mas vocês estão juntos a quando tempo? – perguntei.
– A pouco mais de um ano – respondeu Liz. – Eu e Thiago chagamos no mesmo ano aqui, fomos melhores amigos por muito tempo, na verdade só acrescentamos um título, somos melhores amigos e namorados.
– Que fofos – comentou Arthur.
– Vamos continuar andando, vocês vão precisar de armas para o Capture a Bandeira de hoje – disse Liz segurando a mão de Thiago.
– Que tipo de pega a bandeira precisa de armas? – disse assustado.
– O nosso – respondeu Thiago. – É divertido, vocês vão ver, pode ficar tranquilo, ninguém vai machucar muito, o acampamento é uma bagunça muito bem organizada, ninguém deixaria a gente ir lá pra se matar.
– Vocês não precisam só usar armas – disse Liz. – Podem usar seus poderes, itens mágicos... além do principal para a vitória: estratégia.
Nós continuamos o passeio. No gramado central, um grupo de campistas estava jogando basquete.
– O chalé de Apolo – disse Thiago. – Seus irmãos, Arthur.
Os olhos de Arthur pareciam brilhar.
Passamos pela fogueira ao centro de tudo.
– Meu chalé é aquele aqui – disse Liz apontando para a construção mais próximo. – Número 6.
O chalé de Atena era cinza, com uma coruja entalhada no alto da porta, que estava aberta. Dava para ver as estantes de livros, o mostruário de armas e a lousa digital.
Nós seguimos contornando o chalé até um grande galpão de metal: o Arcenal.
Lá dentro tinha todo o tipo de armas, de espadas e lanças a tacos.
– Todo semideus precisa de uma arma – disse Liz. – Hefesto confecciona as melhores, mas também temos uma boa seleção aqui. Atena é sinônimo de estratégia: encontrar a arma perfeita para a pessoa certa. Vamos ajudar vocês.
– Na verdade – lembrou ela. –, Joui não precisa procurar, sr. Veríssimo de deu uma arma, não deu? 
Eu tirei a caneta esferográfica que Veríssimo havia me entregado.
– Isso aqui? – perguntei.
Ela assentiu.
– Tire a tampa – disse Liz.
E assim eu fiz.
Derrubei a espada assim que ela se transformou.
Era uma katana. Sua base era rosa e tinha gravado nela em japonês "ジョー". Ela tinha marcas espirais pretas por toda a lâmina.
– O que está escrito aí? – perguntou Arthur.
Peguei a katana do chão, com cuidado.
– "Joe" – disse eu.
– Um a menos, faltam dois – disse Thiago sorrindo – Eu dou aulas de esgrima, te ensinarei, com muito prazer, a usar isso daí.
– Muito obrigado, Thiago-Sensei. – agradeci.
Liz arranjou um arco para Arthur. Ela disse que como filho de Apolo, seria ideal para ele esse tipo de arma.
– Vamos ver... – ela escolheu um com detalhes em verde – O que acha desse?
– Perfeito! – disse Arthur. – Obrigado Liz.
– Tenho certeza que irá aprender bem rápido. Afinal, seu pai é deus do arco e flecha. – disse Liz.
– Agora o Cesinha – ele já estava com uma arma na mão quando Liz se virou para vê-lo.
Me aproximei para ver o que ele tinha escolhido.
– Porque tem um estilingue jogado no meio das armas? – perguntou Cesar.
– Não é um estilingue, é uma funda – disse Liz.
– Nome chique para estilingue – concluiu examinando o objeto.
A arma era detalhada em roxo.
– Eu acho que eu não vou me dar muito bem com combate corpo a corpo... – disse Cesar.
– A funda é perfeita para isso, você atira de longe – disse Liz. – Acho que vai se dar bem com ela.
Ele deu de ombros.
– Vou ficar com essa, então.
– Vamos em frente – disse Thiago.
Saímos do local, levou bem menos tempo do que achei que levaríamos lá dentro.
O chalé 8 era todo prateado e brilhava como uma lua.
– Ártemis? – perguntou Arthur. – Minha tia.
– Muito bem. As aulas com o sr. Veríssimo fizeram efeito – disse Liz.
– Ártemis é a deusa da lua, da caça, mas não tem campistas ali. A deusa jurou a virgindade eterna, não tem filhos. – explicou Thiago.
– Mas existem as Caçadoras de Ártemis – Liz acrescentou. – Elas nos visitam, às vezes, são servas da deusa. Um bando de garotas imortais que se aventuram juntas por aí, caçando monstros e coisas do tipo.
– Elas se tornam imortais? – perguntou Arthur.
– A menos que morram em combate ou quebrem seus votos – disse Liz.
– Sabiam que elas já perguntaram se a Liz queria entrar pras Caçadoras? – disse Thiago.
– Sério? – perguntei.
– Quando ainda não estávamos juntos, elas vieram aqui, fiquei morrendo de medo dela aceitar – disse Thiago rindo.
– Confesso que foi uma oferta tentadora, mas quando percebi que teria que deixar o Thiago desisti – disse Liz.
Thiago abriu um sorriso ladino.
– Você já gostava de mim naquela época, é?
– Talvez... – disse Liz.
Passamos pelo chalé seguinte, o número 10, decorado com cortinas de renda, porta cor de rosa e vasinhos de cravos nas janelas.
– Nossa, é pra cá que as supermodelos vêm quando morrem? – disse Cesar.
– Respeita meu chalé, sou o conselheiro chefe de lá – disse Thiago. – Eles não são ruins, converse por três minutos com a Clarissa que você vai ver.
– Vamos seguir em frente – disse Liz segurando a mão de Thiago e o levando consigo.
Demos uma olhada nos outros chalés. Fomos até o chalé de Deméter, deusa da agricultura. Hécate, deusa da magia.
– No começo eram só os doze olimpianos – explicou Thiago. – mas incluimos outros deuses que não tem trono no Olimpo: Hécate, Hades, Íris...
– Zeus e Hera. Rei e rainha dos deuses. – disse Liz
O grupo seguiu naquela direção. O chalé de Zeus parecia a sede de um banco. Revestido de mármore branco, com grandes colunas na frente e reluzentes portas de bronze com raios decorando seus brasões.
Hera tinha um chalé menor, mas no mesmo estilo do que o de Zeus, exceto pelas portas, cujo brasões tinham o desenho de penas de pavão e reluziam em várias cores.
Ao contrário do outros, que eram barulhentos e estavam abertos, em plena atividade, os chalés de Zeus e Hera pareciam fechados e silênciosos.
– Os dois estão vazios? – perguntei.
Liz fez que sim com a cabeça e disse:
– Zeus ficou muito tempo sem ter filhos, Hades também, suas proles podem ser muito perigosas, mas Poseidon não pareceu se importar com isso.
– O Tristan é perigoso? – perguntou Arthur.
– Os poderes dele, se não fosse ensinado como usar corretamente, podem ser perigosos – respondeu Liz.
– Verdade, quando o Tristan chegou aqui, ele virou todas as canoas do lago com uma onda gigante e quase inundou a praia também – disse Thiago.
– E se nós não conseguirmos controlar nossos poderes? – disse eu. – e se eu machucar alguém?
– Relaxa, Jojo, não acho que vá acontecer algum incidente como o das canoas – disse Thiago. – Você vai aprender a controlar.
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Vocês não tem noção do quanto eu amei tanto escrever esse capítulo.
O que foi curto no capítulo do Arthur, eu recopensei tudo aqui kkk.

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