Cesar - O Hotel

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Todos já haviam aceitado o fato de que passaríamos uns dias em Santo Berço, estávamos exaustos e querendo ou não, o hotel seria uma das únicas oportunidades de descansarmos de verdade durante a missão. Ao entrar no quarto, fiz questão de trancar a porta, eu que não aí arriscar a menininha que não é uma criança de verdade entrar no meio da madrugada com uma faca falando que é minha filha ou seja lá o que ela fazia.
– Cesar! – a voz de Arthur me chamou.
Abri a porta rapidamente.
– Oi, aconteceu alguma coisa? – perguntei.
– Só vim dar boa noite mesmo – disse ele.
– Boa noite – disse eu. – Qualquer coisa grita.
– Tá bom – disse Arthur e saiu andando em direção ao quarto de Dante, supus que iria desejar boa noite também.
Joguei minha mochila num canto e me deitei, tentei ficar acordado o máximo de tempo possível, o que não foi muito, eu realmente estava cansado. Não tive nenhum sonho, como Hoteleiro havia falado que aconteceria, mas uma voz familiar ecoou na minha cabeça, um grito. Pulei da cama assustado. Tinha vindo de algum lugar no hotel.
– Alô? – ouvi alguém dizer.
– Arthur? – perguntei.
– Foi você quem fez esse barulho? – perguntou Arthur.
– Não! – gritei de volta.
– Será que os outros estão bem? – ele me perguntou.
– Eu tô bem! – ouvi Beatrice gritar.
– Eu também! – disse Dante.
– Deve ter sido alguém do andar de baixo – concluí.
– A gente não devia ir verificar? – perguntou Dante.
Tive um dejavu da noite em que deixei a escola Nostradamos. 
– Não! – disse eu. – Vamos tentar dormir, se escutarmos qualquer coisa de novo, vamos ver o que é.
Para que eu fui falar? Escutei passos no corredor, uma porta sendo aberta e pessoas conversando. No primeiro andar, consegui ouvir um grande estrondo, mais passos e a voz da Liz abafada.
– O que tá acontecendo? – perguntou Beatrice.
– Não saiam do quarto! – disse eu.
– Eu não estava pensando em sair – disse Arthur.
Fui em direção a porta, a destranquei e abri bem devagar. No final do corredor, tinha uma porta entreaberta, uma fonte de luz saia de dentro do local.
Caminhei lentamente, tentando ser o mais discreto possível, e olhei pela fresta da porta. Aquilo era impossível, não podia ser verdade, eu devia estar sonhando, não tinha como isso estar acontecendo.
Dentro do quarto, haviam três pessoas: um homem alto e magro de cabelos castanhos e olhos azuis, ele tinha a pele bem pálida; um homem com cerca de dois metros de altura, cabelo e barba longos e brancos, seus braços musculosos tinham tatuagens tribais, o reconheci na hora como Brúlio, o tio do Arthur; por último, uma mulher de olhos e cabelos escuros, era impossível não a reconhecer.
O homem de olhos azuis me notou.
– Olha quem está aqui, Cláudia – disse ele.
– É meu filho! – ela veio em minha direção sorrindo.
Continuei parado.
– Cesar? Que vozes são essas? – ouvi Dante perguntar.
– Pelo visto, seus filhos também estão aqui, Oliver – disse minha mãe.
– É normal do Gaspar desaparecer, ele sempre foge, tudo para "proteger sua doce irmãzinha" – zombou Oliver.
– Não saiam do quarto! – disse enquanto dava alguns passos para trás.
– Você saiu? – Arthur pareceu indignado.
– Tá se escondendo, Arthur? – o suposto Brúlio disse.
– Arthur, eu sei que você está ouvindo a voz do seu tio, mas não é ele – eu tentei fechar a porta, por algum motivo, ela pareceu bem mais pesada na minha mão.
Brúlio segurou a porta e a abriu totalmente.
– O que você dizia? – perguntou Brúlio.
Saí correndo de volta ao quarto, mas a porta, que eu havia deixada entreaberta, estava trancada. Tentei procurar a chave em minhas roupas, mas lembrei que havia a deixado na minha mochila.
– Parece que seus filhos são covardes que nem os meus – disse Oliver.
Minha mãe andou até o corredor.
– Cesar – ela me chamou. – Você não vai falar comigo?
Sai correndo pelo corredor em direção as escadas.
– Arthur, Dante, Bea, não saiam do quarto, não importa quem vocês ouçam, não saiam – disse enquanto corria.
– Você vai me deixar sozinho? – disse Brúlio em frente ao quarto de Arthur. – Você só tinha eu e a Ivete, nem isso conseguiu proteger e vai continuar sendo um covarde?
Olhei para trás, além de minha mãe, Oliver vinha atrás de mim.
Antes que eu pudesse prosseguir, dei de cara com a porta do quarto de Dante aberta, caí para trás com o impacto.
– Como você chegou até aqui? – Dante tinha seu livro em uma mão e na outra segurava sua adaga.
Oliver riu.
– Você achou que poderia me esconder da Lilian por quando mais tempo, filho?
– Eu não sou a porra do seu filho – Dante se colocou na minha frente. – Deixe eles em paz.
– Eu só acho que sua irmã merece saber o que você fez – Oliver deu alguns passos para frente. – Eu podeira a livrar da maldição, se você me deixasse chegar perto dela.
– Você não vai encostar em nem um fio de cabelo da minha irmã – Dante apontou a adaga para o homem.
– Dante? – ouvi a voz abafada de Beatrice. – O que está acontecendo? Você está bem?
– Beatrice, não sai daí, não importa o que aconteça comigo, não saia! – disse Dante.
– Hum... Dante e Beatrice... – disse Oliver. – Vocês sempre gostaram de Divina Comédia, uma boa escolha de indentidade falsa, mudaram o sobrenome também?
– Dante, do que ele está falando? – perguntou Beatrice.
Oliver encostou a mão na parede.
– Lily, minha adorável filha, não se preocupe com nada – e se virou para Dante. – Gaspar... é uma pena não ter aceitado minha oferta, poderia ter sido tão mais do que só um semideus qualquer.
– O quê? Um assassino? – respondeu Dante.
– Você desonra a família Galen falando desse jeito, nós somos grandiosos, poderosos, você e Lilian fazem parte de algo maior – continuou Oliver.
– Eu não quero fazer parte disso – disse Dante.
– E sua irmã? – perguntou Oliver. – Ela tem o direito de escolher e você tirou isso dela.
– Para... – a voz de Dante saiu trêmula. – Se ela se lembrar... ela não pode saber...
– Saber do quê? – a voz de Beatrice tinha um tom sério.
– Eu não posso te contar... – a voz dele saiu em um fio. – não isso...
Dante se virou para mim, ele tinha lágrimas nos olhos, sua expressão era de completo desespero.
– Cesar, vai embora, salve seus amigos lá embaixo – disse ele.
– Dante... – disse eu.
– Por favor – pediu ele.
Fiz o que ele pediu e me arrependi instantaneamente. Abandonei eles lá em cima, sem mais nem menos, mas era tarde demais para voltar atrás. Pulei o último degrau das escadas, Joui estava com sua katana na mão, o Hoteleiro estava ao seu lado com uma faca e uma besta pequena.
– Joui! – corri até ele.
– Cesar-Kun? – ele se virou para mim.
Ao me aproximar, vi Liz de olhos fechados agachada no chão e um homem negro usando um moleton amarelo, ele deveria ter por volta dos dezoito anos.
– Gente, o que está acontecendo aqui? – perguntei.
– Liz, é real – ouvi Joui dizer. – Você tem que acreditar em mim.
– Não é real, não é real... – ela repetia com suas foices apontadas para frente.
– Liz-Sempai, sou eu, confia em mim – Joui tentava a acalmar. – Não era real, mas é agora, precisamos lidar com ele.
– Espera... o que está acontecendo? – perguntei novamente. – Porque minha mãe tá aqui?
– A sua mãe tá aqui? – Joui pareceu preocupado.
Liz finalmente levantou a cabeça e abriu os olhos.
– O Alex que eu conheci nunca falaria essas coisas – disse Liz. – Ele era gentil e ele nunca jogaria a culpa em mim, apesar de eu me culpar por tudo que aconteceu!
– O Alex que você conheceu tá morto – disse o homem. – Você o tratou que nem lixo, ele se matou por sua culpa.
– Se você não é o Alex que eu conheci, então quem é você? – Liz foi para cima do homem com as foices.
Alex bateu com as costas na porta, mas o ataque não pareceu ter surtido efeito.
– Fazendo isso de novo, Liz? – disse ele. – Querendo me machucar?
Liz começou a chorar.
– Você destruiu uma vida – disse Alex.
– Você não é ele! – Liz se levantou.
– O Alex tinha medo de você – disse ele. – Só que agora, eu não tenho mais medo, tenho raiva. – Alex fechou um dos punhos e acertou o nariz de Liz, tive certeza que o quebrou.
– Liz! – Joui foi para cima do Alex e desceu sua espada no braço dele, o decepando.
– Cesar – ele me chamou. – Você tem que me escutar, aquela não é sua mãe, esse não é um homem de verdade, estamos sob o efeito de um monstro.
– Mais um amigo da Liz querendo me machucar, é? – disse Alex ofegante. – É só isso que vocês sabem fazer!
Joui apontou novamente a espada para ele sem dizer nada.
– É como eu te falei, Joui – disse o Hoteleiro. – Não tem muito o que possamos fazer.
– Hoteleiro, o quê caralhos tá acontecendo? – perguntei.
– Vocês estão sendo parasitados e... – disse ele. – eu não posso falar muito, mas temos que derrotar ele.
– Cesar, essas coisas aparecem a partir da culpa – explicou Joui. – Vocês tem que lidar com eles de uma maneira ou de outra.
– Como sempre, você está sendo inútil, não conseguiu nem ajudar seus amigos lá encima, saiu correndo que nem um covarde – olhei para trás e vi minha mãe no corredor.
– Não é a sua mãe – disse Joui. – Aquela não é a tia Violeta.
– Como não sou eu, Joui? – ela se aproximou.
– Cesar-Kun, ela não é real – Joui tentava me acalmar.
Hoteleiro segurou no ombro do asiático.
– Não é assim que iremos derrotá-los! Tem que esperar, deixe ele lidar com isso.
– Ok – disse Joui.
– Cesar, meu filho – me virei para olhá-la ao ouvir sua voz. – Você sabe que minha morte é culpa sua, não é?
– Porquê? – perguntei.
– Se você não tivesse nascido, nunca teria atraído aquele monstro para nossa casa – disse minha mãe. – Eu e seu padrasto poderíamos ter levado uma vida normal se não fosse por você.
Sinto as lágrimas escorrendo pelo meu rosto, e mais uma vez, não consegui fazer nada além desviar o olhar para baixo.
– A culpa é toda sua... – ela continuou. – Você sempre só foi um estorvo para todos, para mim, depois para seu padrasto e agora seus amigos. Você nem consegue me olhar nos olhos, como espera que irá derrotar o deus da guerra? Talvez até seja melhor você levar a culpa pelo roubo, pelo menos não atrapalhará mais a vida de ninguém se Zeus o eliminar. E você sabe muito bem disso.
Eu continuei parado.
– Eu tentei de tudo para te proteger, dei minha própria vida para isso e é assim que você agradece? Seu padrasto nunca quis seu mal, mas mesmo assim, você foge dele – disse ela. – Você sempre foge de tudo.
– Não... – foi a única coisa que consegui pronúnciar.
– Como não? Você vive fugindo do seu amiguinho ali atrás, continua negando seus sentimentos mesmo sabendo da verdade, porquê não conta para ele? – perguntou ela. – Fugiu antes que pudesse receber qualquer ajuda depois da minha morte, se fechou para o resto do mundo, para todos que quiseram te ajudar, só continuou ao lado de Joui e Arthur porque tem medo de acabar sozinho.
– Não... – disse eu. – minha mãe nunca me trataria dessa forma...
– Ah! – ouvi a voz de Liz atrás de mim.
Ela havia cravado as duas foices no peito de Alex e puxado para os lados. Ele ainda continuava de pé.
– É essa sua desculpa Liz? Me matar de novo? – gritou Alex.
– Você é só um reflexo do que acho que o Alex pensava de mim e de toda a culpa que eu carrego – disse Liz. – Mas o que eu carrego comigo é problema meu, o verdade Alex nunca falaria assim comigo!
– Você que pensa que eu nunca faria isso, não me conhecia de verdade, vocês me mataram – disse ele. – Vocês me levaram para um lugar em que sabiam que eu ia morrer, eu só era um mortal. Eu só quero que você se desculpe, é a única coisa que eu quero.
– Eu sinto muito pelo Alex que ficou na missão, ele era um dos mortais mais puros que já conheci... – disse Liz. – mas eu não vou me desculpar com um reflexo da minha culpa.
– Eu também sinto muito por aquele Alex, espero que um dia seus amigos sintam por você também – ele tentou ir para cima dela.
Liz conseguiu desviar e enfiar uma das foices onde o braço do homem havia sido arrancado.
– Eu sinto muito, Alex, não queria que as coisas tivessem que chegar a esse ponto.
– O seu pai também morreu por causa disso, por causa desse seu jeito egoísta de ser... – disse Alex com desprezo.
A expressão de Liz mudou completamente, ela estava com raiva.
Aproveitando que eu estava distraído, a cópia da minha mãe me agarrou pelo colarinho da camiseta mas consegui me desvencilhar dela e pulei para trás.
– Porque você faz isso? – gritou ela. – Seus amigos só querem o melhor para você, seu padrasto só quer o melhor para você, o garoto que você ama só quer o melhor para você, então porque continua oprimindo seus próprios sentimentos? Porque não aceita minha morte? Você é tão fraco assim ao ponto de auto sabotar sua própria mente? Você é tão inútil e imprestável que mesmo com todos esses seus dons não consegue ajudar ninguém, eu tenho vergonha te ter sido sua mãe.
Com a última frase, não aguentei, desabei completamente em lágrimas, senti minhas pernas bambas, eu respirava com dificuldade.
Não, agora não. Pensei.
– Pessoal! – ouvi Joui falar. – Essas são manifestações dos seus próprios medos, não são eles que vocês tem que pedir desculpas, é para vocês mesmos, vocês tem que se perdoar.
– Eu sinto muito, Alex – repetiu Liz. – Eu fiz tudo o que pude, mas meu pai fez tudo o que ele pode por mim também.
Ela começou a andar em direção a ele com os braços abertos, como se fosse abraça-lo.
Antes que ela chegasse mais perto, a porta do quarto de Thiago se estouro e ele foi arremessado para trás, batendo as costas na parede.
– A culpa não é minha, Gonzalez! – ele disse.
Um adolescente de cabelos pretos se jogou em cima de Thiago e o socou.
Enquanto isso, Alex deu alguns passos para trás, não deixando Liz se aproximar.
– Eu quero te tirar a única coisa que tenho certeza que você nunca vai usar – Alex, de alguma forma sobrehumana, enfiou a mão dentro de Liz, na região do coração, como se não fosse nada.
Ela caiu imóvel. Junto dela, Alex começou a se transformar em uma espécie de gosma preta e virou uma estranha silhueta que caiu ao lado do corpo de Liz.
– Não! – Joui gritou.
O Hoteleiro colocou as mãos na cabeça.
– Vocês tem que fazer alguma coisa! Eu não sei o que fazer! Vocês são os semideuses, ajudem ela!
Tentei correr em direção de Liz, mas fui impedido por minha mãe, segurei seus braços com força tentando me libertar.
– Porque você deixou aquilo acontecer com sua amiga? – disse ela.
– Você é patética – disse sentindo minhas forças se esvaindo mesmo sem ter lutado, meu corpo inteiro doía, uma dor que não era somente física – Você não é a minha mãe e nunca vai ser, ela falaria desse jeito com ninguém.
– Garoto... você acabou com tudo que eu mais amava, inclusive você – disse ela. – Você não é mais meu filho, você é outra... coisa, eu sinto nojo de ver o que se tornou.
Tentei a empurrar mas ela conseguiu me jogar encima de Joui que me segurou tentando amenizar o impacto.
Minha visão escureceu, minha cabeça latejava.
– Cesar? Fala comigo! – Joui me balançou com força.
Senti a raiva, culpa e o desespero do asiático, a mistura de emoções dele foi o suficiente para conseguir me acordar. Joui ajudou a me levantar, continuei apoiado dele, era difícil me equilibrar.
– Hoteleiro, ajuda! – disse Joui. – Procura o parasita na cama do meu amigo, você não disse que é assim que se derrota?
– Quê? – Hoteleiro estava em choque. – Era para eles aceitarem... eu não sei como lidar com isso...
Ele começou a se afastar.
– Porque você não fez alguma coisa? Estava na frente dela! – disse Hoteleiro. – Você podia ter parado ele, porque não fez nada?
– Hoteleiro, ajuda o Thiago! – disse Joui.
 – Ajudar no quê? Porque você ainda está parado aí? – respondeu o Hoteleiro.
– Se você vai ficar jogando a culpa no Joui, é melhor mesmo que fique longe dele – disse eu. – Se não vai ajudar, não atrapalha.
Eu já estava cansado e com muita raiva, aquilo havia sido a gota d'água.
Joui me largou apoiado na parede, pegou sua katana do chão, foi para cima da cópia da minha mãe e a golpeou. Por algum motivo, ele mal conseguiu aprofundar o corte.
– Vai se esconder, de novo, Cesar? – disse ela. – Vai se esconder atrás de seu amigo?
Neguei com a cabeça e tirei minha funda do bolso.
Minha mãe tentou tirar a katana de Joui, mas ele aproveitou para cortar um pouco de sua mão. Por algum motivo, ela parecia ser mais resistente do que o Alex.
– Cesar-Kun, corre daqui! – disse Joui.
– De jeito nenhum! – disse eu. – Você nunca correu quando precisei de ajuda, eu não vou te deixar para trás.
Joui olhou em direção de Thiago com um olhar preocupado, depois voltou para frente.
– Você não vai fazer nada? – disse o Hoteleiro. – Você só vai ficar parado enquanto todos os seus amigos morrem?
– Eu não sei o que fazer! O senhor agora pouco disse pra... – começou Joui.
– Você nunca sabe o que fazer aparentemente, se você não tivesse gritado quando eu entrei no seu quarto, ninguém teria vindo e todos estariam vivos – gritou o Hoteleiro. – A culpa é toda sua!
– Cala sua boca! – disse eu. – Ele está fazendo o melhor que pode, já você só fica aí parado, nem tentou agir!
– Não – disse o Hoteleiro. –, se você tivesse ficado quieto, eles não teriam acordado, nada disso estaria acontecendo!
– Você entrou no meu quarto no meio da noite com com uma faca na mão, o que achou que ia acontecer? – disse Joui. – Por favor, precisamos da sua ajuda, eu não sei o que fazer.
– Você nunca sabe o que fazer, né Joui? – Hoteleiro parecia ter ficado estranhamente calmo.
– O quê? – perguntou Joui.
– Você nunca sabe o que fazer – repetiu ele.
– Quem é que está falando comigo? – perguntou Joui com a testa franzida.
O Hoteleiro sorriu.
– Todos os seus amigos mortos na sua frente – continuou. – Sempre isso, nunca faz nada, só depende dos outros para conseguir agir, né?
Joui abaixou a katana e se virou para o Hoteleiro.
– É só isso que você é, não serve para nada, seus amigos estão morrendo na sua frente... – o Hoteleiro apontou para mim. – e não consegue fazer nada além de entrar em desespero, chamar pela ajuda de seus amigos que provavelmente só continuam essa amizade por pena.
– Não é verdade – disse Joui. – eu ajudo eles.
Hoteleiro riu.
– Claramente, eu tô vendo aí na sua frente, todos os seus amigos ajudados.
– Eles tem orgulho de mim – disse Joui.
Ele continuou rindo.
– A culpa de todos eles morrerem é sua – disse Hoteleiro. – A culpa de seu próprio pai estar caçando o Cesar é sua.
– Não, não é – disse Joui convicto do que dizia.
– É sempre sua culpa, Joui – disse Hoteleiro. – Você não escutou o Cesar quando ele disse que era melhor ignorar o barulho e voltar a dormir.
– E graças a isso estamos vivos – disse eu. – Se ele tivesse me escutado, a Degolificada poderia ter nos matado facilmente enquanto dormíamos.
– A culpa de tudo isso é sua – Hoteleiro me ignorou.
– Não é! – Joui apontou a espada para ele.
– Agora é – disse o Hoteleiro rindo.
Todos ao nosso redor, viraram gosma, inclusive eu mas, estranhamente, consegui continuar vendo o que acontecia.
Hoteleiro pegou sua balestra, atirou contra Joui e o acertou em cheio no ombro.
– Eu estou forte demais agora – Hoteleiro tinha um sorriso macabro no rosto. – Você não tem nem chance, caiu que nem um patinho.
– Tá forte porque exatamente? – perguntou Joui, enquanto tirava a flecha de seu ombro, seu rosto se contorceu em dor.
– Eu nunca vi ninguém se sentir tão culpado por tudo o que aconteceu ao redor dele – disse Hoteleiro empolgado.
– Eu me sinto culpado – disse Joui. – Eu sei que fiz muita coisa que me arrependo e eu teria feito diferente, mas os meus amigos continuam do meu lado e eles tem orgulho de mim.
– Você achou que eu ia te ensinar no seu sonho como me derrotar? – zombou o suposto Hoteleiro.
Joui andou lentamente em direção a ele com a katana em mãos.
– Se o seu objetivo era me assustar, não conseguiu – ele ergueu a lâmina, seu olhar era sereno e, com uma grande precisão, ele fez um corte liso atravessando o pescoço do Hoteleiro.
O corpo se transformou em mais gosma preta e, quando finalmente a cabeça caiu no chão, eu acordei assustado.
Aquilo realmente havia sido um sonho?
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Eu não ia fazer esse capítulo com o parasita de sonhos, mas é uma grande oportunidade de desenvolvimento de personagem, além de que algumas coisas importantes foram reveladas sobre os irmãos Portinari. Como vocês acham que Beatrice vai reagir sabendo tudo aquilo? E o restante da equipe?

O Segredo No AcampamentoOnde histórias criam vida. Descubra agora