Ser um semideus é horrível. Ao contrário do que a maioria pensaria se soubesse sobre nosso mundo, não é legal ser filho de um deus. A partir do momento que nascemos, já temos o destino traçado querendo ou não. Somente a nossa existência é um perigo para nossos familiares e amigos mortais, nossos pais criaram o acampamento como um lugar seguro para pessoas como nós, mas "em troca", eles enfiam na cabeça de todo mundo que temos que honra-los e aceitar as missões suicidas que eles mesmos poderiam fazer em dois segundos.
Se Afrodite sabe que Thiago está vivo, porque ela não pode nos dizer onde ele está pelo menos?
Sinceramente, as vezes parece que eles querem que a gente se foda mesmo.
– Cesar, se concentra! – a voz de Liz me tirou de meus pensamentos. – Desse jeito você vai acabar acertando outra pedra no Arthur.
Estávamos na arena. Depois que Joui foi conversar com Nathaniel, Liz me chamou para treinar e ajudar Arthur com sua nova arma, já que depois do acidente ele não pode mais atirar com o arco e flecha, o Cervero escolheu um grande martelo com detalhes esculpidos em verde por todo o cabo.
– Desculpa – estiquei mais a funda e voltei a mirar no alvo a minha frente. – Eu só... tava pensando.
– Tá tudo bem, amigo? – Arthur perguntou.
– Sim é só que... Liz, alguém já tentou se voltar contra os deuses?
– Porque você está me perguntando isso? – disse Liz confusa.
– É que é meio injusto nós termos que resolver grande parte dos problemas dos nossos pais mesmo sem ter nada haver com isso e... – parei de falar assim que ouvi um alto trovão ressoar pelo acampamento. – Bom, acho que você entendeu meu raciocínio.
– Já – Liz respondeu direta. – E vai por mim, você não vai gostar de como essa história acabou.
– Você viveu essa época? – insisti apesar de seu olhar indicar que não iria conseguir muita coisa.
– Sim e acabou em guerra – Liz confessou. – Semideuses lutando contra semideuses.
– Que horror – disse Arthur.
– Por isso que ninguém fala tanto sobre... a última Grande Profecia – disse Liz. – Perdemos muita gente.
– Eu sinto muito – disse me sentindo culpado, não deveria ter tocado num assunto que Liz tinha deixado claro que era delicado.
– Tudo bem – ela respondeu. – Mas se quer saber, nós não concordamos em fazer isso pelos deuses...
Outro trovão ressoou, mas Liz não pareceu se importar muito.
– É pelo bem do mundo. Se não formos nós para impedir nossos pais de brigarem entre si, a humanidade nem existiria mais – ela continuou. – É só ver o que estamos prestes a fazer, o Thiago está desaparecido e nós vamos encontrá-lo. Isso não é sobre os deuses ou profecias, é sobre proteger aqueles que ama, entende?
Assenti com a cabeça, reflexivo. Não tinha parado para pensar por aquele lado.
– É, acho que faz sentido – respondi.
Mais um trovão ressoou no céu.
– Ok, isso já tá ficando estranho – disse Arthur. – A gente nem falou nada e Zeus já tá querendo jogar um raio na nossa cabeça.
– Acho que ele não gosta da voz do Cesar – disse Liz.
– Ei! – respondi fingindo ofensa.
– Depois que você e o Joui começaram a namorar, só sua existência deve irritar ele três vezes mais – Liz brincou.
– Acha que isso é motivo o suficiente para ele querer me matar de novo? – perguntei na brincadeira, mas no fundo tinha um tom de verdade.
– Sim – Liz e Arthur disseram juntos.
Antes que pudesse abrir a boca para falar, um raio azulado caiu dos céus, seguido pelo grande estouro de outro trovão.
– Gente – chamei com a intenção de dizer algo, mas esqueci o que era ao sentir um arrepiou terrível se alastrando por meu corpo. – Eu... tô com um péssimo pressentimento.
– Isso definitivamente não é nada bom – Liz olhava o horizonte, em direção a onde o raio havia caído, assustada.
– Não é melhor verificamos se aconteceu alguma coisa? – Arthur perguntou preocupado. – Aquele raio pode ter machucado alguém, parece que caiu dentro do acampamento.
De repente, a trombeta do acampamento que já conhecia muito bem começou a soar. Foi aí que tive minha confirmação de alguma coisa estava errada.
– Isso já aconteceu antes? – perguntei a Liz. – Tenho certeza que ainda não é a hora do jantar.
– É... melhor irmos para o pavilhão – ela respondeu tensa e pendurou suas foices nos bolsos de sua calça. – Vamos.
Apesar dela ter desviado da minha pergunta, não foi difícil deduzir que a resposta era "sim e isso não é um bom sinal". Liz não perdeu mais tempo e saiu com pressa da arena.
– Cesar? – Arthur botou a mão em meu ombro. – Tá tudo bem?
Não sei como estava no momento mas, pela cara de Arthur, toda a preocupação que sentia devia estar transparecendo em minha expressão.
– A Liz parece preocupada...
– Mais um motivo para fazermos o que ela pediu – ele passou o braço por minhas costas, me forçando a andar. – Vamos.
Não sabia ao certo porque hesitei, na verdade, não sabia nem do que estava sentindo naquele momento, mas algo me dizia que o que viramos no Pavilhão não seria nada agradável. Era como se alguma coisa estivesse me dizendo que era mais seguro ficar onde estava.
Provavelmente mais alguma manifestação estranha de meus poderes que eu não sabia explicar, era um sentimento parecido de quando estava dentro da caverna de Santo Berço mas dessa vez que não era morte o que pairava no ambiente, talvez eu só tivesse uma intuição terrivelmente específica e precisa.
Quando alcançarmos Liz já estávamos próximos do pavilhão. Conseguia ver os campistas aglomerados em volta do sr. Veríssimo e o sr. D, mas não conseguia entender muito mais do que algumas palavras soltas do que estava sendo discutido, já que todos estavam falando ao mesmo tempo.
– Pessoal, eu preciso que vocês se acalmem – sr. Veríssimo tentava controlar a situação.
– O que está acontecendo aqui? – Liz abriu caminho entre os adolescentes que prontamente se dispersaram para abrir passagem.
Um silêncio extremamente desconfortável se iniciou, os campistas nos olharam de uma forma estranha.
– Liz, Cesar, Arthur... – sr. Veríssimo se aproximou de nós sem dizer mais nada. – O Joui... – ele balançou a cabeça, parecia estar decidindo com que palavras daria a notícia.
– O que tem ele? – perguntei olhando a minha volta em busca do asiático, pensei ter parado de respirar por um momento quando percebi que ele não estava entre as dezenas de adolescentes. – Onde ele tá?
– Venham comigo – ele deu as costas e saiu a passos largos.
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O Segredo No Acampamento
FanfictionDeuses são reais. Todas as criaturas mitológicas são protegidas aos olhos mortais através da Névoa, porém, tudo tem suas brechas: semideuses, os descentes meio mortais dos deuses gregos. Seres extremamente poderosos e ao mesmo tempo tão vulneráveis...