No fim da sua primeira semana nas Minas de Prata, Alex já não conseguia mais discernir a diferença entre frio e calor, tamanha a variação constante entre o interior abafado das profundezas da mina de onde se extraía a prata e o exterior opressoramente congelante dos alojamentos onde se depositavam os minérios para serem transportados para a forja e onde se passava o resto do dia livre; dias estes que pareciam progressiva e incomodantemente mais frios.
Era mais um início de outra manhã congelante, uma névoa espessa encobria o pátio dos alojamentos onde Alex se encontrava. O lugar era escavado na rocha, oculto pela sombra da montanha que o engolia como uma enorme boca, um grande trabalho dos anões, segundo Eminael. A névoa dificultava a visão e aumentava mais ainda a fumaça gelada que saía da boca de cada homem e anão naquele lugar, estes travavam uma batalha contra o frio, tentando manter-se aquecidos com as precárias roupas que tinham a disposição, grossas peles peludas e quentinhas, mas igualmente fedidas.
Todos estavam em fila ao lado da ala de refeições. Dividiam-se em dois grupos: um de homens de um lado e um de anões do outro. Muitos resmungavam pelo fato de terem sido acordados mais cedo que o comum. Alex já sabia, pelo que Eminael já lhe contara, que aquele era o dia da conferência da produtividade de cada trabalhador/escravo. Em cima de uma das grandes mesas usadas para refeições havia uma pilha de livros e pergaminhos muito bem guardados por diversos cavaleiros prateados, além, é claro, de muitos outros cavaleiros fazendo ronda pelas muralhas ao redor; os livros em questão serviam para acompanhar e anotar cada vez que Alex e os demais trabalhadores levavam um balde de minérios até as calhas localizadas na entrada da mina.
Passado algum tempo, Sir Hector adentrou no alojamento pelo portão principal e se encaminhou até a mesa onde estavam as anotações, sacudindo um pouco de gelo branco que se formou sobre seus ombros e sobre seus cabelos da mesma cor do gelo, assanhados pelo vento do lado externo. Os guardas ao lado da mesa o reverenciaram e, em seguida, Sir Hector começou a falar com sua voz calma e sonolenta:
— Caros contribuintes, como todos podem constatar o inverno está se aproximando, e o frio se intensifica lá fora. Agradeçam aos deuses por ficarem aquecidos dentro desta montanha abençoada pela mão do rei. — Houve gritos de protestos, mas Sir Hector, pelo que Alex já percebera em outras vezes, apenas ignorava o fato e prosseguia com o relato no mesmo tom que causava tédio e sono. — Agraciados sejam. Todos vocês, homens aqui presentes, cometeram crimes de uma periculosidade branda, por isso o rei presenteou a todos com a segunda chance, caso contrário, já estariam sucumbindo na ala inferior, ou mesmo mortos por lá. — Alex engoliu em seco, preocupado com o destino de Bernard, levado para a ala de segurança máxima. — Hoje vocês trabalham para um dia retornar à sociedade como novas pessoas, agora com regras e disciplina, sem aquele instinto violento de vadiagem que outrora fazia parte de vocês...
Alex ouvia tais palavras com desdém, será que Sir Hector não enxergava o que Andrew fazia nas minas? Todos os dias Alex era xingado, humilhado, chutado e socado por Andrew e os dois brutamontes que andavam com ele. E não era só com Alex que eles faziam isso, muito menos não eram apenas Andrew e sua turma os únicos causadores de confusão. Na verdade, aquelas minas eram um caos sonoro de picaretas batendo nas pedras, homens gritando de dor, agonia ou por desrespeito mesmo, e guardas bem armados monitorando, punindo e torturando quem quisessem, como bem entendessem, tudo pelas costas do comandante que fingia que tudo estava a mil maravilhas. Em suma, as minas eram um lugar onde ninguém respeitava ninguém, exceto quando Sir Hector estava entre eles, por um motivo bem óbvio, é claro, a vida de cada um ali estava nas mãos daquele velho que de bondoso só tinha mesmo a cara, e as vezes nem isso. Alex desconfiava que até mesmo a vida dos cavaleiros que trabalhavam lá compartilhavam do mesmo destino sombrio que a dele.
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A Espada de Prata - O arauto do gelo
FantasyEm uma era sombria marcada pela guerra, após cair em uma armadilha, Alexander Muller, um jovem morador do Reino da Prata Azul localizado no místico continente de Malicerus, acaba sendo separado de sua família e de seus amigos, e é enviado como um cr...