Capítulo 39 - A equipe de caça

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No fim da sua primeira semana nas Minas de Prata, Alex já não conseguia mais discernir a diferença entre frio e calor, tamanha a variação constante entre o interior abafado das profundezas da mina de onde se extraía a prata e o exterior opressoramente congelante dos alojamentos onde se depositavam os minérios para serem transportados para a forja e onde se passava o resto do dia livre; dias estes que pareciam progressiva e incomodantemente mais frios.

Era mais um início de outra manhã congelante, uma névoa espessa encobria o pátio dos alojamentos onde Alex se encontrava. O lugar era escavado na rocha, oculto pela sombra da montanha que o engolia como uma enorme boca, um grande trabalho dos anões, segundo Eminael. A névoa dificultava a visão e aumentava mais ainda a fumaça gelada que saía da boca de cada homem e anão naquele lugar, estes travavam uma batalha contra o frio, tentando manter-se aquecidos com as precárias roupas que tinham a disposição, grossas peles peludas e quentinhas, mas igualmente fedidas.

Todos estavam em fila ao lado da ala de refeições. Dividiam-se em dois grupos: um de homens de um lado e um de anões do outro. Muitos resmungavam pelo fato de terem sido acordados mais cedo que o comum. Alex já sabia, pelo que Eminael já lhe contara, que aquele era o dia da conferência da produtividade de cada trabalhador/escravo. Em cima de uma das grandes mesas usadas para refeições havia uma pilha de livros e pergaminhos muito bem guardados por diversos cavaleiros prateados, além, é claro, de muitos outros cavaleiros fazendo ronda pelas muralhas ao redor; os livros em questão serviam para acompanhar e anotar cada vez que Alex e os demais trabalhadores levavam um balde de minérios até as calhas localizadas na entrada da mina.

Passado algum tempo, Sir Hector adentrou no alojamento pelo portão principal e se encaminhou até a mesa onde estavam as anotações, sacudindo um pouco de gelo branco que se formou sobre seus ombros e sobre seus cabelos da mesma cor do gelo, assanhados pelo vento do lado externo. Os guardas ao lado da mesa o reverenciaram e, em seguida, Sir Hector começou a falar com sua voz calma e sonolenta:

— Caros contribuintes, como todos podem constatar o inverno está se aproximando, e o frio se intensifica lá fora. Agradeçam aos deuses por ficarem aquecidos dentro desta montanha abençoada pela mão do rei. — Houve gritos de protestos, mas Sir Hector, pelo que Alex já percebera em outras vezes, apenas ignorava o fato e prosseguia com o relato no mesmo tom que causava tédio e sono. — Agraciados sejam. Todos vocês, homens aqui presentes, cometeram crimes de uma periculosidade branda, por isso o rei presenteou a todos com a segunda chance, caso contrário, já estariam sucumbindo na ala inferior, ou mesmo mortos por lá. — Alex engoliu em seco, preocupado com o destino de Bernard, levado para a ala de segurança máxima. — Hoje vocês trabalham para um dia retornar à sociedade como novas pessoas, agora com regras e disciplina, sem aquele instinto violento de vadiagem que outrora fazia parte de vocês...

Alex ouvia tais palavras com desdém, será que Sir Hector não enxergava o que Andrew fazia nas minas? Todos os dias Alex era xingado, humilhado, chutado e socado por Andrew e os dois brutamontes que andavam com ele. E não era só com Alex que eles faziam isso, muito menos não eram apenas Andrew e sua turma os únicos causadores de confusão. Na verdade, aquelas minas eram um caos sonoro de picaretas batendo nas pedras, homens gritando de dor, agonia ou por desrespeito mesmo, e guardas bem armados monitorando, punindo e torturando quem quisessem, como bem entendessem, tudo pelas costas do comandante que fingia que tudo estava a mil maravilhas. Em suma, as minas eram um lugar onde ninguém respeitava ninguém, exceto quando Sir Hector estava entre eles, por um motivo bem óbvio, é claro, a vida de cada um ali estava nas mãos daquele velho que de bondoso só tinha mesmo a cara, e as vezes nem isso. Alex desconfiava que até mesmo a vida dos cavaleiros que trabalhavam lá compartilhavam do mesmo destino sombrio que a dele.

A Espada de Prata - O arauto do geloOnde histórias criam vida. Descubra agora